A discussão sobre royalties do petróleo é assunto que tem mobilizado o país. Não se sabe ao certo quem tem razão. Certo mesmo é que o tal pacto federativo entre os Estados foi literalmente rasgado e que a expressão royalties se tornou praticamente um sinônimo desse tão valioso recurso natural.
Só que a história não é bem assim. A origem da expressão royalties remonta ao século XV. Com o advento da prensa de tipos móveis por Johannes Gutenberg, as obras literárias, até então meros manuscritos, passaram a ser reproduzidas em massa, numa escala maior, mesmo porque tais reproduções se limitavam ao trabalho manual dos escribas, como lembra Umberto Eco no épico Em Nome da Rosa.
Portanto, diante dessa radical mudança no mercado editorial — semelhante ao que acontece hoje no mercado digital — os editores passaram a pressionar a Corte Inglesa em busca de proteção sobre as obras literárias das quais eram titulares. Afinal a geringonça criada por Gutenberg — ou gadget, na expressão mais moderna — gerou uma proliferação de cópias não autorizadas, vulgo pirataria.
A Corte Inglesa, então, em busca do apoio político dos livreiros, uma vez que eram panfletários e detinham o controle da informação, instituiu a primeira lei para o setor, assegurando, assim, os interesses econômicos desse segmento chave para a governança do Rei. Logo, surge o copyright, de modo a reservar direitos e garantir a cópia somente para esses titulares, em detrimento dos autores. Surgem também os royalties, que deriva da palavra royal, ou seja, relativo ao Rei, caracterizado como uma quantia paga ao detentor da propriedade, no caso a intelectual, em razão da sua utilização.
Daí que se concluiu que a gênese do direito autoral nada mais foi que um acordo político, baseado nolobby e na troca de favores. Em segundo plano os autores, destinatários de uma norma moldada para os titulares de direitos autorais, ou seja, nada muito diferente da nossa atual legislação autoral.
Original dos direitos autorais, a expressão royalties veio a calhar no debate sobre o petróleo. A diferença é que neste, o dever de pagar um determinado percentual pela sua utilização surge de um bem da natureza, enquanto naquele o dever de pagar um percentual por sua utilização surge de um bem da natureza humana. Já a semelhança é que em ambos os casos a expressão se imiscuiu no jogo do interesse político e econômico. E assim caminha a humanidade, um museu sem grandes novidades.
Helder Galvão é advogado, sócio do escritório Candido de Oliveira Advogados e presidente da Comissão de Direitos Autorais da OAB-RJ.
Revista Consultor Jurídico, 3 de abril de 2013
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Obrigado pelo sua participação e opinião !