terça-feira, 24 de dezembro de 2013

Ofensiva natureba

Ofensiva natureba

Com o aumento do índice de sobrepeso entre os cariocas, é cada vez maior a oferta de produtos e serviços para quem está em busca de uma alimentação mais saudável - e, ao mesmo tempo, saborosa

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Carolina Barbosa Veja Rio -

Marcos Pinto/Contigo!



Toda quinta-feira, por volta das 20 horas, a mesa já está posta no apartamento da chef Inês Braconnot, no Leblon, com direito a um belo arranjo de flores e a Frank Sinatra, ao fundo, cantando Fly Me to the Moon. Como mandam as regras de etiqueta em um bom restaurante, taças e talheres de diversos tamanhos escoltam o prato à espera dos convivas.

Para quem está na expectativa de um jantar classudo convencional, que custará R$ 120 por comensal, o que vem a seguir é surpreendente. No couvert, croquete de semente de girassol germinada com casquinha de gergelim, cacau e farinha de shiitake. A sequência continua com tartelete de mandioca com cogumelos sobre abacate e brócolis marinados e tem fim com uma espécie de brownie do bem. Ao contrário da versão convencional, o quitute é feito com tâmaras, castanhas-de-caju e passas e servido com calda de cacau. Acredite: tudo o que passou por ali, além de ter apresentação impecável, é delicioso e – melhor ainda – extremamente saudável.

Tais receitas exigiram horas de preparo e atenderam aos preceitos da raw food, braço do vegetarianismo que prega a ingestão apenas de alimentos crus ou aquecidos até 42 graus. “Quando comecei a seguir essa corrente, era tudo cortado, picado e misturado. Fazia bem à saúde, mas não havia nenhum requinte na forma de preparar ou servir”, lembra a cozinheira, que tem entre seus clientes o ator Paulo Betti e a designer Mana Bernardes.

Graças à popularização de técnicas culinárias apuradas e ao aumento da oferta de ingredientes mais apetitosos, a cozinha natural vem conquistando o paladar dos cariocas. Nada a ver com tofu grelhado, arroz integral ou carne de soja. O que vem acontecendo é a multiplicação de lugares e serviços que buscam oferecer uma alimentação rica em nutrientes, mas principalmente saborosa.

É um movimento que se espalha mesmo em ambientes antes dominados pelas bolinhas de queijo ou pelas trouxinhas de pato com laranja. Às lojinhas de produtos naturais, somam-se casas de festas infantis com cardápio de comidinhas orgânicas e bufês chiques que passaram a servir menus alternativos a todo tipo de público. “Hoje em dia, em qualquer evento, é preciso ter alguma coisa vegetariana, sem glúten ou lactose. Antigamente, o pessoal dizia que isso era coisa de hippie”, afirma Anna Elisa de Castro, formada pelo Natural Gourmet Institute, em Nova York, e sócia do 3 na Cozinha. Recentemente, para a festa de uma grife em Ipanema, ela preparou receitas como bifum (para quem não sabe, trata-se de um macarrão de arroz) ao molho pesto e hamburguinho de quinoa. Pensa que alguém estranhou? “Várias convidadas vieram à cozinha me pedir a receita”, conta a chef.

Longe daqueles que transformam a abstinência de carne, leite, ovo ou alimentos cozidos em profissão de fé, essa nova geração de naturebas não é adepta de radicalismos. Pelo contrário. Os seguidores da alimentação natural não abrem mão dos prazeres da gula, do chope, dos quitutes dos botequins, de um brigadeiro de chocolate belga de vez em quando. Em compensação, aventuram-se na cozinha para preparar refeições saudáveis e têm na ponta da língua (e nas prateleiras da despensa) os mais novos lançamentos das lojinhas especializadas ou da feira de orgânicos. 
Tomás Rangel
Mariana Ximenes: "Outro dia fiz um jantar naturebinha e até quem não era fã dessa comida gostou"
Trata-se de um grupo que se torna cada vez mais robusto e do qual faz parte a atrizMariana Ximenes, no ar como a vedete Aurora da novela das 6, Joia Rara, da Rede Globo. Boa de garfo, do tipo que traça sem culpa uma leitoa assada, ela sabe que não pode viver em uma eterna orgia gastronômica – como bem mostram suas medidas invejáveis: 1,65 metro de altura e 48 quilos. 

Seu café da manhã ultimamente tem sido apenas um suco verde, bebida que mistura ingredientes como couve, pepino, cenoura e linhaça germinada, além de outras folhas. Em dias de gravação, ela segue uma lição que aprendeu com a colega Claudia Raia. Carrega uma marmita recheada com legumes, verduras – todos cultivados segundo práticas sustentáveis de produção –, peixe e, eventualmente, arroz e feijão. “Não abro mão de comer o cordeiro do Nova Capela ou os bolinhos do Bracarense. Só não faço isso sempre”, afirma. “Outro dia preparei um jantar naturebinha e até quem não era fã desse tipo de comida gostou”, revela a aspirante a chef, de 32 anos.

Alçados ao posto de salvadores da boa forma, plantas, raízes e frutos fazem parte da nossa alimentação desde os primórdios da humanidade. À medida que os homens foram aprendendo a caçar, com lanças e facas, as proteínas ocuparam um espaço maior no cardápio. A dieta de carnes e folhas seguiu equilibrada durante séculos. Com a Revolução Industrial, no fim do século XVIII, porém, a comida industrializada começou a ganhar mercado como uma opção mais prática e adequada à rotina dos homens e mulheres que passaram a encarar longas jornadas de trabalho fora de casa.

Altamente calóricos e com teores elevados de aditivos químicos, os enlatados, os congelados e as opções de fast-food não saíram mais das prateleiras dos mercados, ao mesmo tempo em que a população se tornou visivelmente mais gorda. Nos Estados Unidos, três em cada cinco pessoas (61,6%) sofrem com o sobrepeso ou a obesidade. Nós não estamos muito atrás: no Rio, esse índice é de 52,4%.

Foi justamente na tentativa de exterminar esses quilos extras que começou a se desenhar no exterior, durante os anos 60, um movimento de volta às origens, com a popularização das principais correntes de alimentação natural e o desenvolvimento daagricultura orgânica. Agora esse processo chega ao seu ápice. “As pessoas nunca se preocuparam tanto com o que põem no prato. E não se trata de um modismo, mas de necessidade mesmo”, diz a nutricionista Patricia Smith.

Essa turma não gosta muito de ouvir isso, mas os agrotóxicos e fertilizantes cumprem um papel fundamental na agricultura. Sem eles, seria impossível atingir um nível de produção capaz de alimentar a população do planeta. Os orgânicos são ótimos, é cada vez mais fácil encontrá-los nas gôndolas de supermercado, em lojinhas, feiras e até restaurantes, mas comê-los ainda é um luxo. E para poucos. Eles representam apenas 1% da produção mundial, o que faz com que custem muito mais caro do que seus pares convencionais. A diferença de preço pode variar de 30% a 600%.

Adepta desse tipo de alimentação, a atriz Grazi Massafera resolveu começar a própria plantação, no terreno de casa. “Além de ser um investimento na nossa saúde, a conta do supermercado fica mais em conta”, explica.

Os produtores, no entanto, costumam defender a tese de que os benefícios em longo prazo superam o prejuízo financeiro. “No alimento convencional não está embutido o preço da poluição do solo, da água, do remédio que você pode vir a tomar, da intoxicação do produtor. Se colocarmos tudo isso na ponta do lápis, esse produto sairá muito mais caro”, afirma o ator Marcos Palmeira, que inaugurou o Armazém Vale das Palmeiras em fevereiro deste ano, no Leblon, para vender legumes, pães, queijos e vegetais de sua fazenda, na Serra Fluminense. Desde então, os pedidos já aumentaram 30%.

Em certa medida, o que está acontecendo aqui é reflexo de um movimento que vem se consolidando lá fora. Nos Estados Unidos, paraíso dos hambúrgueres, tornam-se cada vez mais populares redes de fast-food, como Pret a Manger, Lyfe Kitchen e Veggie Grill, que apostam no estilo de vida verde. A ideia nesses endereços é que o cliente faça uma refeição rápida, com tudo pronto e embalado para consumo, mas sem ingerir frituras ou outros inimigos da boa forma.

Foi justamente esse modelo que serviu de inspiração para o restaurante cariocaMarket, em Ipanema. Depois de fechar as portas por causa do preço do imóvel, ele será reaberto no mesmo bairro ainda neste mês.

Nessa mesma linha, no vizinho Leblon, ao lado da Pizzaria Guanabara, será inaugurado o Jaee, dos sócios Fred Weissmann e Maria Emanuella Severiano Ribeiro, com sessenta tipos de salada, sanduíche e suco que poderão ser incrementados com os ingredientes da moda, como a chia e o goji berry.

Partindo para o universo da alta gastronomia, além de restaurantes estrelados comoOro Le Pré Catelan, que passaram a oferecer menus vegetarianos ou light, a grande novidade será o Pomar, que chega ao Itanhangá neste ano. Para montar a casa, a chefAndrea Henrique se inspirou no Pure Food and Wine, meca da alimentação saudável em Nova York, que faz sucesso há quase uma década e atrai clientes como a atriz Katie Holmes, o jogador Tom Brady e o ex-presidente Bill Clinton. De lá trouxe a ideia de elaborar uma carta de bebidas toda orgânica, com cachaças, vinhos e drinques. “Ninguém aguenta mais tomar água com gás e comer omelete com salada fora de casa para se manter na dieta”, diz Andrea.

A maior dificuldade para aqueles que buscam esse estilo de vida muitas vezes está dentro de casa. No dia a dia, é complicado abrir mão de certos hábitos e praticidades, mas esse obstáculo está ficando mais fácil de ser vencido. Já existem inúmeros serviços de delivery – de suco verde a açaí vivo, passando por papinhas orgânicas para crianças e congelados light, detox, vegan, sem glúten ou lactose –, além de cursos para aqueles que querem aprender a preparar essas receitas.

Um dos mais concorridos é oferecido pela nutricionista Andréa Santa Rosa em parceria com Renato Caleffi, do restaurante Le Manjue Organique, em São Paulo, e vem atraindo cozinheiras de várias famosas, como Angélica, Juliana Paes e Guilhermina Guinle.

Uma das aulas de agosto, R$ 280 por pessoa, teve como tema o preparo de risotos, entre eles o de quinoa com carne de caju. Sim, carne de caju. Trata-se de um elemento recorrente na cozinha vegetariana que tem a consistência parecida com a do frango, mas nada mais é do que a fruta espremida e, depois, desfiada e cozida. “O pulo do gato é aprender a adaptar o cardápio através da substituição de alguns ingredientes por outros mais saudáveis”, afirma Caleffi. A propósito: o chef está à procura de um ponto na Zona Sul para fixar, em sociedade com Andréa e o marido, o ator e diretor Márcio Garcia, a filial carioca de seu restaurante. A ofensiva natureba está só começando.

AS TRIBOS NATUREBAS 
Os diferentes estilos e os seguidores de cada corrente de alimentação 

1. MACROBIÓTICA
Divididos em duas categorias, de acordo com a filosofia oriental do yin e yang, os alimentos devem ser combinados de forma complementar na hora da refeição. Produtos industrializados, carne vermelha, leite, laticínios e açúcar são proibidos. Fazem parte dessa tribo Madonna e Gwyneth Paltrow.

2. VEGETARIANA
Não se consomem carne vermelha nem branca, mas, dependendo do estilo do seguidor, alguns de seus derivados são permitidos. Os lactovegetarianos fazem uso de leite e laticínios. Ovos estão excluídos. Fazem parte dessa tribo Paul McCartney e Alanis Morissette.

3. VEGANA 
É o vegetarianismo ainda mais radical, quase uma filosofia de vida. Os veganos não comem nenhum alimento de origem animal, como ovos, queijo e leite, e também não fazem uso de roupas e objetos derivados dos bichos. Fazem parte dessa tribo Natalie Portman e Olivia Wilde.

4. CRUDIVORISTA
Além de proibir as carnes, esse estilo prega apenas a ingestão de alimentos crus ou aquecidos a até 42 graus, o equivalente à temperatura da palma da mão. Fazem parte dessa tribo Robin Williams e Alicia Silverstone.

5. ORGÂNICA 
Aqui a preocupação não é com o tipo de alimento que pode ser ingerido, mas com a forma como ele é cultivado, livre de insumos químicos como agrotóxicos, para evitar pragas, e fertilizantes, que aumentam a produtividade do solo. Faz parte dessa tribo Grazi Massafera.

6. SEM GLÚTEN NEM LACTOSE 
Seus seguidores não ingerem alimentos com aveia, trigo nem centeio, no primeiro caso; tampouco consomem itens como leite de vaca e de cabra, queijo, manteiga, requeijão e creme de leite, na segunda situação. Fazem parte dessa tribo Isis Valverde e Miley Cyrus.

O QUE VEM POR AÍ
Ingredientes que já estão à venda lá fora e podem se popularizar por aqui em breve

1. GOLDENBERRY
Cultivada em fazendas no entorno da Cordilheira dos Andes desde o império inca, essa frutinha, conhecida como físalis, é vendida seca. Ótima fonte de nutrientes como betacaroteno, flavonoides e vitamina A, pode ser usada em saladas, sobremesas e no preparo de biscoitos.

2. TEFF
O minúsculo grão etíope não contém glúten e é uma ótima fonte de ferro. Pode ser consumido cozido e, no exterior, sua farinha também é muito usada na fabricação de pães.

3. MACA PERUANA 
Com forma semelhante à do rabanete, esse tubérculo é pouco calórico e rico em fibras, o que dá saciedade e ajuda a emagrecer. Vendido em cápsulas ou farinha, também contém ômega-3, que ajuda a regularizar o colesterol.

4. MULBERRY
Espécie de amora seca, é ótima fonte de ferro, cálcio, vitamina C, proteínas e fibras. Também contém resveratrol, o mesmo agente antienvelhecimento encontrado no vinho tinto.

5. MULBERRY
Popular nos Estados Unidos, onde já está à venda em lojinhas e supermercados, é uma bebida feita a partir da fermentação do chá-preto ou do chá-verde com açúcar, que contribui para regenerara flora intestinal.

ROTA SAUDÁVEL 
Endereços e serviços cultuados pela nova geração de naturebas, no Rio de Janeiro

1. ARMAZÉM VALE DAS PALMEIRAS 
O espaço do ator Marcos Palmeira vende vegetais, pães, queijos e azeites orgânicos.
Endereço: Avenida Ataulfo de Paiva, 1100, loja C, Leblon, (21) 2294-0988.

2. CURSO DE CULINÁRIA FUNCIONAL 
Comandado pela nutricionista Andréa Santa Rosa, acontece duas vezes por mês.
Endereço: Rua Professor Júlio Lohman, 105, Estrada do Joá, (21) 2429-7045.

3. EMPÓRIO DA PAPINHA 
São sessenta versões feitas com orgânicos.
Endereço: Estrada da Barra da Tijuca, 1636, loja A, bloco A, Barra, (21) 2491-1699;
Rua Visconde de Pirajá, 414 (Quartier Ipanema), 2º piso.

4. ESCOLA DE CULINÁRIA NATURAL 

A chef Clara Aurora ensina a fazer pratos da culinária natural e da macrobiótica, em aulas semanais.
Endereço: Rua Barão da Torre, 81, Ipanema, (21) 2521-1729.

5. ESPERANZZA 
Faz entrega de suco vivo, açaí vivo, leite de castanhas com linhaça germinada e granola viva. Entregas pelo (21) 2484-7826.

6. INÊS BRACONNOT
Com couvert, entrada, prato principal e sobremesa, tudo cru, a chef recebe até seis pessoas para provar seu menu raw food. Reservas por e-mail.

7. JAEE
Inaugura com cardápio de sucos, sanduíches e saladas.
Endereço: Avenida Ataulfo da Paiva, 1228, loja B, Leblon.

8. MARKET 

O restaurante reabre até o fim do mês com pratinhos rápidos para comer na hora ou levar para casa.
Endereço: Rua Visconde de Pirajá, 452, loja 1, Ipanema, (21) 3283-1438.

9. POMAR 

Abre até o fim do mês com pratos vegetarianos, veganos e raw (crus) e uma mercearia. Endereço: Estrada da Barra da Tijuca, 1636 (Espaço Itanhangá), Barra.

10. SÍTIO DO MOINHO 
A loja vende produtos orgânicos variados e oferece café da manhã aos sábados.
Endereço: Rua General Urquiza, 188 C, Leblon, (21) 3795-9150.

A mata que foi salva

A mata que foi salva

Depois de desmatar metade de um Paraguai ou duas vezes o estado de Santa Catarina de 1995 a 2004, o Brasil virou referência mundial em combate à derrubada de árvores

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Daniel Barros
Exame - 13/11/2013
Greenpeace/Marizilda Cruppe

Nos últimos oito anos, o Brasil conquistou uma grande vitória na guerra contra o machado e a motosserra. Desde 2005, a média anual de área desmatada na Amazônia caiu pela metade - graças, principalmente, à implantação de um sistema de monitoramento da floresta por satélite, que fortaleceu o trabalho de fiscalização, e à criação de novas unidades de conservação ambiental no norte do país. 


Agora o governo brasileiro estuda pôr em prática um plano de ação semelhante para ajudar a preservar a mata do cerrado. O objetivo é estabelecer metas para diminuir o desmatamento dessa vegetação a ser atingidas até 2020 - a previsão é que essa etapa do trabalho esteja concluída em março do ano que vem. A disposição de enfrentar a derrubada das árvores no cerrado é muito bem-vinda, mas é preciso prestar atenção. 
Veja infográfico.



Em 2013, novos focos de desmatamento vêm surgindo na região amazônica, em especial no oeste do Pará e no sul do Amazonas, segundo dados da Imazon, ONG que usa imagens de satélite para acompanhar o que anda acontecendo na floresta. As últimas estimativas mostram que os grileiros de terra estão avançando de novo.



CONCLUSÃO
Segundo estimativas da Imazon, a área de floresta derrubada em 2013 deverá crescer em relação ao ano passado. "O aumento será puxado pelo oeste do Pará e por parte do Amazonas e de Rondônia, em regiões onde quase não havia desmatamento nos ano 90", diz Beto Veríssimo, presidente da Imazon. Todo cuidado é pouco para que não se volte à era de ouro da serra elétrica. 

Um país sem emissões de carbono: um sonho possível?

Um país sem emissões de carbono: um sonho possível?

Sim! Na Inglaterra, cientistas revelam que o país é capaz de zerar suas emissões até 2030, e ainda com as tecnologias já existentes. Investimento em energia limpa é fundamental

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ugardener/Creative Commons


*Colaborou Jéssica Miwa
Parece difícil imaginar que algum país populoso pode zerar emissões de gases efeito estufa e, consequentemente, ajudar a desacelerar o aquecimento global? Pois o Centro de Tecnologia Alternativa da Inglaterra garante que sim, no estudo ‘Zero Carbon Britain: Rethinking the Future’, lançado em julho deste ano.


O time responsável por esse documento - que reúne engenheiros, um físico, uma nutricionista, um cientista social, entre outros pesquisadores - não propõeretrocesso econômico ou político com base em ‘planos mirabolantes’, mas a aliança natural entre qualidade de vida da população e meio ambiente. Até porque, já é mais do que comprovado que para ser feliz por completo é preciso estar de bem com a natureza. 



Não se trata, portanto, de parar de emitir. Basta reduzir as emissões e compensar o que não foi possível cortar. Por exemplo, em 2010 a Inglaterra emitiu 652.1 MtCO2; destas, 23.8 MtCO2 foram reabsorvidas – balanceando parte das emissões do país. Portanto, o saldo terminou em 628.3 MtCO2 negativos. 



O objetivo do grupo é transformar o saldo final em nada mais que ZERO, sem depender de tecnologias em desenvolvimento. Ou seja, só foram levadas em conta tecnologias já existentes.



Investimentos em eficiência energética e energia renovável – especialmente eólica – foram apontados como fundamentais para alcançar essa meta. Hoje, a energia daquele país é responsável por 82% das emissões de gases de efeito estufa. Plantar florestas, enterrar materiais orgânicos e capturar e armazenar carbono também estão entre as medidas sugeridas para reabsorver os gases emitidos.

segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

A reinvenção do fogo

REVOLUÇÃO ENERGÉTICA

A reinvenção do fogo

Para resolver a crise global de energia e evitar que o clima destrua nossa civilização, a humanidade precisa de uma nova revolução

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Alexandre Carvalho dos Santos
Superinteressante 
Ilustração: Alexandre Piovani

Foi o fogo que nos fez humanos. Quando o homem pré-histórico dominou a chama, conquistou uma fonte de energia que permitiu cozinhar a comida, aumentando a ingestão de nutrientes e tornando possível um cérebro tão potente.


Milênios depois, foram os combustíveis fósseis que nos fizeram modernos. A queima de carvão e petróleo tornou disponível à nossa espécie uma quantidade mastodôntica de energia, o que inaugurou a civilização industrial – e possibilitou os carros, as fábricas, os aviões, a globalização, a internet.



Agora, à beira de uma crise ambiental que ameaça destruir nossas cidades, nossas plantações e nossa economia, o homem precisa de uma terceira revolução. “Precisamos reinventar o fogo”, diz o físico Amory Lovins, considerado pela revista Time uma das 100 pessoas mais influentes do planeta.



“É um absurdo que, no século 21, 80% da energia consumida ainda seja gerada com a queima de pântano decomposto”, disse Lovins numa palestra. Soa mesmo pré-histórico: iPads movidos a carvão queimado. Assim, sufocamos a Terra com uma nuvem de fumaça e fuligem.



crise de energia que enfrentamos na verdade são duas. De um lado, a energia que usamos para transporte, que move carros, caminhões e aviões. Do outro, aquela que produzimos em usinas e serve para abastecer casas e fábricas, e para iluminar ruas. Cada um desses problemas parece impossível de resolver. Lovins acha que a solução é juntar os dois. “O problema da energia é mais fácil de resolver junto que separado”, diz.



Ao mesmo tempo em que mudamos o combustível dos carros, tornando-os elétricos, precisamos mudar a matriz energética do mundo, trocando o óleo e o carvão por sol, vento e gás gerado pela queima de lixo. Resolver um sem o outro não adiantaria. Carros elétricos não servirão para nada se a energia que eles puxam da rede continuar provindo de pântano queimado. E serão as baterias dos carros, plugados na rede, que armazenarão a energia solar e eólica para os dias nublados e sem vento.



Lovins tem um plano para aposentar carvão e petróleo até 2050. “Será uma das transições mais importantes da história, rumo a um novo modelo de civilização, com energia de fontes gratuitas e inesgotáveis”. Uma revolução tão grande quanto a descoberta do fogo. Veja algumas ideias que irão alimentar essa revolução.



APROVEITE A BRISA DO MAR
O vento gira uma hélice gigante conectada a um gerador que produz eletricidade. Difícil encontrar fonte de energia mais limpa que a eólica. Só que as turbinas ocupam espaço pacas e causam inconvenientes para quem vive perto delas. 



Em Portugal, uma solução criativa foi levá-las para o lugar que fez a fama de Cabral: o mar. Além do espaço abundante, no oceano não tem prédio ou montanha obstruindo o vento. 



No final de 2011, a EDP, companhia de energia portuguesa, instalou sua primeira turbina eólica offshore, com uma tecnologia chamada WindFloat, um sistema flutuante. Portugal, diga-se, já tem quase 50% de sua energia proveniente de fontes limpas. A meta é que, em 2020, elas respondam por dois terços do total. Melhor trocar a piada de português pela de papagaio.



CARREGUE MENOS PESO
Dois terços da gasolina no tanque de um carro é usada para mover o peso do próprio carro. Não faz mesmo muito sentido usar duas toneladas de aço para carregar cerca de 100 quilos de gente – na média, um carro transporta 1,4 pessoa.



A Alemanha saiu na frente na corrida para criar carros feitos de ligas metálicas superleves. Incentivadas pelo governo, que está taxando os compradores de carros beberrões e usando o dinheiro para subsidiar os mais econômicos, a Volkswagen e a BMW lançaram este ano seus primeiros modelos de veículos ultraleves. O XL-1, da Volks, feito de fibra de carbono, faz mais de 100 quilômetros com um litro de gasolina.



O desenvolvimento de carros mais leves pode ser a tecnologia que faltava para finalmente viabilizar os carros elétricos. Afinal, hoje em dia, os elétricos já são bonitos, rápidos, confortáveis e não custam mais uma fortuna absurda. Só que ninguém quer um carro cuja bateria descarrega depois de 200 quilômetros, e depois leva horas para recarregar. Se o peso do veículo diminuir, a bateria poderá durar o dobro.



Ah, enquanto a Alemanha cria incentivos para que empresas inovem, no Brasil carro elétrico paga o dobro do IPI do carro a gasolina. Não é à toa que, enquanto no mundo a frota de veículos elétricos e híbridos já passou dos 4,5 milhões de veículos, a frota elétrica brasileira é de 70. Não 70 mil – 70 carros mesmo. “Só existe carro elétrico onde há políticas públicas de incentivo. E o Brasil é um dos únicos países sem nada nesse sentido”, diz Paulo Roberto Feldmann, economista da USP.



A INVEJA VAI SALVAR O MUNDO
Dez anos atrás, o pesquisador do comportamento Robert Cialdini conduziu uma pesquisa curiosa na Califórnia. O objetivo era descobrir como convencer as pessoas a economizarem energia. Um quarto dos moradores recebeu um bilhete emocional, tipo “salve o planeta”. Outro grupo foi abordado com um apelo cívico: seja um bom cidadão”. Um terceiro recebeu o bilhete “desligue o ar e economize 54 dólares”. Todas essas abordagens tiveram efeito zero. Mas o quarto grupo recebeu um bilhete que dizia “seus vizinhos estão economizando mais que você”. A redução das contas foi brutal. 



Humanos são seres sociais, que se importam com o que os outros fazem. Com base nessa pesquisa, surgiu a Opower, uma empresa que usa design para fazer contas de luz com gráficos que comparam seu uso de energia com a média dos vizinhos e os mais econômicos entre eles. A conta traz também dicas para quem quer melhorar. 



A Opower está atuando em seis países melhorando o design das contas de luz, e calcula que já economizou US$ 250 milhões em contas. Motivar as pessoas a economizar é fundamental porque oito em cada nove unidades de energia produzidas são desperdiçadas.

DEIXE O SOL AQUECER E O VENTO ESFRIAR
Parece bobagem, mas o consumo global de energia pode baixar muito apenas reformando prédios e casas ao redor do mundo. Exemplo disso é o Empire State Building, prédio famoso de Nova York. Em 2009, foi feita uma obra para vedar as janelas (de maneira a não perder calor) e usar vento e sol para regular a temperatura. A obra custou US$ 20 milhões. Acha muito? Pois, com a economia de energia, o investimento já se pagou em apenas três anos. 



A petroquímica Dow fez uma reforma bem mais ambiciosa em sua sede para torná-la mais eficiente. Gastou US$ 1 bilhão – e já faturou 9 bilhões com a economia. Provavelmente tem oportunidades para ganhar uns trocados reformando a sua casa também.



OUTRA FORMA DE COBRAR
Hoje, empresas de energia ganham mais dinheiro quanto mais energia você usa. Esse é um bom exemplo de incentivo perverso. Desse jeito, as empresas não se sentem nem um pouco estimuladas a economizar. “Devíamos pagar mais às empresas que fazem seus clientes reduzirem a conta de luz”, diz o físico Amory Lovins, cientista-chefe do Instituto Rocky Mountain de energia. 



Incentivos bem planejados podem acelerar muito a mudança de hábitos. No Reino Unido e nos Estados Unidos, por exemplo, o governo criou programas de estímulo a empresas de energia limpa. Com isso, surgiram empresas como a inglesa A Shade Greener e a americana Sun Run, que instalam paineis solares na casa dos clientes e não cobram um centavo deles. O cliente ganha um painel solar inteiramente grátis e ainda poupa todos os meses na conta de luz. Em troca, a empresa recebe os incentivos do governo e passa a ter o direito de explorar os paineis, vendendo energia para a rede.



Não é o governo que vai resolver a crise de energia: somos eu e você, com as decisões que tomamos no dia-a-dia sobre como nos locomovemos, como iluminamos nossas casas, como nos aquecemos. Mas o governo pode ao menos criar estímulos para nos comportarmos melhor.



DESCENTRALIZE JÁ!
Você sabe como funciona esse negócio de energia. De um lado, uma empresa gigante que opera usinas imensas, produzindo energia em quantidades astronômicas. Do outro, nós, tomando banho em nossos chuveiros elétricos, queimando pão com nossas torradeiras. Pois não precisa ser assim.



Na Alemanha, as redes elétricas têm duas mãos – são as chamadas redes inteligentes. Assim como qualquer pessoa pode puxar energia da rede (e pagar por isso), todo mundo pode produzir energia em casa e jogá-la na rede (ganhando dinheiro por isso). “Eu pago todos os custos da minha casa com a energia gerada pelas placas solares que eu mesmo instalei no telhado”, diz o engenheiro Peter Loster, que vive numa casa em Straubing, na Bavária, e fatura algo como 500 euros por mês vendendo energia para a rede elétrica europeia (quase R$ 1.300). Na Bavária, estado ensolarado ao sul da Alemanha, há em média três paineis solares por habitante – uma capacidade de produção de energia solar maior que a dos Estados Unidos inteiros.



Empresas como a alemã Siemens e a americana GE já vendem kits completos bem simples que qualquer um pode instalar em casa. Produzir energia perto de onde ela é consumida é bom porque linhas de transmissão são ridiculamente ineficientes. Na média, dois terços da energia que sai da usina se perde antes de chegar na sua torrada. Mas claro que as grandes empresas de energia não querem perder o monopólio e no mundo todo fazem lobby para evitar que as redes elétricas deixem o consumidor fornecer.

A era do computador que aprende – e age – sozinho

A era do computador que aprende – e age – sozinho

De acordo com a IBM, os próximos cinco anos serão marcados pela popularização de computadores capazes de reconhecer as necessidades dos usuários, e atendê-las prontamente

RAFAEL CISCATI

Kindle
Share2

Segundo a IBM, nossos computadores e celulares vão aprender com nossos hábitos, para nos proteger de fraudes ou, automaticamente, dizer à prefeitura qual o melhor momento de por um ônibus na rua (Foto: Getty Images)

E se os computadores pudessem interagir com as pessoas, reconhecer suas necessidades e, sozinhos, realizar atividades complexas? Era nisso que Fábio Gandour, cientista chefe da IBM Brasil, pensava no começo do ano, enquanto tentava entrar em contato com seu banco. Durante uma viagem aos Estados Unidos, o cartão de crédito de Gandour foi bloqueado. Baseado no histórico de compras do cientista, os computadores do banco acharam que algo estava estranho – afinal, as compras eram feitas em outro país – e que havia chances de o cartão ter sido roubado. Não tinha. Ao tentar telefonar para resolver o mal entendido, Gandour deu de cara com linhas telefônicas ocupadas e funcionários desinformados. “Mas, e se o mesmo computador que bloqueou meus cartões percebesse que eu estava tentando entrar em contato com o banco e relacionasse as duas coisas para resolver meu problema?”. Esse tipo de máquina, capaz de entender o que se passa no ambiente e agir por conta própria, compõe aquilo que os cientistas chamam de computação cognitiva. Para a IBM, gigante do setor de tecnologia, serão elas as protagonistas das principais inovações tecnológicas dos próximos cinco anos.
Anualmente, a IBM publica uma previsão do futuro tecnológico para os 5 anos seguintes: o IBM 5 IN 5. Para a empresa, esse exercício ajuda a definir os rumos que a companhia deve tomar em suas pesquisas. Segundo a edição de 2013, divulgada nesta terça-feira (17), os próximos cinco anos serão marcados pelo uso cotidiano de computadores que aprendem e interagem com o ambiente. As inovações devem afetar cinco principais áreas: a forma como aprendemos nas escolas; a forma como compramos; a forma como organizamos nossas cidades; as maneiras como cuidamos de nossa saúde e de nossa segurança.
O flerte da IBM com computação cognitiva é antigo. Remonta a 2003, quando a empresa divulgou o projeto do Watson, seu sistema inteligente capaz de interagir com seres humanos. O Watson ficou famoso quando, em 2011, venceu um popular jogo de perguntas e respostas na TV americana, competindo contra dois jogadores humanos.
No ano passado, as apostas da empresa para o futuro já incluíam a popularização de aparelhos com essas habilidades, e previam a adoção de tecnologias capazes de imitar os sentidos humanos: celulares que transmitem a textura de roupas à venda do outro lado do mundo e sensores inteligentes capazes de escutar os sinais do ambiente para prever uma enchente, por exemplo. Este ano, a IBM retoma o tema para reavaliar o impacto – e as possíveis aplicações – da computação cognitiva no cotidiano das pessoas. “A gente tinha uma visão muito otimista do mundo no ano passado”, diz Gandour. “Achamos que a disseminação desses conceitos seria muito mais rápida”.
Em 2013, uma das previsões mais ousadas diz respeito ao setor de varejo. Menos pela tecnologia utilizada que pelo fator comportamental envolvido. Em 2012, as compras pela internet alcançaram a cifra de US$1 tri em todo o mundo, e continuam a crescer. Mesmo assim, de acordo com a IBM, os próximos cinco anos vão assistir ao desenvolvimento das lojas físicas, em prejuízo das compras online. “Se as vendas online continuarem a crescer, o mundo vai ficar muito sem graça”, diz Gandour. “A evolução da tecnologia de vanguarda é pendular. Vai e volta até encontrar um ponto de equilíbrio. O mesmo deve acontecer com as vendas online”. De acordo com o relatório, os comerciantes locais vão aprender a driblar a web, incorporando as melhores experiências disponíveis na internet ao mundo offline. As lojas poderão tornar visível a avaliação dos consumidores em relação a dado produto. Ou usar o histórico de compras do cliente para prever preferências e próximas aquisições. Ao abordar o cliente, o vendedor saberá exatamente o que ele precisa e o que quer. Tudo isso de maneira quase automática, a partir de dados armazenados online.
A previsão contraria as tendências atuais, mas a IBM já trabalha em aplicativos capazes de, se usados em lojas físicas, oferecer experiências similares a essas. Resta saber se essas ferramentas vão se tornar populares. Gandour diz estar seguro. Tem motivos para isso: a empresa coleciona acertos. Em 2008, o IBM 5 in 5 preconizava a utilização de mapeamento genético para prever e evitar doenças. Hoje, a técnica existe e, apesar das críticas quanto a sua eficácia, vem se popularizando: é possível examinar seus genes para prever, inclusive,qual o melhor exercício físico para você. Mas a empresa também comete seus excessos – em 2007, anunciava que, até 2012, nossos “celulares seriam capazes de ler mentes”. Ainda não chegamos lá. Quem sabe nos próximos cinco anos.
O que esperar do futuro...
...nas escolas – As salas de aula entenderão as necessidades de cada aluno. A partir de dados armazenados online, o professor vai poder descobrir quais as principais dificuldades e aptidões de cada estudante, para oferecer programas de ensino individualizados.
...na medicina – Baseados na análise de seu DNA, os médicos poderão definir qual o melhor tratamento para cada tipo de câncer. Um computador inteligente poderá vasculhar bases de dados de registros médicos e, cruzando esses dados com as características de cada paciente, indicar tratamentos personalizados. Bastará ao médico perguntar.
...na segurança pessoal – Mais de 12 mil pessoas tiveram suas identidades roubadas nos Estados Unidos em 2012. Senhas, aparentemente, não bastam para evitar esse tipo de fraude. Um computador inteligente, que conhecesse seus hábitos de consumo, poderia evitar que falsários fizessem compras em seu nome. Segundo a IBM, esse tipo de “guardião digital” será popular até 2018.
...na vida urbana – Até 2050, sete em cada dez pessoas viverão em cidades. A tecnologia pode ajudar a tornar a convivência dessa população menos conflituosa. Seu celular vai saber que lugares você gosta de frequentar, e poderá te avisar da realização de um novo evento que possa te interessar. Mais que isso, sistemas inteligentes podem avaliar quando há mais pessoas nas ruas, e aumentar ou diminuir o número de ônibus em circulação.