O Código de Trânsito Brasileiro,
promulgado em 1997, foi um passo fundamental para o reconhecimento da bicicleta
como veículo e desse reconhecimento é possível enfatizar grandes acertos e
grandes erros.
Um grande acerto é o reconhecimento de que o ciclista
empurrando sua bicicleta equivale ao pedestre em direitos e deveres (Artigo 68).
Um grande erro foi na redação do Artigo 201 que estabelece multa para os
veículos motorizados que deixarem de ultrapassar o ciclista com uma distância
menor do que 1,5 metros.
O Artigo 68 foi especialmente feliz por dar
pista ao caráter misto do ciclista, um híbrido de pedestre e veículo. A
bicicleta é ao mesmo tempo um e outro e portanto requer um conjunto de regras
distintas daquelas que se aplicam aos demais veículos e aos pedestres. O
entendimento da bicicleta como esse híbrido é fundamental para um planejamento
urbano em favor das pessoas.
Já o Artigo 201 foi infeliz em tipificar uma
distância exata que buscasse proteger o ciclista que trafegue junto ao trânsito
motorizado. O erro não está na intenção, mas na dificuldade de fazer valer a regra onde interessa, nas ruas. O
código de trânsito da Califórnia, nos Estados Unidos, buscou outro recurso para
buscar proteger os ciclistas, garantir que, em faixas de rolamento muito
estreitas, o ciclista tem direito a fazer uso da faixa por
completo.
Mas nenhuma
legislação por si só é capaz de garantir comportamentos adequados por parte de
todos os cidadãos, nesses casos é preciso trabalhar para além de leis escritas
em papel, é preciso intervir diretamente nas ruas com infraestrutura que garanta
a segurança de todos e que vá além de placas de sinalização e orientações
escritas em geral.
São necessários dispositivos de fiscalização, adotados
até dentro de condomínios particulares, mas, além disso, é preciso
que as ruas sejam vistas e sentidas como espaços de circulação de pessoas em que
os veículos automotores respeitam a hierarquia de que o maior deve proteger o
menor. Tal regra está exemplificada na legislação de trânsito de alguns países
europeus que usam a previsão de culpa do condutor dos veículos mais pesados que
por ventura atinjam pedestres ou ciclistas. Significa dizer que em caso de
atropelamento todo motorista é culpado até que se prove o contrário. Uma lei tão
rígida, seguida das devidas punições tem um efeito direto na segurança
viária.
Enquanto a legislação brasileira de trânsito garantir o direito
pleno de transgredir regras sem punição e a infraestrutura viária favorecer a
circulação motorizada sem limites e sem atenção à vida que segue fora dos
veículos motorizados, continuaremos campeões mundiais de mortes no trânsito e
com um dos melhores códigos de trânsito jamais redigidos.
A ideia desse
texto veio da leitura desse artigo do New York Times
*Fonte:http://www.oeco.com.br
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