terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Sobre árvores de Natal e outros enfeites

Sobre árvores de Natal e outros enfeites


Quando a gente se dá conta, está envolvido no ritual em algum momento criticado. Você sabe por quê?

ISABEL CLEMENTE

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Até bem pouco tempo, você achava um desperdício gastar dinheiro com enfeites
de Natal. Armazenar um pinheiro de plástico por 11 meses era algo inaceitável para seu modo de vida desprendido.
Espalhar bonecos de neve seria patético, ainda mais considerando o calor de lascar dessa época do ano.  Para você, acessórios com a cara do Papai Noel eram absolutamente cafonas. Nem objetos nas cores vermelha e dourado você admitia. Pra quê? Botar guirlanda na porta era uma iniciativa desnecessária. Montar um presépio, algo que não estava definitivamente nos seus planos.
Você no máximo admitia uma estrela estilizada em arame que, esquecida na estante, nem parecia ter sido comprada para o dia 25 de dezembro. Obra de arte vá lá. Ou ainda uma pequena árvore de Natal dobrável, a fim de não ocupar muito espaço no armário no resto do ano.
Mas você teve filhos. E tudo mudou.
Essa coluna é para você.
Passei os dois últimos Natais encaixotando móveis, roupas e brinquedos. Nos mudamos quatro vezes entre os Natais de 2011 e o de 2012. Juro. Tenho testemunhas.
Nos Natais dos cinco anos anteriores a 2011, pegávamos avião para estar com a família no Rio. Enfeitar a casa em Brasília ficava por último na lista de prioridades entre malas para fazer e desfazer. As ruas e as fachadas de Brasília ganham muitas luzes nesta época do ano. Lindo de ver. Saíamos os quatro, eu, meu marido e minhas filhas, só para ver o presépio de luz montado num dos muitos eixos desertos da capital e havia algo de sublime naquilo.
Minha mãe, no entanto, não deixava minha casa passar incólume pelo frenesi da decoração natalina e atropelava meus princípios antidecorativos. Sempre me presenteava com uma guirlanda ou outro enfeite qualquer com a cara do Papai Noel. Eu sorria agradecida pensando “mais um item desnecessário para eu armazenar por 11 meses“, mas pendurava o treco na porta.
Em cada uma das nossas mudanças, fomos nos desfazendo de tudo o que nos parecia acessório. Se algum objeto ficasse esquecido no armário por mais de seis meses caía na categoria do dispensável. A árvore de Natal só sobreviveu porque era pequena e ficou esquecida em alguma caixa de papelão, amassada e desfalcada dos embrulhos que faziam o papel de bolas. Este ano, ao desembrulhá-la, lembrei com nostalgia da minha euforia toda vez que mamãe anunciava seu plano de enfeitar a casa.
Tínhamos um pinheiro falso de galhos duros como gravetos verdes recobertos por um algodão. Já de ir atrás dele no sótão, eu percebia que estávamos entrando numa época especial do ano. O calendário mais divertido estava sendo inaugurado. Tinha o fim das aulas, as festas cheias de gente da família, as férias de verão. O coração palpitava. Faltava pouco para o Papai Noel passar na minha casa.
Mas antes era preciso abrir a caixa de papelão enorme e assustar as traças. Lá dentro encontraríamos os bonecos do presépio enrolados em jornais e muitas bolas quebradas em centenas de cacos tão finos quanto poeira de vidro. Eu recebia ordens expressas para não andar descalça. Montar a árvore era um acontecimento. Tudo o que eu queria era uma chance para pendurar algumas bolas, mesmo correndo risco de deixar uma ou outra se espatifar no chão. Achava engraçado também ficar abrindo a boca e me aproximar da bola pendurada para ver minha imagem distorcida até quase lambê-la. Sem falar no Papai Noel inflável, que éramos obrigados a reparar com esmalte todo Natal. Cada ano aparecia um furo novo. Tenho uma foto do lado dele quando ainda tínhamos o mesmo tamanho. Eu amava aquele boneco. Enquanto esse filme passava na minha cabeça, caiu minha ficha.
Eu fora resgatada.
No domingo seguinte, estávamos - eu, marido e filhas - na porta da loja de departamentos decididos a comprar uma nova árvore grande e linda. Deixamos as meninas escolherem os enfeites. A alegria era geral. Elas queriam um pouco de tudo. Eu me derretia com dois bonecos de neve brincando de gangorra, mas não levei. Meu marido queria comprar dois presentes iluminados. Na fila do caixa, tínhamos uma árvore de Natal de 450 galhos e acessórios suficientes para enfeitar pelo menos três destas. Devolvemos os excessos e pagamos. Também arrumei um presépio.
Em casa, a montagem foi uma grande diversão, com direito a cantoria de músicas natalinas e histórias sobre mais um capítulo de uma família pobre e um menino predestinado que nasceu num estábulo para um dia pregar o amor ao próximo. Surgiram muitas perguntas e teses.
“Se ele ganhou tanto tesouro de três reis magos, deixou de ser pobre?“
“Se o Papai Noel mora no Polo Norte, ele não pode ficar num shopping.“
Eufóricas, as crianças interagiam se ajudando e opinando sobre como a outra estava executando sua parte. Pareciam Tico e Teco, a dupla de esquilos implicantes do desenho animado, num momento de interação cerimoniosa.
“Aqui, ó, este galho ainda está vazio, Carol.“
“Você acha que eu posso botar essa bola aqui, Lelê?“
Brigaram também, lógico. Imagine a disputa para pendurar o último enfeite. Teve hora que eu achei que havia galhos demais para serem abertos. Tanta coisa pra fazer em casa, fim de ano é sempre tão atribulado, mas fui obrigada a parar para olhar bolas reluzentes e enfeites dourados, a improvisar sobre o sentido dos presentes como símbolo de uma generosidade e de amizade que devemos exercitar o ano todo, com direito a metáforas sobre o pisca-pisca.
“Às vezes apaga, tudo fica escuro, mas acende rápido e nos ajuda a ver a beleza da árvore. A vida é cheia desses truques“.
Não sei se elas me entenderam, mas algo estava sendo semeado entre nós: um novo ritual. Eu recuperava a meu modo uma memória da infância sobre dias felizes.
Quando tudo  ficou pronto, escureci a sala e acendi as luzes da árvore. As crianças estavam orgulhosas do trabalho concluído e um tanto hipnotizadas pelos galhos iluminados. Fez-se um silêncio obsequioso cheio de olhares de admiração e exclamações.
“Ficou linda!“, disseram.
Deparei com a caixa de papelão da árvore vazia e suspirei. Tralha. Não tenho sótão em casa para guardar tanta bagunça mas darei um jeito. Ano que vem, faremos tudo de novo. Há algo de sublime nisso.

Como cuidar do lixo e do esgoto sem gerar gases de efeito estufa?

Como cuidar do lixo e do esgoto sem gerar gases de efeito estufa?Débora Spitzcovsky 

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Apenas 48% das casas brasileiras têm esgoto sanitário, segundo o Ministério das Cidades, e cerca de 30% dos municípios do país não têm nenhuma iniciativa de coleta seletiva, de acordo com dados da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe). Os números – comentados por especialistas durante o seminário de lançamento do Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa do Brasil, promovido em 07/11, em São Paulo, pelo Observatório do Clima – deixam claro que a população do Brasil ainda sofre com a ausência de serviços básicos.
Na lista de desejos (e necessidades) dos brasileiros, a universalização do acesso ao serviço de saneamento básico e a destinação correta dos resíduos produzidos no país estão entre as primeiras posições. “Mas melhorar esses serviços implica em aumento considerável de emissões, o que exige estratégia do Brasil”, alerta Renato Morgado, pesquisador do Imaflora e um dos responsáveis pela produção daEstimativa de Emissões de Gases de Efeito Estufa do Brasil 2012 na área de resíduos sólidos.
Morgado revelou que o setor de resíduos ainda é o menos expressivo (3,2%) na matriz de emissões brasileiras, mas está aumentando sua participação. Entre 1990 e 2012, a liberação de gases de efeito estufa do setor cresceu 67%, passando de 29 MtCo2e para 46,9 MtCo2e. E a tendência é aumentar ainda mais.
Políticas como o Plano Nacional de Resíduos Sólidos e o Plano Nacional de Saneamento Básico instituem medidas importantíssimas para o país, mas provocam oaumento de emissões no setor de resíduos sólidos. Morgado explica por quê: “Os resíduos de um lixão têm potencial 1 de geração de GEE, enquanto um aterro sanitário, com melhores condições anaeróbicas, tem potencial 2,5. No tratamento de esgoto acontece o mesmo: quando os resíduos são jogados numa lagoa ou reator anaeróbico, eles produzem oito vezes mais metano do que se fossem despejados num rio qualquer”. (Leia também: Substituir lixões por aterros aumentará emissão de metano)
A solução? A melhoria dos serviços de saneamento e a destinação correta de resíduos têm que ser implantadas junto com políticas que estimulem a captação e o reaproveitamento desses gases poluentes para a geração de energia. “Até porque em ambientes mais propícios, como os aterros sanitários, a captação desses gases é bem mais fácil”, comenta Morgado. Segundo a Abrelpe, o Brasil tem potencial para produzir mais de 280 megawatts de energia a partir do biogás capturado em unidades de destinação de resíduos sólidos, o que daria para abastecer cerca de 1,5 milhão de pessoas.
MENOS PRODUÇÃO E CONSUMO
Convidado para debater o tema, Carlos Silva Filho, diretor executivo da Abrelpe, lembra que ações para reduzir o consumo e incentivar a reciclagem também são fundamentais para diminuir as emissões do setor de resíduos. “A geração de lixo no Brasil está numa curva ascendente e tem relação com o aumento do poder aquisitivo das pessoas. Em 10 anos, a produção de resíduos cresceu 21%, enquanto a população aumentou 9,65%”, afirma Silva Filho, que completa: “Não é possível reduzir emissões sem reduzir o consumo”.
Juliana Simões Speranza, pesquisadora do Núcleo de Economia Socioambiental da FEA-USP, concorda e acredita que repensar as formas de produção também é importante. “Temos que desmaterializar a economia, o que significa diminuir a quantidade de materiais e resíduos na fonte. Quando o assunto é lixo, o conceito deresponsabilidade compartilhada no Brasil é muito forte e isso é positivo, mas às vezes tira o foco dos grandes players. As empresas têm o dever de rever sua forma de produção”, diz Speranza.
Confira os principais resultados da Estimativa de Emissões de Gases de Efeito Estufa do Brasil 2012, produzida pelo SEEG, no setor de resíduos
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(clique aqui para ver o infográfico em tamanho real) 
Foto: Agência Brasil

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

CNZU cria novas zonas úmidas no País e plano da bacia do Paraguai

CNZU cria novas zonas úmidas no País e plano da bacia do Paraguai

    Colegiado indicará novos sítios Ramsar no Brasil 

    LUCIENE DE ASSIS. Ministerio de Meio Ambiente

    O Comitê Nacional de Zonas Úmidas (CNZU) proporá debate sobre a Proposta de Classificação e Inventário das Zonas Úmidas no Brasil, demanda que consta do Plano Estratégico de Ramsar 2009-2015, durante sua 12ª Reunião Ordinária do CNZU, marcada para esta terça-feira (26/11), em Brasília. De acordo com Maurício Pompeu, o Sistema de Classificação e o Inventário das Zonas Úmidas são ferramentas básicas para a formulação de políticas e conservação dessas áreas. O programa leva o nome da cidade iraniana onde se realizou a primeira conferência sobre o tema, em 1971.

    O colegiado, coordenado pela Secretaria de Biodiversidade e Florestas (SBF) do Ministério do Meio Ambiente (MMA), tem como funções propor diretrizes e ações para internalizar a Convenção no Brasil, avaliar a inclusão de novos Sítios Ramsar e subsidiar a participação do país nas Conferências das Partes de Ramsar, dentre outras responsabilidades, explica o analista ambiental da Gerência de Biodiversidade Aquática e Recursos Pesqueiros da SBF/MMA, Maurício dos Santos Pompeu.

    No colegiado também será apresentado o projeto de elaboração do Plano de Recursos Hídricos da Região Hidrográfica do Paraguai, sob coordenação da Agência Nacional de Águas (ANA). O plano, segundo Pompeu, deverá orientar as políticas de recursos hídricos nacional e estaduais da região, em especial de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, onde se insere uma das mais importantes zonas úmidas do mundo, o Pantanal Matogrossense.

    Durante a reunião, a SBF informará sobre prováveis indicações de novos Sítios Ramsar no Brasil (áreas úmidas de importância internacional). Este trabalho resulta da implantação da Recomendação CNZU nº 5/2012, que fixa a meta de designação de pelo menos dez novos Sítios Ramsar no Brasil até 2017. Atualmente, existem no Brasil 12 sítios Ramsar, reconhecidos internacionalmente pela Convenção sobre Zonas Úmidas de Importância Internacional. A Convenção de Ramsar é um tratado intergovernamental, que estabelece marcos para ações nacionais e para a cooperação entre países com o objetivo de promover a conservação e o uso racional de zonas úmidas no mundo.


    Novo perfil das emissões brasileiras de gases de efeito estufa

    Novo perfil das emissões brasileiras de gases de efeito estufaDébora Spitzcovsky - 07/11/2013 às 10:30

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    Observatório do Clima lançou nesta quinta-feira, 07/11, em São Paulo, o Sistema de Estimativa de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SEEG) e, com ele, relatório que traz o panorama das emissões brasileiras entre 1990 e 2012. Afinal, quando o assunto é a liberação de gases causadores do efeito estufa na atmosfera, como o Brasil está se saindo?
    De acordo com o documento, o Brasil aumentou em 7% suas emissões brutas de GEE, entre 1990 e 2012 – no mesmo período, as emissões globais cresceram 37%. Em 2012, o país emitiu 1,48 bilhão t CO2e – contra 1,38 bilhão t CO2e, em 1990 –, sendo considerado, atualmente, a sétima nação mais emissora do mundo, responsável por 2,8% da liberação global de gases poluentes na atmosfera.
    Mas as emissões brasileiras nesse período de 22 anos não foram lineares. “Entre 1990 e 2012, tivemos três grandes períodos diferentes:
    - o primeiro, nos 14 primeiros anos (1990-2004), quando as emissões apresentaram total tendência de crescimento, com um pico em 1994 causado pelo desmatamento na Amazônia;- o segundo, entre 2005 e 2009, quando houve uma queda importante no desmatamento da Amazônia e
    - o terceiro, de 2009 a 2012, quando pudemos enxergar melhor a tendência de crescimento de emissões em todos os setores, exceto Mudanças de Uso da Terra, por conta do combate ao desmatamento”, explica Tasso Azevedo, coordenador de desenvolvimento do SEEG e conselheiro do Planeta Sustentável.
    As estimativas do SEEG deixam claro que, apesar de ainda ser a principal fonte de emissão do Brasil (32,1%), o setor de Mudanças de Uso da Terra foi o único que reduziu suas emissões nas últimas duas décadas. Entre 1990 e 2012, houve queda de 35%, enquanto os outros setores apresentaram tendência de aumento.
    O caso mais preocupante é o do setor de Energia, onde as emissões cresceram 126%. “O principal responsável por esse aumento expressivo no setor energético é oTransporte, que teve aumento de 143% nas suas emissões, entre 1990 e 2012, sobretudo por conta do uso da gasolina”, conta o especialista.
    Segundo ele, apenas entre 2009 e 2012, o consumo de álcool no Brasil caiu 30% e o de gasolina subiu 34%. O principal responsável? “A política nacional de subsídio à gasolina”, garante Tasso. E mais: no mesmo período, as emissões provenientes do uso de gás natural e óleo diesel – outros dois combustíveis fósseis muito populares no país– cresceram, respectivamente, 64% e 23%.
    O problema, claro, se reflete na matriz energética do país, que está cada vez mais suja. “De 2009 a 2012, a porção renovável da nossa matriz caiu de 45% para 42,3%, quando na verdade deveria subir, já que foi em 2009 que o governo brasileiro apresentou sua meta de redução de emissões”, afirma Tasso, que garante que o setor de Energia é, atualmente, o que apresenta mais desafios e oportunidades para o Brasil.
    Confira os principais resultados do relatório Estimativa de Emissões de Gases de Efeito Estufa do Brasil 2012, produzido pelo SEEG, nos setores de:
    – Agropecuária;
    – Energia;
    – Indústria;
    – Mudanças do Uso da Terra e
    Resíduos Sólidos.

    A dura realidade das nossas cidades

    A dura realidade das nossas cidades

    Em estudo inédito, EXAME apresenta o que há de melhor e de pior nos serviços públicos dos maiores municípios brasileiros. São pistas do que precisamos fazer para, de fato, evoluir

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    Patrick Cruz Exame - 

    Germano Lüders/EXAME.com

    A vida nas cidades, onde moram 84% dos brasileiros, retrata quanto o país melhorou nas últimas décadas - e, ao mesmo tempo, quanto ainda há por fazer. Nossas cidades nunca foram tão ricas e os brasileiros tão escolarizados como agora. Mas a violência está em picos históricos e nunca demoramos tanto para ir de casa para o trabalho. 
    Se Curitiba tem taxa de analfabetismo equivalente à da Espanha, mais gente é assassinada em João Pessoa do que em El Salvador, o país com a segunda maior taxa de homicídios do mundo. 


    A fim de entender para onde, afinal, caminham nossas cidades, a consultoria de gestão Macroplan esquadrinhou índices sobre saúde, educação, segurança, transporte e saneamento dos 100 maiores centros urbanos do país e cruzou os dados com indicadores econômicos e de administração pública. A conclusão: pouco adianta evoluir em uma área se outras continuam a ir mal. 



    Jaboatão dos Guararapes, na Grande Recife, é um exemplo. Lá, a renda média cresceu 24% de 2008 a 2011, um dos maiores avanços do país. Ainda assim, ficou entre as piores do estudo. Já a paulista Jundiaí não liderou nenhum indicador, mas foi a campeã. 



    EXAME apresenta alguns dos bons e dos maus exemplos de nossas cidades. Eles nos dão pistas das escolhas que precisamos fazer para não apenas crescer, mas viver melhor.




    1. SANEAMENTO: O ESGOTO QUE EXPLICA A DESIGUALDADE 
    Há problemas na oferta de serviços públicos em todas as regiões do país. Congestionamentos não são exclusividade de São Paulo e Rio de Janeiro, assim como não há hospitais ruins apenas no Nordeste ou no Centro-Oeste. Mas algumas áreas da administração pública são, de fato, explícitas ao mostrar como ainda são grandes nossas diferenças de desenvolvimento regional - e o saneamento básico talvez seja o porta-voz mais loquaz das disparidades. 


    Um dos dados avaliados pela Macroplan foi a adequação das instalações de água e esgoto das casas. Entre as 100 maiores cidades, as 34 mais bem colocadas nesse ranking estão nas regiões Sul e Sudeste. E mais: das 15 primeiras, 12 ficam em São Paulo, o estado mais rico do país.


    Seria um alento se ao menos esse fosso de desigualdade estivesse regredindo na esteira do crescimento das cidades, mas não parece ser o caso. Ainda são poucos os municípios próximos de atingir as metas do Plano Nacional de Saneamento Básico



    Lançado em 2011, ele estabelece metas para fornecimento de água, rede de esgoto e coleta de lixo. O primeiro balanço desse plano será feito em 2015. Até agora, só nove das 100 maiores cidades atingiram suas metas. Em rede de esgoto, o número é melhor (são 54 das 100). Mas, na coleta de lixo, apenas sete das 100 cidades já alcançaram seu alvo.



    A paraense Ananindeua, na Grande Belém, é uma das cidades com o pior nível de saneamento no grupo das 100 maiores. Apenas 22,5% das casas têm fornecimento de água e esgoto considerado satisfatório. Em 2004, havia só 2 quilômetros de rede de esgoto na cidade. O número está, hoje, perto de 100 quilômetros, ainda irrisório para um município de 500 mil habitantes. E mais: pouco se sabe de fato sobre os dados locais do saneamento. "Se os dados não são divulgados, é porque a oferta de água e esgoto deve ser quase zero", diz Édison Carlos, presidente do Instituto Trata Brasil, que monitora o saneamento no país. 



    A sujeira descontrolada traz outros males consigo. Em 2011, Ananindeua gastou R$ 315 mil para cada 100 mil habitantes em internações por diarreia. Franca, em São Paulo, por sua vez, a mais bem avaliada em saneamento no estudo da Macroplan, teve gasto de R$ 8 mil.



    2. EDUCAÇÃO: BOAS IDEIAS VALEM MAIS DO QUE DINHEIRO
    É em educação que o grupo de 100 maiores cidades brasileiras se sai, na média, melhor que o restante do país. Das 100 maiores, 92 têm taxa de analfabetismo menor do que a média nacional, de 9,7%. Três em cada quatro municípios desse grupo já alcançaram analfabetismo inferior a 6,7%, meta acertada em 2000 entre o governo brasileiro e as Nações Unidas para 2015. 



    Não há fórmula única entre os municípios que mais se destacaram em educação, mas eles têm pontos em comum. A participação dos pais no cotidiano da escola é um deles. Jundiaí, a sexta mais bem colocada na pesquisa, descobriu isso. A prefeitura criou um modelo em que as escolas acompanham de perto a participação dos pais na vida escolar de seus filhos. Esses relatórios são monitorados pela Secretaria Municipal de Educação, e não por simples capricho: escolas em que os pais são mais participativos tendem a ter alunos com notas mais altas. "É inegável o ganho de aprendizado quando os pais são mais presentes na vida escolar", diz Durval Orlato, secretário de Educação de Jundiaí. 



    Há boas notícias até entre as cidades que estão nas piores colocações. A potiguar Mossoró (97ª no ranking) é um exemplo. Apesar de ainda apresentar uma das mais altas proporções de analfabetos (de 12,6%), reduziu a taxa em quase 7 pontos na última década. Além disso, segundo a Macroplan, destacou-se como um dos cinco municípios que mais elevaram sua nota no Ideb de 2007 a 2011. A ferramenta para isso? Investir nos professores. Mais de 60% dos docentes da rede municipal têm pós-graduação. Escolas e professores têm metas de alfabetização e de melhora das notas dos estudantes no Ideb. O prêmio para os mestres eficientes é o 14º salário. Na educação, mais importante do que dinheiro, como se vê, é saber o que fazer com ele.


    3. SEGURANÇA: O QUE ERA CRIME VIROU EPIDEMIA 
    violência é epidêmica em quase todas as 100 maiores cidades brasileiras. Do grupo de municípios avaliados no estudo da Macroplan, apenas oito - dos quais nenhum é capital - têm taxa anual de homicídios menor que dez para cada 100 mil habitantes. Essa é a taxa considerada tolerável pela Organização Mundial da Saúde. 


    É verdade que 44 das 100 maiores cidades têm menos homicídios do que a média nacional, de 27 ao ano para cada conjunto de 100 mil pessoas, mas isso não chega a ser um alento: a taxa brasileira é similar à do conturbado Sudão, país que foi dividido em dois no ano passado após uma sangrenta guerra civil. 



    Indicadores ruins de educação e desenvolvimento econômico são o ponto de contato entre os municípios que mais sofrem com o banditismo. Ananindeua, na região metropolitana de Belém, no Pará, é uma das cinco cidades com PIB per capita mais baixo no levantamento - e é lá onde mais morre gente assassinada entre as maiores cidades brasileiras. Seus 157 homicídios por 100 mil habitantes superam a taxa de Honduras, país onde, proporcionalmente, mais gente é assassinada no mundo.



    Das dez cidades com maior taxa de homicídios, três são capitais. Maceió é a pior delas. São 110 assassinatos para cada 100 mil pessoas. Como em todos os principais municípios brasileiros, o aumento da criminalidade tem relação direta com o avanço dotráfico e do consumo de drogas, em particular o crack. Mais de 70% dos assassinatos da cidade têm alguma relação com o tráfico. 



    Mas Maceió tem dois agravantes. O primeiro é o desemprego. A taxa de 12,3% de desempregados põe Maceió entre as dez cidades do estudo em que esse problema é mais acentuado - e a terceira entre as capitais, atrás de Salvador e Recife. O segundo agravante é de ordem política. Na última década, quando os índices de violência dispararam, a prefeitura de Maceió e o governo do estado permaneceram sempre sob o comando de grupos rivais da política alagoana. "Só agora estamos unificando áreas operacionais", diz o coronel Edmilson Cavalcante, secretário de Segurança Comunitária de Maceió. "Faltou entrosamento entre os dois lados." A pequenez política tem um preço - em vidas.


    4. SAÚDE: CUIDAR DAS PESSOAS FAZ A DIFERENÇA
    Mais do que a educação, a segurança ou o transporte, é a saúde o ponto mais frágil do serviço público brasileiro. Em uma pesquisa do instituto Ibope divulgada em julho, a saúde foi apontada pela população como o mais problemático de uma lista com 25 itens. A queixa das ruas fica explícita também no estudo da Macroplan. Das 100 cidades avaliadas, apenas 19 têm índice de mortalidade infantil menor que o considerado aceitável pela Organização Mundial da Saúde, de dez óbitos para cada mil nascidos vivos. Pior que isso: em nada menos que 26 dos municípios da amostra, a mortalidade infantil cresceu de 2008 a 2011.


    São José do Rio Preto, distante 450 quilômetros de São Paulo, derrubou a mortalidade infantil nas últimas décadas. O índice atual, de 7,1 óbitos para cada mil nascidos vivos, é quase idêntico à média registrada nos Estados Unidos - e põe a cidade no topo do ranking entre as 100 maiores do país. O que São José do Rio Preto fez para chegar ao topo deveria ser óbvio para gestores da área da saúde. Mas, dado o deserto de iniciativas bem-sucedidas, soa como uma descoberta sem precedentes: lá, cuida-se das pessoas.


    Gestantes que passam por alguma das 26 unidades de saúde da família do município entram automaticamente em um banco de dados. Essa lista passa a ser acompanhada pelas autoridades da saúde. Com informações como o endereço e o telefone das mulheres, os técnicos sabem quando será a próxima consulta da gestante. "Se ela demorar muito a retornar, os agentes vão buscá-la em casa para a consulta", diz Andréa Zoccal Mingoti, coordenadora da área de saúde da criança na prefeitura. Os exames periódicos - e a "caça" às mães que esquecem a data da visita ao médico - continuam até o sexto mês de vida do bebê. 



    A essa iniciativa o município adicionou, em 2008, a criação de um banco de leite materno. A medida foi crucial: desde então, o índice de mortalidade infantil na cidade sempre ficou abaixo do nível recomendado pela OMS. Construir hospitais é importante - mas cuidar das pessoas é fundamental.



    5. MOBILIDADE URBANA: PARA COMEÇAR, QUE TAL PLANEJAR?
    Eis o paradoxo: como pode o Brasil ser hoje abonado como nunca foi, mas, ainda assim, sua população receber serviços públicos que, em muitos aspectos, só fazem piorar? Esse contrassenso da vida brasileira - e, particularmente, de nossas grandes cidades - talvez tenha no transporte público seu melhor resumo. Não por acaso, foi o aumento dos preços das passagens de ônibus o estopim das manifestações populares ocorridas país afora em junho. 



    Com mais dinheiro no bolso, mais brasileiros hoje andam de carro. Em nada menos do que 87 das 100 maiores cidades do país o número de carros cresceu mais do que a frota de ônibus de 2009 a 2012. Com mais veículos nas ruas, o tempo de viagem de casa para o trabalho só cresce. Nas grandes cidades brasileiras, metade da população perde ao menos 1 hora por dia nos percursos de ida e volta de casa para o trabalho. E 17% das pessoas consomem 2 horas no vaivém. É o efeito colateral de um mal da gestão pública: a falta de planejamento. "No Brasil, a regra é o prefeito pautar a administração por obras", diz o economista Gustavo Morelli, coordenador do estudo da Macroplan. "Sem planejamento, a agenda do político tende à dispersão."



    O caso mais bem-sucedido de planejamento do transporte público nas grandes cidades brasileiras é o de Curitiba. A capital paranaense foi a primeira do mundo a adotar os ônibus rápidos em linhas exclusivas, sistema conhecido pela sigla BRT. No estudo da Macroplan, a cidade foi a única a aparecer nas primeiras posições em todos os quesitos avaliados, como a relação habitantes por ônibus e o tempo de deslocamento casa-trabalho. Curitiba é ainda a campeã em ônibus acessíveis a cadeirantes: nove em cada dez coletivos curitibanos têm acesso especial.



    Também no Paraná há outro destaque positivo. Foz do Iguaçu tem hoje o maior índice de ônibus por habitante do país: são 124 pessoas por veículo - pouco mais do que a metade da média nacional, de 235. Em 2010, Foz adotou em parte da frota o pagamento de passagens com cartão magnético. Além de tornar ágil o pagamento, o sistema permite formar um banco de dados. As informações recolhidas já levaram a prefeitura a criar novas linhas e implantar faixas exclusivas em duas das principais avenidas locais (o projeto está em andamento). Com o planejamento, o serviço pode melhorar ainda mais.


    domingo, 15 de dezembro de 2013

    Em águas rasas

    Em águas rasas

    O baixo nível da Lagoa dos Ingleses preocupa esportistas, moradores e frequentadores de Alphaville, em Nova Lima

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    Luisa Brasil
    Veja BH - 
    Victor Schwaner/Odin

    Frequentadores da Lagoa dos Ingleses, em Nova Lima, têm motivos de preocupação. A barragem está com apenas 52% de seu volume total, o que causa inconvenientes para os praticantes de esportes náuticos. As margens, tomadas por barro, também afetam a bela paisagem do local, um dos principais atrativos da região. No Minas Náutico, unidade do Minas Tênis Clube que funciona dentro do condomínio Alphaville, um deque improvisado precisou ser utilizado para impedir o encalhe de embarcações.

    Temos dificuldade em entrar e sair da lagoa, pois há risco de barcos e equipamentos baterem no fundo e quebrarem", diz Augustus Ligório, professor de remo. Também disputam espaço os praticantes de mergulho, vela, wakeboard e stand-up paddle (esporte em que se rema sobre uma prancha de surfe). "Estamos com uma área muito limitada para treinar", afirma o instrutor de stand-up paddle Johnny Costa, proprietário da escola SUP BH.

    A secura chegou a afetar uma das etapas do campeonato mundial de wakeboard, em maio. "Não conseguimos utilizar um dos obstáculos previstos", conta a atleta profissional Teca Lobato. "Ele acabou ficando no raso, fora d`água."

    Neste ano, o problema foi acentuado pela baixa ocorrência de chuvas entre janeiro e março, época em que a barragem costuma encher. Outra agravante é o emprego da água pela proprietária da lagoa, a mineradora Anglogold Ashanti. Entre maio e novembro, a empresa abre uma comporta para abastecer sete pequenas usinas que fornecem energia à mineração.

    Insatisfeitos, gestores de Alphaville e dos clubes Minas Náutico, Serra da Moeda e Iate criaram um grupo que avalia medidas de preservação do uso recreativo das águas. "Aquela região é um cerrado e a lagoa é uma joia no meio da paisagem", diz o presidente do Minas, Sérgio Bruno Zech. Uma consultoria foi contratada e deverá apresentar um projeto que beneficie tanto quem utiliza a represa para se divertir quanto a mineradora. Uma das soluções estudadas é a construção de uma nova lagoa para abastecer a mineração.

    Para os moradores de Alphaville, o interesse é na manutenção do valor dos lotes no condomínio. "A barragem é um componente importante na negociação de terrenos", afirma Abílio dos Santos, presidente da Associação Geral de Alphaville. "A Anglogold parece ter boas intenções, mas precisamos aguardar a hora de pôr as cartas na mesa." Em nota, a mineradora informou que "está sempre aberta ao diálogo com as partes interessadas". Enquanto uma solução não aparece, resta pedir ajuda a São Pedro no próximo verão.

    MPF discute riscos de liberação de sementes transgênicas tolerantes a herbicida

    MPF discute riscos de liberação de sementes transgênicas tolerantes a herbicida
    Objetivo é aprofundar debate em torno da possível liberação para uso comercial, decisão que cabe à CNTBio
    O Ministério Público Federal realiza, no próximo dia 12 de dezembro, em Brasília, audiência pública para discutir os riscos da liberação para uso comercial de sementes de milho e soja geneticamente modificadas tolerantes ao herbicida 2,4D, utilizado para combater ervas daninhas de folha larga. A decisão do uso comercial cabe à Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio). O evento ocorrerá Auditório Pedro Jorge I da Escola Superior do Ministério Público da União e é aberto ao público.

    O que dizem os estudos que subsidiam o pedido de liberação? Qual a perspectiva de aumento de uso do herbicida 2,4D se aprovado o uso comercial das sementes tolerantes a ele?  Quais os riscos à saúde humana e animal e ao meio ambiente em caso de utilização em larga escala do 2,4D? Como serão monitorados os resíduos do agrotóxico nos alimentos, para que se tenha certeza de que estão dentro de padrões aceitáveis? Quais são os métodos de controle da tecnologia (cultura OGM) para evitar a contaminação gênica em variedades de sementes crioulas de milho, típicas da agricultura familiar? E qual a extensão dos impactos socioeconômicos desse tipo de tecnologia, como a dependência de produtores brasileiros em relação a multinacionais?

    Segundo o procurador da República Anselmo Henrique Cordeiro Lopes, a liberação do herbicida para uso comercial só é aceitável após uma avaliação aprofundada sobre os impactos diretos e indiretos que o aumento do uso de um ingrediente ativo extremamente tóxico pode gerar no meio ambiente e no consumo humano. "Quais riscos a sociedade brasileira aceita correr em função dos benefícios que se pode obter com a liberação das sementes tolerantes ao 2,4D?", questiona.
    O MPF entende que a questão é complexa e que os riscos precisam ser melhor debatidos com a sociedade e o meio acadêmico. Informações do Grupo de Estudos de Agrobiodiversidade do Ministério do Desenvolvimento Agrário do MPF indicam que a liberação de organismos geneticamente modificados resistentes a agrotóxicos, como o caso do 2,4D, funciona como fator multiplicador do consumo desses defensivos agrícolas.
    Estudos - Recentemente, o MPF solicitou à CTNBio que suspendesse qualquer deliberação sobre a liberação comercial de sementes transgênicas resistentes a agrotóxicos até que sejam realizadas audiências públicas e estudos conclusivos sobre o impacto da medida para o meio ambiente e a saúde humana.

    Além disso, o MPF apura, por meio de inquérito civil, possíveis ilegalidades na liberação comercial, pela CTNBio, de sementes de soja e milho geneticamente modificadas que apresentam tolerância ao agrotóxico 2,4-D e a outros herbicidas.

    CTNBio - A Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) é uma instância colegiada multidisciplinar, criada por lei em março de 2005 para prestar apoio técnico ao governo federal em relação à Política Nacional de Biossegurança  relativa a organismos geneticamente modificados. Atualmente, está em tramitação na comissão processos que visam à liberação comercial de sementes transgências de milho e soja resistentes ao herbicida 2,4D.

    Glossário
    Herbicida: substância (agrotóxico) empregada na destruição de ervas daninhas. 
    2,4D: é um tipo de herbicida específico para combater ervas daninhas de folha larga.
    Organismos geneticamente modificado (OGM): são organismos manipulados geneticamente para que se obtenha características desejadas.
    Serviço
    O que é: audiência pública sobre sementes transgêncicas
    Data: 12 de dezembro de 2013
    Local: Escola Superior do Ministério Público da União (SGAS Av. L2 Sul, quadra 604)
    Horário: de 9:30 às 18:00 horas
    Informações: (61) 3105-6075 / 3105-6958