Pesquisa
demonstra que maioria não descarta o próprio lixo
Trabalho da psicologia social identificou comportamento dos
consumidores nos shopping centers e propõe soluções para a sujeira
Alexandra Martins/UnB
Ciência
Henrique Bolgue
Da Secretaria de Comunicação da UnB
Quase 100% das pessoas ouvidas por Cleide Maria de Sousa não recolhem o lixo
que produzem durante refeições fast food. Para escrever sua tese – “Como, logo
corro: sobre deixar o lixo em espaço semi-públicos” – a doutora em Psicologia
ouviu 239 consumidores e observou outros 848. A atitude “inconsciente” despertou
sua curiosidade. Além de descobrir padrões de comportamento, a investigação
demonstrou que com pequenas ações é possível mudar esse cenário.
O trabalho focou a prática de abandono de lixo (restos de comida, pratos
sujos, embalagens usadas etc) em praças de alimentação de shopping centers, um
local semi-público – ambiente público apropriado pelo privado. Cleide descobriu
o que parece óbvio, mas que passa despercebido, principalmente por quem pratica
a ação: cerca de 93% das pessoas não recolheram os resíduos. “As pessoas agem
assim diante de barreiras que as estimulam a deixar o lixo, mas provavelmente
também influenciadas por fatores culturais”, diz a pesquisadora. Segundo ela,
nem todos assumem a atitude. "No descarte do lixo, que é um comportamento
normatizado, há uma discrepância muito grande entre o que se diz e o que se
faz".
ORIENTAÇÃO - O estudo durou oito meses e foi realizado em
regiões distintas do Distrito Federal. A pesquisa multimétodo envolveu aplicação
de parâmetros, entrevistas e observação. A última etapa demonstrou uma possível
solução para o problema. Em uma das praças de alimentação, por cinco semanas, as
mesas receberam dois prompts (mensagem escrita). Na segunda semana, a frase no
panfletinho era “Você deixa o lixo por aí?”; na quarta, “Você faz o que é certo?
Por favor, leve para a lixeira restos de comida e descartáveis”. Uma câmera
observou o comportamento em 1.465 casos. Todos as situações em que havia uma ou
mais mesas com resíduos por perto foram desprezadas neutralizar a influência do
efeito de “ambiente sujo”. Restaram 848 casos.
Depois da colocação dos avisos, cerca de 58% das pessoas começaram a recolher
bandeja e resíduos, contra 93% que, na ausência de4 avisos, esqueceram a sobra
sobre as mesas. “Orientações simples podem reverter o comportamento errado”,
explica Cleide. Nesse caso, foi dada ênfase à dimensão moral da conduta,
compartilhando a responsabilidade pela sujeira. As mensagens foram uma saída de
baixo custo e de fácil operacionalização. “É a psicologia criando tecnologia
social de intervenção para mudar comportamentos cotidianos, como lidar com o
lixo”, afirma ela.
Alexandra Martins/UnB
Ciência
DESCULPAS - Uma diferença crucial para mudar o comportamento
foi a retirada de cena dos funcionários da limpeza, que não estiveram visíveis
durante a pesquisa. Segundo Cleide, essa é um dos fatores inibidores para o
descarte correto, especialmente em um país ainda influenciado pela cultura
colonial de serviçais. A justificativa assume ares virtuosos em uma conhecida
desculpa usada Brasil afora: “Jogo lixo na rua para dar emprego para gari”. É o
que Lory Simonetti, estudante do 3º semestre de artes cênicas costuma ouvir dos
amigos. Desde que voltou da Inglaterra, onde passou seis anos, tenta
acostumar-se. “Lá todos levam o lixo para a lixeira”, lembra. “É uma questão de
etiqueta. Acho que essa desculpa de dar trabalho para alguém cria um valor
negativo para o trabalho de quem limpa”.
Isso é chamado de justificativa social. “É um mecanismo de racionalização
para não assumir responsabilidade”, explica Cleide. Entretanto, é uma desculpa
sem lógica. “É a mesma coisa que deixar minha criança adoecer para dar emprego
para o médico, ou morrer para ajudar o coveiro”, provoca Cleide.
PUNIÇÕES - A sujeira que vemos pela cidade em lugares de uso
comum representa a falência da norma social para controlar esse tipo de conduta,
segundo estudos de Psicologia usados como referência por Cleide. Eles apontam
que o comportamento transgressivo de jogar lixo encoraja outros indivíduos na
mesma direção ou até mesmo na violação de outras normas.
É muito provável que você já tenha visto alguém jogando lixo pela janela de
um carro. Segundo Cleide, que também pesquisou essa forma de descarte
inadequado, praticamente todos já presenciaram atitude semelhantes, o que
demonstra impunidade. Pelo Código Brasileiro de Trânsito, jogar resíduos pela
janela é falta média, que pode resultar em multa de R$ 85,13 e quatro pontos na
carteira de habilitação. “Em outros países, as multas são mais pesadas e um
número grande de punições”, disse. Ela afirma que a prática comum no Brasil pode
provocar graves acidentes. “Já imaginou um coco verde sendo jogado pela janela
em direção ao seu carro? Há diversas estatísticas que ligam o descarte de
resíduo no trânsito a casos de morte”, diz Cleide.
*Fonte:http://www.unbciencia.unb.br/
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quarta-feira, 18 de janeiro de 2012
PSICOLOGIA SOCIAL
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