Para especialista, Estado vai precisar de plano de contingência e maior economia de água
Milhões de paulistas enfrentaram, ao longo de 2014, torneiras secas e falta de explicação do governo estadual para um problema que, segundo especialistas, poderia ter sido evitado com planejamento adequado. A aposta do Estado era de que as chuvas, a partir de setembro, resolveriam a crise nas represas que abastecem a Grande São Paulo. Mas, até dezembro, isso não aconteceu e a sétima maior aglomeração urbana do planeta começa o próximo ano sem a certeza de que terá água suficiente para consumo.
Principais sistemas de abastecimento de água da Grande São Paulo estão com níveis críticos. Luis Moura/Estadão Conteúdo
Marussia Whately, coordenadora do Programa Aliança pela Água do ISA (Instituto Socioambiental), afirma que pouco do que foi feito pela Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo) e anunciado pelo governo até agora garantem o abastecimento no ano que vem. Ela defende um plano emergencial com diversos cenários possíveis.
— Assim como a gente não chega a uma crise desse tamanho só por causa de um fator, a gente não sai dela somente com as medidas de um único ator, no caso a Sabesp. Nós, da Aliança pela Água, temos feito um apelo para que seja apresentado e que se inicie o quanto antes a discussão de um plano de contingência para 2015. A partir de agora, nós temos quatro meses [até o inverno, quando chove menos] para nos organizarmos para um ano que pode ser pior do que 2014. Não existem indícios de que a seca tenha passado até agora.
O plano proposto serviria para determinar quais medidas tomar diante de determinada situação. Por exemplo, com mais consumidores dependendo de caminhões-pipa, como garantir a eles que a água será de qualidade? Como regular os preços dessa água?
Responsabilidades
Muito se falou durante este ano que o governo tinha parcela de responsabilidade sobre a crise hídrica. Durante a eleição, o governador Geraldo Alckmin (PSDB) culpou a seca histórica e defendeu que o racionamento seria a pior saída. A situação mais preocupante sempre foi a do Sistema Cantareira, conjunto de represas que abasteciam mais de 9 milhões de pessoas até o começo do ano e hoje, com medidas de remanejamento de consumidores, abastece 6,5 milhões. Outras represas acabaram absorvendo essa demanda extra e hoje se encontram na mesma condição, como é o caso do Sistema Alto Tietê.
Marussia diz que o atual cenário já deveria ter sido previsto no passado e lista três principais motivos para a crise: falha na gestão do Sistema Cantareira, já que a Sabesp deveria ter retirado menos água ao longo dos anos; mananciais poluídos e com entorno desmatado; e falta de diálogo e participação da sociedade em relação à crise.
— Foi feita a gestão do Sistema Cantareira retirando a mesma quantidade em três verões com menos chuva. É que nem um orçamento, se você gasta mais do que ganha, uma hora vai ter dívida.
E agora?
A garantia de milhões de consumidores tem sido o volume morto do Cantareira — a primeira cota começou a ser captada em maio e a segunda em novembro. Trata-se da quantidade de água do fundo das represas, que estava abaixo das bombas. Mas, se não chover o suficiente no verão, essa reserva não vai durar muito. Marussia lembra que as chuvas de outubro e novembro não elevaram os níveis dos reservatórios.
— A gente não sabe nem quanto tempo esses volumes mortos vão demorar a encher. As chuvas não estão nem mexendo [nas medições]. Se daqui a quatro meses a gente chegar ao nível em que nós estávamos em abril deste ano, já é uma situação que, no mínimo, vamos viver o mesmo estresse deste ano que passou.
Além do plano de contingência, ela diz as pessoas têm de reduzir mais ainda o gasto. O grande desafio, segundo Marussia, está nos grandes consumidores, como shoppings, hotéis, escolas, hospitais e outros imóveis.
As obras anunciadas pelo governo do Estado, como o Sistema São Lourenço, e a interligação de represas do Cantareira com o rio Paraíba do Sul, não ficarão prontas em menos de dois anos. Com isso, Marussia reforça a necessidade de governos e prefeituras estudarem alternativas que impactem diretamente na vida das pessoas, para que as autoridades não fiquem sem saída, caso as torneiras sequem.
— Há um descompasso entre o que precisaria para o ano que vem e o que tem sido apresentado. Tem um conjunto de obras sendo apresentadas que não resolvem a situação para 2015 e não tem um conjunto de medidas que suavizariam a situação sendo apresentadas à sociedade.
Após este ano, em que a maioria dos paulistas entendeu a importância de economizar água e o governo corre para corrigiras falhas do passado, só resta uma certeza: a crise d’água em São Paulo está longe de terminar.
Fonte: Portal R7