Mariana Branco Repórter da Agência Brasil
Brasília - Embora a maioria não note a diferença no cotidiano, a geração de
energia e a fabricação de produtos a partir da biomassa – matéria orgânica,
animal ou vegetal – já se tornaram realidade. A eletricidade gerada do bagaço de
cana-de-açúcar abastece as próprias usinas sucroalcooleiras e alguns lares
brasileiros. O mesmo bagaço pode ser usado na produção de papel. Do etanol,
biocombustível feito da cana, extraem-se compostos como polietileno para
fabricação de embalagens plásticas. A partir de resíduos de soja e sebo bovino é
possível produzir outro combustível renovável, o biodiesel.
O uso do material orgânico tende a crescer, pois há pesquisas em curso para
descobrir mais aplicações. Muitas são conduzidas pela Empresa Brasileira de
Pesquisa Agropecuária (Embrapa). Segundo o pesquisador José Manuel Cabral, chefe
de Transferência de Tecnologias da Embrapa Agroenergia, entre os estudos
desenvolvidos está um para obter fibras de celulose a partir de resíduos do
dendê. O pesquisador vê um futuro com cada vez mais biorrefinarias, nome usado
para designar um conceito recente análogo ao das refinarias, que são unidades
onde o petróleo é processado.
Apesar do interesse na biomassa, as matrizes energéticas renováveis não devem
substituir completamente as não renováveis tão cedo. De acordo com o mais
recente Balanço Energético Nacional da Empresa de Pesquisa Energética (EPE),
referente a 2011, 44,1% da oferta interna de energia no país provinham de fontes
renováveis como hidráulica, eólica, etanol e biomassa, enquanto 55,9%
originavam-se de combustíveis não renováveis. “Levando em conta a projeção da
EPE, para 2030 o que vai haver de importante é o gás natural, que é um
combustível fóssil. Estamos investindo muito em petróleo, e as reservas de
petróleo têm gás natural também. O uso do petróleo vai diminuir e o da biomassa
vai subir um pouco”, explica José Manuel Cabral.
Agência Brasil - O que é a biomassa e por que ela está se
tornando uma aposta e uma alternativa aos combustíveis fósseis?
José
Manuel Cabral - Na sociedade atual, você tem algumas fontes de
combustíveis e produtos químicos. O petróleo, o gás natural, o carvão são
combustíveis fósseis. Deles é possível extrair alguns produtos que são chamados
blocos construtores. Você tem que chegar à molécula e [ela] servirá para um
monte de coisas. [Para produzir] plásticos, pneus, remédios. Os polímeros, como
o polietileno, dão origem ao plástico. As grandes fontes de combustíveis e
matérias-primas são essas, além da biomassa, sobre a qual a gente está
intensificando as pesquisas. Biomassa é tudo que é orgânico. Por meio de
processos químicos que a transformam, ela se torna gás, líquido e sólido. No
Brasil, em relação a combustíveis, a situação é um pouco diferente do resto do
mundo. Temos uma matriz energética com alta participação das fontes renováveis
e, como consequência, também da biomassa. Temos hidrelétrica, queima de lenha,
etanol. A energia usada a partir da cana-de-açúcar inclui etanol e
bioeletricidade, gerada a partir do bagaço da cana. O uso do etanol e bagaço
chega a superar o da energia das grandes usinas hidrelétricas. Segundo dado
oficial da EPE, 15,7% de toda energia usada no Brasil vêm da cana e 14,7%, das
hidrelétricas.
ABr - A bioeletricidade do bagaço de cana já está chegando
às casas no Brasil?
Cabral - Sim. Ela abastece as próprias
usinas, mas muitas [delas] têm excedentes e jogam para a rede de distribuição.
Por meio de leilões, ela chega às casas.
ABr - Quais as vantagens do uso da
biomassa?
Cabral - A mais importante em termos mundiais é
que quando você usa uma fonte desse tipo, renovável, você diminui a emissão dos
gases de efeito estufa. No caso da cana e do eucalipto, por exemplo, a planta
absorve gás carbônico. Uma parte do que é gerado na queima do combustível é
absorvida de novo. Em termos locais, no Brasil, a produção da biomassa tem
efeito de geração de emprego e desconcentração de renda. O petróleo é explorado
por algumas poucas grandes empresas. No caso da produção de cana, soja,
florestas energéticas, estamos falando de centenas de milhares de produtores. Há
ainda o próprio fato de que são fontes renováveis, não vão acabar. A questão dos
resíduos também ganha importância. Os resíduos da biomassa eram problemas
ambientais e hoje são fontes de matéria-prima. É o caso do sebo bovino. Nos
frigoríficos, [ele] era vendido como sabão ou jogado fora. Muito rico em
gordura, ele causava grandes problemas ambientais. Hoje é usado para produção de
biodiesel. O bagaço da cana também sempre foi queimado. A folha da cana não era
aproveitada. Há dez anos, antes de cortar, queimava-se a folha e isso liberava
gás carbônico para a atmosfera. Hoje ela é usada para produzir mais etanol. É o
chamado etanol celulósico.
ABr - Que tipo de pesquisas estão sendo conduzidas na
Embrapa a respeito desse tema? Qual será o futuro, o próximo passo em relação à
biomassa?
Cabral - Há várias pesquisas para melhorar o
aproveitamento do resíduo [de biomassa], novos materiais. Temos aqui pesquisas
com fibras que podem ser usadas para muita coisa. Há um projeto que a gente
chama de nanofibras de celulose, a partir dos resíduos do dendê. Um outro
[projeto] usa a glicerina, produzida junto com biodiesel, como matéria-prima
para o xilitol e o sorbitol. Os dois são álcoois muito importantes, com
aplicação na indústria. O sorbitol é usado como conservante de alimentos. Para o
futuro, a tendência é aumentar o número de biorrefinarias. Assim como existe a
refinaria de petróleo – onde ele chega e é desmembrado em combustíveis, produtos
para a indústria química, asfalto –, a biomassa chega à biorrefinaria e é
transformada em vários produtos. Entre eles estão os biocombustíveis, alimentos,
as rações animais, os produtos químicos, a bioeletricidade. As atuais
biorrefinarias são as usinas de açúcar e álcool e as fábricas de biodiesel. O
conceito de biorrefinaria, que é recente, deve se tornar mais popular.
ABr - Quais as perspectivas para o futuro da matriz
energética brasileira?
Cabral - De toda a energia que
consumimos no Brasil, mais de 30% vêm do petróleo. Você tem toda uma cadeia
produtiva, refinarias, indústrias. O grande motivo de [isso] continuar sendo tão
importante é que esses polos não podem ser abandonados. Levando em conta a
projeção da EPE para 2030, o que vai haver de importante é o gás natural, que é
um combustível fóssil. Estamos investindo muito em petróleo, e as reservas de
petróleo têm gás natural também. O uso dele vai diminuir e o da biomassa vai
subir um pouco.
Edição: Talita Cavalcante
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Extraído do site: http://agenciabrasil.ebc.com.br/noticia/2013-06-03/uso-de-materiais-organicos-na-producao-de-combustiveis-tende-aumentar-diz-pesquisador
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