quinta-feira, 26 de junho de 2014

O conteúdo do Instituto CarbonoBrasil possui direitos reservados, porém é liberado para organizações sem fins lucrativos desde que seja citada a fonte e incluída a URL para o portal. Em caso de dúvida, entre em contato. http://www.institutocarbonobrasil.org.br/noticias6/noticia=737226#ixzz35B3ZIw3z

Viva a Mata: Implementação das Metas de Aichi é lenta no Brasil

28/05/2014   -   Autor: Fernanda B. Müller   -   Fonte: Instituto CarbonoBrasil

Diretrizes nacionais e coordenação entre as esferas federativas e institucionais são essenciais para acelerar o cumprimento das metas nacionais da Convenção sobre Diversidade Biológica


Apesar dos anúncios feitos pelo governo brasileiro ao redor do mundo de que o país está conseguindo frear o desmatamento, a Mata Atlântica - um dos biomas com maior diversidade de espécies vegetais e animais do planeta e que já foi reduzida a apenas cerca de 8% da sua cobertura histórica - continua sendo devastada.
Prova disso é a nova edição do Atlas de Remanescentes Florestais da Mata Atlântica, lançado pela SOS Mata Atlântica e o INPE nesta terça-feira (27). O bioma perdeu 235 km² de vegetação entre 2012 e 2013, um aumento de 9% em relação ao último período avaliado (2011-2012).
Diante de números como esses, fica claro que o Brasil está enfrentando problemas para cumprir as Metas de Aichi para a Biodiversidade. Essas dificuldades foram debatidas no Viva a Mata, evento realizado em São Paulo, no Parque do Ibirapuera, na última semana.
As Metas Aichi são um conjunto de 20 objetivos destinados à redução da perda da diversidade biológica em âmbito mundial e faz parte do Plano Estratégico 2011-2020 da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), um tratado da Organização das Nações Unidas, do qual o Brasil faz parte.
O Ministério do Meio Ambiente (MMA) é o ponto focal para a implementação da CDB no Brasil, e a iniciativa ‘Diálogos sobre Biodiversidade: construindo a estratégia brasileira para 2020’ é a ferramenta criada pelo governo com o objetivo de construir de forma participativa as metas e o plano nacional para o cumprimento da CDB.
As metas nacionais foram publicadas em setembro de 2013 através da Resolução n° 6 do CONABIO. Dentre as diretrizes da resolução está o principio de se considerar as especificidades de cada bioma nacional e também as abordagens regionais, estimulando a participação ativa dos estados e municípios, bem como o amplo envolvimento dos diversos setores da sociedade neste esforço nacional.
Efetividade
Um anuário avaliando a aplicação das Metas de Aichi para a Mata Atlântica foi publicado com dados coletados desde 2011 pela ONG Reserva da Biosfera da Mata Atlântica (RBMA). Na primeira edição, foram analisados o grau de implementação dos cinco objetivos e 20 metas estabelecidos no Plano Estratégico de Aichi e traçou-se um panorama sobre os avanços, oportunidades e desafios para o cumprimento dessas metas no bioma.
Em 2013, o panorama traçado no ano anterior, focado nos objetivos globais, foi atualizado e o anuário foi feito tendo como base as 20 metas globais de Aichi, com pontos de destaque e desafios em cada meta.
Consolidou-se assim uma importante plataforma de base que permitirá, a partir de 2014, oferecer anualmente um quadro comparativo e evolutivo da situação da Mata Atlântica para cada meta até 2020.
O Anuário 2014 incluirá as metas nacionais, considerando que nem todas expiram em 2020 –os prazos variam, com metas intermediárias vencendo em 2014, 2015 e 2017 –, e as especificidades por bioma.
“Por exemplo, a Meta n° 11, referente às áreas protegidas: o Brasil já tem 17% em termos terrestres, mas isso é em grande parte na Amazônia, incluindo Terras Indígenas. Já nos outros biomas falta muito”, notou Clayton Lino, presidente da RBMA.
Além de as metas serem determinadas por bioma, para cumpri-las a questão deve chegar até os estados e municípios, em um esforço nacional, enfatizou Lino. A articulação também deve envolver os diversos setores governamentais e não governamentais, além da iniciativa privada.
Por isso, a RBMA, junto com a Rede de ONGs da Mata Atlântica, lançou durante o Viva a Mata a Carta da Mata Atlântica 2014. O documento, com 10 ações fundamentais para a reversão das degradações e proteção do bioma, é uma carta aberta aos candidatos a cargos eletivos em 2014.
A RBMA também fechou uma parceria com o CEBDS para trabalhar em conjunto as metas de Aichi, lidando com a contribuição do setor empresarial brasileiro para as metas.
Além disso, Lino ressalta que é importante não só dizer como estamos, mas entender as tendências.
“Voltando ao exemplo da meta n° 11, no caso da Mata Atlântica: não temos remanescentes suficientes para cumprir 17% de áreas protegidas. Teremos que restaurar e conectar. Temos cerca da metade, isso precisa dobrar até 2020, o que significa 1,5 milhão de hectares por ano”, alertou, completando que esse mesmo estudo de tendências está sendo feito para todas as outras metas.
Lino ainda ressaltou que projetos para a criação de áreas protegidas em quase dois milhões de hectares estão no Ministério do Meio Ambiente à espera da aprovação.
“Entre as medidas importantes para atingir essa meta está simplificar o processo de criação de Reservas Particulares do Patrimônio Natural, apoiar municípios, promover categorias de áreas protegidas que não requerem desapropriação, o ICMS Ecológico, entre outros”, concluiu.
A necessidade de integração com os municípios, e com os estados, também foi lembrada pelo Secretário Nacional de Biodiversidade e Florestas, Roberto Cavalcanti.
“As metas são do país, não do governo federal, mas ele tem que dizer como vai ser feito. Precisamos de uma estratégia para internalizar as metas”, notou.
Coordenação nacional
Diretamente, o impacto da falta de planejamento ambiental geralmente é sentido nos municípios, e eles, especialmente os de grande porte, têm diversos instrumentos para lidar com elas.
Sophia Picarelli, do ICLEI (Governos Locais pela Sustentabilidade), afirmou que a organização tem oito agendas urbanas que guiam suas ações, e uma é focada em biodiversidade. São Paulo e Curitiba são as cidades brasileiras que participam de um projeto piloto de três anos de duração chamado Ação Local para Biodiversidade (LAB), do ICLEI.
No nível dos estados, a Associação Brasileira de Entidades Estaduais (ABEMA), está trabalhando na análise da compatibilidade dos projetos em desenvolvimento nos estados com as Metas de Aichi.
A secretaria geral da associação, Diane Rangel, ressaltou que a maioria dos estados tem projetos relacionados a mais de uma das metas, e que a ABEMA está buscando esclarecer como será a customização destes projetos, além da criação de indicadores para que possam ser usados.
Rangel, que é Secretaria de Meio Ambiente e Recursos Hídricos do Espírito Santo (ES), contou que no estado foi criada uma comissão de biodiversidade para a gestão e acompanhamento do plano de ação voltado para o atendimento das Metas de Aichi. O estado também conta com o apoio financeiro do Programa Reflorestar, que inclui instrumentos como os pagamentos por serviços ambientais.
“No âmbito nacional não temos recursos para as questões ambientais. No ES temos dois fundos, um com royalties do petróleo [Programa Reflorestar] e outro com recursos das multas”, explicou.
A crítica sobre a ausência de coordenação entre os diferentes níveis de governos, e mesmo internamente nas secretarias, também foi apontada pelo Geógrafo Alceo Magnanini, um dos criadores do Código Florestal de 1965.
“O Brasil assinou vários compromissos internacionais e raramente eles são cumpridos, pois ficam aos cuidados de um órgão do governo que não tem vontade política para cumprir”, enfatizou.
Em frente
Então, surge a pergunta: Como provocar um projeto de futuro no país, fazendo com que as diferentes agendas [desenvolvimento, energia, meio ambiente etc.] dialoguem?
O secretário Cavalcanti ressaltou que um passo importante é a negociação que o Ministério do Meio Ambiente vem conduzindo junto ao Ministério do Planejamento para incorporar os critérios ambientais no Plano Plurianual (PPA), que dita as prioridades do governo federal, mas que é preciso mais pressão popular, pois a decisão é política.
Além do PPA e dos orçamentos, outra coisa é a “catequese cotidiana”, lembrou Rangel.
“Ainda não conseguimos os resultados, mas hoje a agenda econômica já passa a ver a agenda ambiental de maneira diferente (...) Outra forma é levar estado por estado, e município por município. Ninguém tem nada em comum, mas se tivermos um roteiro em comum vai ajudar muito. Precisamos que a presidente e o governador conheçam as metas e elas sirvam de roteiro. Mas isso deve virar política pública formal”, concluiu.
É importante lembrar também que, desde 2012, diversas entidades estão trabalhando para a instituição do Painel Brasileiro de Biodiversidade (PainelBio), uma plataforma colaborativa multi-stakeholder que visa identificar e executar tarefas necessárias para atingir as Metas de Aichi no Brasil. Em sua última reunião, na terça-feira (27), as organizações trabalharam a validação da proposta de contrato jurídico para implantação final do PainelBio.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Obrigado pelo sua participação e opinião !