RIO - O lockdown, segundo explicam especialistas, é um aprofundamento das medidas de isolamento já impostas, com o aumento na fiscalização e consequências mais severas para quem desrespeitá-las, que podem ir de multas até a prisão.
— O lockdown pode mexer no funcionamento até daqueles serviços essenciais, como supermercados, onde é possível restringir horário de funcionamento e adotar um rodízio de pessoas (no Peru, por exemplo, homens e mulheres passaram a poder is às ruas em dias alternados) — explica Manoel Peixinho, conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e professor de Direito Administrativo da PUC-Rio.
Coordenador de Vigilância em Saúde e Laboratórios de Referência da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Rivaldo Venâncio reforça a necessidade de adoção da medida:
— As medidas impostas até agora foram importantes, mas precisamos de maior controle do isolamento social para diminuir o contágio. E, tecnicamente, depois de muita análise sobre a nossa realidade, só conseguimos encontrar como solução o lockdown, que vai reduzir drasticamente a circulação de pessoas e, assim, diminuir a curva de transmissão, proporcionando que o nosso sistema de saúde se prepare e se recupere para que possamos atender aos doentes que precisarem de leitos. É traumático, mas não tem jeito, só vemos essa solução.

O que é 'lockdown'?

É o controle mais rígido em torno do funcionamento dos estabelecimentos e da circulação de pessoas, com mais fiscalização e mais exigências. Mesmo serviços essenciais, como supermercados, por exemplo, podem sofrer restrição de funcionamento. Além disso, o fechamento de vias públicas de maior concentração e a limitação na circulação de veículos e pessoas são medidas que já foram implementadas em diversos locais. No Maranhão, a capital, São Luís, e mais três cidades estão em bloqueio total desde o dia 5, com previsão de dez dias de duração para a medida. Lá, houve proibição de circulação de veículos particulares, exceto para compra de alimentos ou medicamentos e para transporte de pessoas para atendimento de saúde, desempenho de atividades de segurança ou carros no itinerário de trabalhadores de serviços essenciais.

Por que é importante

 Segundo parecer técnico da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), o lockdown é fundamental para deter o colapso total do sistema público de saúde, evitando milhares de mortes. De acordo com Rivaldo Venâncio, coordenador de Vigilância em Saúde e Laboratórios de Referência da Fiocruz, há uma conjunção de fatores que determinam a necessidade da sua implementação, incluindo a crise econômica de antes da pandemia e a já deficitária rede de atendimento de saúde. Ele explica que as medidas da quarentena já atingiram o seu limite e que ações mais efetivas são necessárias neste momento.

O que acontece se desrespeitar?

As consequências para quem desrespeitar as regras vão desde a aplicação de multas até a prisão. Ambas são determinadas em decreto. Postos de controle e agentes públicos de segurança são responsáveis por fiscalizar quem estiver na rua.

Já está valendo?

lockdown, por enquanto, acontece apenas nos estados do Pará e Maranhão. No Rio, o governo estuda adotar a medida após parecer técnico da Fiocruz que recomenda controle ainda mais rígido. Em Niterói, foi proibida a circulação de pessoas  nas ruas, praças e praias entre os dias 11 e 15, com possibilidade de prorrogação, sob multa de R$ 180, que pode ser dobrada em caso de reincidência. Países como China, Itália, Espanha, França e Alemanha também implementaram a medida em todo o território ou em algumas regiões. No Pará, as medidas incluíram fechamento dos limites dos municípios, exceto para transportes de abastecimento de produtos e trânsito de profissionais essenciais, e preveem, em caso de desrespeito, advertências e multas de R$ 150 para pessoas físicas e R$ 50 mil para pessoas jurídicas. Mesmo em locais onde o lockdown não foi decretado, houve mudanças. No Ceará, foram implementadas regras mais rígidas de isolamento social. Na capital paulista, o rodízio de veículos foi ampliado, aumentando a restrição de carros. No Rio, Campo Grande, na Zona Oeste, teve áreas fechadas.

Quem pode decidir?

No fim de abril, o Supremo Tribunal Federal (STF) estabeleceu que governadores e prefeitos podem estipular as medidas do combate à pandemia do novo coronavírus, sem aval federal, o que era exigido anteriormente.

O que continua funcionando?

Apenas serviços essenciais. Emergências de hospitais e farmácias podem continuar funcionando sem limitações. Supermercados e mesmo os serviços de delivery podem sofrer restrições de horário e funcionamento, inclusive para a proteção dos entregadores. Outros estabelecimentos que estavam autorizados a funcionar, como lojas de material de construção, por exemplo, deverão fechar.

Quando posso sair?

Apenas para realização de atividades essenciais, que são, basicamente, ida ao supermercado, farmácia ou hospital, em caso de emergência ou necessidade. Mas essas situações, e os comprovantes correspondentes, só serão conhecidas quando o decreto for publicado. Por exemplo, um comprovante de residência para mostrar que foi ao supermercado perto de casa pode ser o documento exigido. A Carteira de Trabalho, que já está sendo adotada em algumas situações, pode ser usada para mostrar a natureza essencial do ofício. Praticar atividades ao ar livre e passear com cachorros, que não eram recomendáveis, passam a ser atividades proibidas durante o lockdown. Agentes de fiscalização podem exigir a comprovação da necessidade de estar na rua. Alguns países implementaram uma autorização oficial, que prestadores de serviços essenciais poderiam usar para comprovar sua situação.

Devo ir ao hospital?

Lembre-se de que os hospitais estão cheios e a possibilidade de se contaminar é maior nesses locais que concentram os doentes. Especialistas da área de saúde recomendam: consulte seu médico antes para saber da necessidade de ir aos locais de atendimento. Pacientes que fazem tratamento continuado, como quimioterapia, em geral, não devem interromper as sessões, mas é preciso consultar o seu médico sempre antes de sair de casa.

Há limites

Especialistas em saúde e administração pública afirmam que o lockdown só terá efetividade se os poderes, principalmente municipais e estaduais, agirem juntos e em harmonia e que também é necessário que o poder público forneça condições para as populações que perderam suas fontes de renda, que, por isso, nem sempre conseguem seguir o isolamento social.
Fonte: Rivaldo Venâncio, coordenador de Vigilância em Saúde e Laboratórios de Referência da Fiocruz; Manoel Peixinho, conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB);Bruno Ferrari, presidente do Conselho de Administração do Grupo Oncoclínicas