Os plásticos obtidos de etano de cana-de-açúcar podem gerar menos
contaminação climática do que os derivados de petróleo. Contudo, como estes,
tampouco são biodegradáveis.
Rio de Janeiro, Brasil, 13 de agosto de 2012 (Terramérica).- O Brasil é o
maior produtor mundial de biopolímeros, cuja produção emite menos gases-estufa
do que os derivados dos hidrocarbonos. Mas os “plásticos verdes” obtidos da
cana-de-açúcar também têm seu sabor amargo. A fábrica que marcou o salto na
produção para escala industrial do polietileno verde foi instalada em 2010 no
Polo Petroquímico do Sul, localizado em Triunfo, no Rio Grande do Sul, com
capacidade anual de 200 mil toneladas.
Desenvolvido com tecnologia da empresa brasileira Braskem, uma das maiores
petroquímicas do mundo, o plástico verde é uma resina termoplástica feita a
partir do abundante etanol produzido no país a partir da cana-de-açúcar. A
Braskem, que continua tendo no petróleo sua principal matéria-prima, garante que
o polietileno verde possui as mesmas propriedades de seu primo petroquímico, e
que sua diferença é ambiental.
“O plástico verde captura e fixa até 2,5 toneladas de gás carbônico da
atmosfera para cada tonelada produzida”, explicou ao Terramérica o diretor de
químicos renováveis da Braskem, Marcelo Nunes. Além disso, esse material tem
grande versatilidade para aplicações em produtos de higiene e limpeza,
alimentícios, cosméticos e automotivos. “É feito a partir de uma matéria-prima
100% renovável como a cana-de-açúcar”, acrescentou.
A empresa garante que, com a produção desse polietileno e de outros produtos
da mesma linha sustentável, contribui para reduzir mais de 750 mil toneladas
anuais de dióxido de carbono, o que equivale a plantar e manter mais de cinco
milhões de árvores a cada ano. O próximo passo é construir e pôr para funcionar,
em 2013, sua primeira fábrica de polipropileno verde, que também utiliza
etanol.
O polipropileno, que em sua versão petroquímica é a segunda resina
termoplástica mais consumida no mundo, terá as mesmas vantagens ambientais que o
polietileno, pontuou Nunes. O volume de produção de plástico verde é pouco
significativo em relação ao de outras resinas convencionais. Porém, segundo
acrescentou, é de grande importância para a Braskem, que “deseja ser líder
mundial em química sustentável até 2020”.
O ambientalista José Goldemberg, professor do Instituto de Eletrotécnica e
Energia da Universidade de São Paulo, disse que investir nestes plásticos verdes
é positivo porque substituem matérias-primas básicas da indústria petroquímica
como a nafta (benzina ou éter de petróleo). A nafta é a principal fonte da
petroquímica, e responde por quase 50% da produção mundial de etileno, embora em
regiões como Oriente Médio e América do Norte o gás seja mais utilizado. “Usar
cana-de-açúcar para substituir produtos obtidos com nafta é um importante passo
na direção da sustentabilidade”, destacou o professor ao Terramérica.
Opinião igual tem Eduardo Atahyde, diretor da filial no Brasil do Worldwatch
Institute, que em seu artigo de 2009 Polietileno Verde, um Sinal
Positivo, afirma que esse plástico com tecnologia brasileira prepara “a
estreia da petroquímica sob as novas regras de jogo da economia baixa em
carbono”. “Embora ainda não seja biodegradável, porque ao substituir a nafta
fóssil pelo etanol renovável o polímero resulta idêntico ao de origem
petroquímica, dá um passo adiante em acordo com as recomendações de diminuição
de emissões”, acrescentou.
A cana-de-açúcar ainda não tem impacto no mercado da indústria petroquímica,
comparada com o petróleo. No entanto, “ao longo do tempo haveria essa
necessidade de encontrar um substituto do petróleo e do gás natural para fazer
polímeros. Quanto antes melhor”, declarou ao Terramérica o especialista em
mudança climática e uso sustentável de recursos naturais, Roberto Kishinami.
A objeção de Kishinami, consultor de organizações como Instituto Democracia e
Sustentabilidade e ActionAid, é que, ao se massificar o uso da cana para
combustível ou para a petroquímica, se exacerbe sua condição de monocultura
extensiva. Nunes rebate, destacando que “o cultivo de cana-de-açúcar para a
produção do plástico verde utiliza cerca de 0,02% de todas as terras aráveis do
país. Além disso, não há competição com o setor alimentício, como ocorre com
alguns plásticos originados do milho, por exemplo”.
Entretanto, o engenheiro agrônomo e ativista ambiental do Rio Grande do Sul,
Luiz Jacques Saldanha, advertiu que “chamar de verde este processo apenas porque
a fonte de carbono vem da agricultura é um grande engano. E acrescentou que “há
mudança na produção de alimentos e será outra ‘commodity’ (produto
básico), como já se faz com a soja, a grande tragédia do Século 21 em termos de
uso da terra produtiva em todo o planeta, com imensas monoculturas”.
Saldanha vê os biopolímeros como outra “maquiagem verde”
(greenwashing), termo usado para descrever novas práticas de
comercialização de produtos que buscam mostrar uma suposta contribuição
ambiental para o planeta. Não é a fonte de carbono (seja petróleo, carvão,
etanol ou qualquer outra) que “faz, ou não, estas moléculas verdes”, detalhou o
agrônomo. “Como não são biodegradáveis, não podem ser consideradas verdes porque
continuam por tempo indeterminado no meio ambiente, contaminando os
ecossistemas”, ressaltou.
Saldanha também questiona os plásticos utilizados no processo de
industrialização do polietileno e do polipropileno verdes. “Entre todas as
resinas, estas ainda são consideradas as menos problemáticas como monômeros.
Contudo, como todas as resinas de uso final para produtos de consumo, possui
plastificantes como o bisfenol A”, um aditivo também contaminante. Todo
plástico, verde ou não, “deve ser reciclado e nunca liberado no meio ambiente”,
alerta.
Doces ou amargas, as consequências ambientais dos plásticos verdes poderão
ser medidas se no futuro a cana-de-açúcar se converter na matéria-prima estrela
da petroquímica brasileira. No momento, uma indústria “sucroquímica” brilha
distante.
* A autora é correspondente da IPS.*Fonte: http://envolverde.com.br
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