quarta-feira, 17 de abril de 2013

Publique o selo no seu blogPor que precisamos de hortas na cidade


Natália Garcia - 20/03/2013 às 18:06


No final da semana que vem o prefeito de São Paulo Fernando Haddad deve publicar o plano de metas de sua gestão para os próximos quatro anos. Há duas semanas, um grupo de ativistas se organizou pela internet criando uma petição no Change para pedir que uma dessas metas seja a criação de hortas e compostagem na cidade. .....
 Resolvi dedicar então esse post a explicar por que apoio essa causa.
___
“Por incrível que pareça, estamos chegando a situações em que algumas cidades possuem mais biodiversidade do que certas plantações no campo”, disse-me Yves Cabannes, planejador urbano especializado em governança municipal e professor do Development Planning Unit (DPU) da University College of London (UCL). Parece um contra-senso, mas, segundo ele, o excesso de pessoas morando nas cidades aumenta a pressão sobre a produção de alimentos no campo e a resposta sempre aparece em forma de enormes escalas de monocultura, daí a diminuição de biodiversidade. “No Estado do Rio Grande do Sul, com a exportação da soja, os produtos que formavam a biodiversidade do campo estão desaparecendo”, completa Cabannes.
“A porcentagem da população que produz alimentos está se reduzindo gradativamente”, diz o especialista em agricultura urbana e também professor da DPU Robert Biel. Segundo ele, nos Estados Unidos, apenas 3% da população produz alimentos e precisa dar conta de todos os outros 97%. “Se conseguíssemos que as cidades produzissem parte da comida de que sua população precisa para se alimentar, poderíamos relaxar a pressão sobre a produção de alimentos no campo e isso permitiria que a economia rural se guiasse para uma direção mais sustentável progressivamente”, diz Biel.
Biel e Cabannes estudam práticas ao redor do mundo de agricultura urbana – plantio de jardins e hortas em áreas urbanas que têm como característica o fortalecimento de comunidades locais e, em muitos casos, o abastecimento de alimentos em uma cidade. Ao lado deles, também no DPU, trabalha o professor brasileiro Alexandre Apsan, que se especializou em outras maneiras de incorporar a agricultura urbana ao planejamento estratégico das cidades. Segundo ele, as hortas urbanas podem ser posicionadas em regiões que sofrem com enchentes e alagamentos, permeabilizando parte do solo e facilitando o escoamento da água. Áreas verdes na cidade podem também ser reguladores térmicos, quebrando com as ilhas de calor geradas em superfícies pavimentadas muito longas. As hortas urbanas ainda podem ser aplicadas como um cinturão verde, em volta da cidade, impedindo que ela cresça de maneira desordenada.
Após essas entrevistas, a agricultura urbana passou a ser um dos assunto que guiava meu olhar nas viagens com o Cidades para Pessoas. E vi vários exemplos de sua aplicação.
Na cidade de Portland, por exemplo, a permeabilização das ruas, pavimentadas com asfalto, não se mostrou a melhor opção diante do seu clima local, extremamente chuvoso (como expliquei nesse post). Em vez de olhar esse excesso de água das chuvas como um problema, a prefeitura da cidade preferiu encará-lo com o recurso e criou o programa Grey to Green, transformando infraestrutura cinza em infraestrutura verde. Na prática, calçadas e sarjetas foram permeabilizadas para ganharem canteiros de plantas e telhados verdes receberam incentivo fiscal para serem implementados no maior número possível de edifícios. Em vez de correr por cima do asfalto, a água agora vai infiltrando pouco a pouco pelo solo e sendo filtrada por camadas de pedra, cascalho e terra, até chegar aos lençóis freáticos, muito mais limpa. Tanto que o nível de pureza do rio Williamette, que corta a cidade, tem aumentado a cada ano desde que o programa se iniciou, em 2008.
Já em São Francisco, a agricultura urbana é uma forma de ativismo e ocupação de espaços públicos. É o caso de Hayes Valley Farm, um enorme canteiro de vegetais e criação de abelhas para o cultivo de mel que fica na região central da cidade. A área ficava debaixo de um viaduto que teve sua estrutura danificada por um terremoto e foi demolido no início dos anos 2000. Com a permissão da prefeitura para uma ocupação em caráter provisório, um grupo de ativistas criou esse centro de agricultura urbana que recebe voluntários toda semana e possui até uma biblioteca de sementes. A cidade californiana tem vários outros exemplos interessantes, como o Please Touch e o Free Farm (saiba mais nesse post).
Em Nova Iorque, todos os terrenos públicos desocupados no bairro do Brooklyn são mapeados pelo projeto 596 Acres, que funciona como uma incubadora de organizações e associações de moradores para formalizar projetos de ocupação desses terrenos, onde, em geral, são criados parques e centros de agricultura urbana.
Em cada um desses casos, os benefícios da agricultura urbana variaram. Mas é fato que em todos eles houve um resgate do senso de comunidade e uma conexão maior com as regiões locais onde cada um vive nessas cidades.  É verdade que em nenhum desses casos a agricultura representa um abastecimento significativo de alimentos nas cidades. Mas aí entram as alianças que podem ser feitas entre a agricultura peri-urbana (cultivada bem pertinho da cidade) e os mercados e cooperativas de alimentos orgânicos.
Cooperativas como a Food Co-op, em Nova Iorque, o Alberta Grocery, em Portland e o Rainbow Grocery, em São Francisco, compram exclusivamente (ou prioritariamente) alimentos orgânicos locais e frescos de diversos produtores próximos dessas cidades para revendê-los ao publico final em áreas urbanas (saiba mais nesse post). Em São Francisco também é comum a prática dos Farmers Markets, mercados de rua em que os próprios produtores trazem os alimentos que plantam e vendem em pequenas barraquinhas. Eu fiz compras em todos eles e sabia exatamente de onde tinha vindo cada alimento. E posso dizer que nessas cidades eu comi os cogumelos, aspargos, abacates, chocolates caseiros, abóboras e pimentas mais deliciosos da minha vida.
Não sou contra a produção e distribuição industrial de comida, mas é fato que quanto mais industralizados, menos saudáveis e sustentáveis os alimentos são. Muitos deles aliás são tóxicos e responsáveis por pandemias mundiais, como a obesidade (sugiro o filme Muito Além do Peso para quem queira se aprofundar nesse assunto). E em alguns casos, as cadeias industriais podem gerar contaminações, a exemplo das bebidas de soja da marca Ades, que foram retiradas do mercado após uma contaminação com produtos de limpeza. Combinar a possibilidade de um abastecimento mais saudável e sustentável de comida nas cidades a legados positivos como mais mais áreas verdes e espaços de interação comunitária é uma bela equação que já vi dar certo na prática.
É por todos esses motivos que eu apoiei a petição que pede ao prefeito que priorize a agricultura urbana em sua gestão. E te aconselho a apoiar também.
(fotos: Natália Garcia)

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Obrigado pelo sua participação e opinião !