DivulgaçãoUm dos maiores desafios da energia solar é encontrar espaços para instalação eficiente das placas. Os engenheiros Julie e Scott Brusaw encontraram uma solução para o problema: usar o piso das estradas.
A ideia é equipar o pavimento da rodovia com painéis que absorvem a luz do sol e a transformam em energia. Ela é suficiente para iluminar toda a via e proporciona vantagens como derreter gelo e carregarcarros elétricos por indução.
Cada painel fotovoltaico é feito de material reciclado e gera cerca de 7 kW de energia por hora. "Se as rodovias dos EUA fossem cobertas por esses painéis, seria possível gerar três vezes mais energia do que o país consome", diz Brusaw.
Os painéis solares já estão sendo testados. Em 2009, os criadores assinaram um contrato com a Administração Rodoviária Federal dos Estados Unidos para construir o primeiro protótipo.
Com a intenção de chegar às vias comerciais, os idealizadores buscaram apoio no site de financiamento coletivo Indiegogo. E arrecadaram 2 milhões de dólares, o dobro do valor que haviam solicitado. "Isso mostra que a sociedade acredita no projeto e esse é o primero passo para torná-lo real", afirma Brusaw.
À LUZ DO LEDComo funciona a estrada solar:
TESTE PRÁTICO
Com o protótipo, foi possível verificar a resistência do material. O resultado provou que as células suportam a passagem de veículos pesados e podem ser aplicadas em rodovias.
PASSAGEM LIMPA
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A energia que fica armazenada nos painéis pode ter a função de derreter a neve acumulada, uma grande vantagem para países de clima temperado, como EUA e nações da Europa.
CAMINHO ILUMINADO
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A estrada solar é toda revestida de lâmpadas de LED. Elas têm a função de indicar faixas de sinalização e até alertas para o motorista, como avisos de obras, acidentes e condições de tráfego.
Cientistas tentam desvendar qual o inseto mais rápido do mundo
Comparações ao longo dos últimos anos mostram os verdadeiros recordistas do mundo animal
POR O GLOBO
27/10/2014
Merritt, que atuava na Universidade da Flórida, começou a vasculhar bancos de dados e consultorias para elaborar uma lista de candidatos. Ele decidiu que os participantes aceitos deveriam ser cronometrados pelo menos cinco vezes e os resultados teriam que ter sido publicados numa revista científica. Uma lagarta da traça de tigre (Apantesis vittata), cujo recorde havia sido cruzar uma mesa na velocidade de cinco quilômetros por hora, foi descartada.
Outros três candidatos tiveram melhores recordes. Em 1991, dois cientistas da Universidade da Califórnia, em Berkeley, usaram uma placa sensível à pressão e câmeras de alta velocidade para acompanhar oito baratas americanas (Periplaneta americana). Elas podem voar, mas raramente se preocupam em andar mais rápido quando precisam utilizar as patas traseiras. Nos testes, percorreram 1,5 metro em um segundo, alcançando uma velocidade de 5,5 quilômetros por a hora.
No entanto, em 1996, cientistas da Holanda haviam testado duas espécies de besouro-tigre australiano, Cicindela eburneola eCicindela hudsoni. Ambos têm asas "vestigiais", com as quais não podem voar. A cronometragem mostrou que eles podem atingir 6,8 quilômetros por hora e 9 quilômetros por hora, respectivamente. Com isso, a segunda espécie ficaria com o título da "competição".
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Por outro lado, numa competição de velocidade em função do tamanho, é a outra espécie que lidera a disputa. A menor,Cicindela eburneola, pode viajar 171 comprimentos de seu corpo por segundo, bem à frente de Cicindela hudsoni, que faz 120 comprimentos do corpo por segundo. A barata fica com 50 vezes seu tamanho por segundo.
Para se ter uma ideia da expressividade desses números, o seres humanos ficariam para trás, caso entrassem na disputa. Usain Bolt, recordista mundial nos cem metros, alcançou a velocidade de 44,2 quilômetros por hora. Mas, com uma altura de 1,96 metros, ele corre 6 vezes o seu tamanho por segundo. Lembra da chita? A marca dela é de 16 vezes o seu tamanho por segundo.
Para encontrar um verdadeiro campeão da corrida, no entanto, é preciso ir além do mundo dos insetos. No início deste ano, um Macropalpis paratarsotomus, um ácaro do sul da Califórnia, percorreu 0,225 metros por segundo. Isto pode parecer lento, mas como ele tem um comprimento de corpo de 0,7 milímetros, isso equivale à extraordinária marca de 322 vezes o tamanho de seu corpo por segundo.
A rigor, nenhuma. O que é importante nesses termos é que eles se referem a uma fitofisionomia florestal, ou seja, a um aspecto visual que lembra o conceito de floresta. "Todos eles se referem a um tipo de vegetação que tem uma fitofisionomia parecida", diz Yuri Tavares Rocha, professor de biogeografia do Departamento de Geografia da USP.
No entanto, organizações e pessoas já forneceram definições que, ainda que não sejam universalmente aceitas, ajudam a entender as diferenças. Confira abaixo.
MATASegundo Yuri Tavares Rocha, a palavra serve para designar vegetação mais densa. Também é usada de forma genérica no Brasil para nomear formações diversas, como "mata de encosta" e "mata fechada"
FLORESTASegundo a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura, floresta é uma região de no mínimo meio hectare com uma cobertura arbórea de pelo menos 10% de sua área e cujas árvores tenham de 5 m de altura para cima
SELVASegundo John Kricher, professor de biologia da Wheaton College e autor de mais de 100 artigos científicos sobre natureza, selva é uma grande área em que uma floresta tropical foi aberta devido a alguma perturbação, fazendo com que a terra limpa tenha sido repovoada com vegetação herbácea (rasteira)
BOSQUEA definição mais técnica é de um documento da União Europeia: bosque é, dentro de uma área agrícola, uma localidade com cobertura arbórea que impeça o crescimento de vegetação adequada para pastagem. Também é utilizado para designar áreas cujas árvores são todas de uma espécie específica. Bosque também pode ser uma área comvegetação nativa remanescente, introduzida ou perturbada pela ação humana
FONTES: Artigo On Definition of Forest and Forest Change, da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura, documento AGRI/60363/2005-REV1, da Comissão Europeia, e livro A Neotropical Companion: An Introduction to the Animals, Plants, and Ecosystems of the New World Tropics, de John Kricher
CONSULTORIA: Carlos Rossetti, professor de engenharia florestal da UnB, e Yuri Tavares Rocha, professor de biogeografia do Departamento de Geografia da USP
A árvore mais velha do mundo é também a coisa viva mais pesada que existe. É uma, mas são várias: conhecida como Pando, é uma extensa colônia clonal da espécie álamo-trêmulo, nos EUA. Conheça este ancião peculiar em detalhes
O QUE É PANDO?
Trata-se de um conjunto de troncos ligados por suas raízes que clona a si mesmo constantemente há milênios. Veja na imagem abaixo onde o Pando pode ser encontrado e sua origem histórica:
A INTERAÇÃO DO PANDO COM SEU HABITAT 1. Cê mente
O Pando produz sementes assexuadas - mas tão pobres em nutrientes que, se não fossem as raízes, ele não teria se reproduzido. 2. A morte lhe cai bem
Raízes sustentam troncos que vivem 130 anos e são trocados por novos, surgidos da massa subterrânea. 3. Ecossistema
No inverno, a colônia abriga animais. Insetos se alimentam das árvores mortas ou moribundas. Pássaros controlam pragas. 4. Na encosta
As raízes profundas tornam o chão mais resistente a deslizamentos e erosão - outro segredo para a longevidade do Pando. 5. Terreno
Injetar toneladas de herbicida sob o solo talvez mate o Pando. Mas, fincadas a 100 metros do solo, as raízes provavelmente resistiriam.
PANDO DE DADOS
Os números impressionantes do "gigante trêmulo":
- 47 mil troncos formam o conjunto da colônia clonal. Tem em média 20 m de altura e 50 cm de diâmetro;
- 80 mil anos têm as raízes. Elas são tão antigas que sobreviveram a uma Era Glacial;
- 5 milhões de toneladas é o peso total do sistema. Equivale a tudo que o Brasil colhe de trigo a cada ano;
- 43 hectares é a extensão total do bosque. Cabem cinco Pandos no Parque do Ibirapuera.
ETERNO RETORNOColônia clonal é um grupo contínuo de plantas, liquens ou fungos geneticamente idênticos, todos com um ancestral comum. Podem se renovar para sempre - inclusive consumindo seus próprios restos.
Confira na ilustração a seguir outras plantas milenares do planeta:
_____________ Fontes: Serviço Nacional de Parques dos EUA; Departamento de Agricultura dos EUA; Serviço Florestal dos EUA; Departamento de Árvores, insetos e doenças das florestas do Canadá; Ecofisiologia de Cultivos Anuais, por Paulo R.C. Castro e Ricardo A. Kluge; Louise Larissa May De Mio e Lucimeris Ruaro, professoras de engenharia agrônoma da UFPR; Waldomiro Nunes e Vidal, professor do Departamento de Biologia Vegetal da Universidade Federal de Viçosa
Gro Brundtland: "Estimular a compra de carros a gasolina é um erro"
A ex-primeira-ministra da Noruega e criadora do termo “desenvolvimento sustentável” critica o governo brasileiro e defende a tributação das emissões de gás carbônico.
A médica norueguesa Gro Brundtland, de 75 anos, é uma das mais respeitadas autoridades em meio ambiente e saúde pública do mundo. Ex-primeira-ministra da Noruega, ex-presidente da Comissão sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento das Nações Unidas e ex-diretora-geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), ela foi a criadora do termo “desenvolvimento sustentável”, nos anos 1980. No final de setembro, ao passar por São Paulo para dar uma palestra sobre o tema – a convite do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso –, Brundtland falou a ÉPOCA. Na entrevista, defendeu a tributação das emissões de gás carbônico, para conter o aquecimento global, e criticou a política brasileira de estímulo à compra de carros a gasolina.
ÉPOCA – Nos anos 1980, quando pouco se fazia no mundo em defesa do meio ambiente, a senhora criou o termo “desenvolvimento sustentável”. Hoje, 30 anos depois, a situação mudou muito? Gro Brundtland – Sim, houve mudanças. As pessoas, agora, estão mais alertas. O mundo inteiro discute o desenvolvimento sustentável. Foram criadas diversas instituições internacionais. As universidades e organizações não governamentais (ONGs) entenderam a importância do tema. Muitos países adotaram medidas para enfrentar o problema e se deram conta de que os congestionamentos de veículos não podem continuar jogando combustíveis fósseis e fumaça no ar. Isso é danoso à saúde e ao clima. Só que as mudanças têm sido muito lentas. Hoje, mais e mais pessoas percebem que as mudanças climáticas e a deterioração do meio ambiente chegaram a um ponto crítico.
ÉPOCA – Na prática, o que foi feito nas últimas décadas contra a degradação do meio ambiente e o aquecimento global? Brundtland – Em 1987, quando a Comissão sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento das Nações Unidas divulgou o relatório Nosso futuro comum, que propunha medidas para o crescimento sustentável, muito dióxido de enxofre (um gás altamente tóxico usado na produção de refrigeradores) ainda era jogado no ar. Na Europa, fábricas com grandes chaminés lançavam diversos gases contendo dióxido de enxofre, que vem da queima de óleo e carvão. Isso criava acidez nos lagos, corroía metais e até o concreto dos edifícios. Dava para ver o estrago na natureza e nas obras humanas. No final da década de 1980, conseguimos fazer um acordo para reduzir em 30% essas emissões. Foi uma luta dura.
ÉPOCA – De 0 a 10, em que pé a senhora acredita que estamos hoje? Brundtland – Talvez, 5, talvez 4. Se nada mais acontecer, isso começará a cair de novo.
ÉPOCA – Em sua opinião, o que deve ser feito agora para que a situação não volte a piorar? Brundtland – Precisamos fechar um acordo global em Paris, no ano que vem. Em 2015, haverá uma conferência mundial sobre o tema, para reduzir as emissões de gás carbônico, a principal causa do aquecimento global, mas também de outros gases, como o metano, igualmente prejudiciais. Vários países, inclusive o Brasil, aumentaram as emissões de gás carbônico todos os anos. Isso não pode continuar. O Brasil tem de mudar. Os demais países também. Se não houver uma mudança, todos morreremos sufocados, e a natureza será destruída.
ÉPOCA – No Brasil, o governo reduziu o imposto sobre os carros para estimular o consumo durante a crise global. Milhões de veículos chegaram às ruas, e isso aumentou a emissão de gases tóxicos. Brundtland – Foi uma decisão ruim. O governo fez o oposto do que deveria ter feito. Comprar mais carros não é a coisa mais importante para o povo no Brasil. Ele deveria comprar outras coisas, ter saúde melhor, mais comida, apartamentos melhores, mais educação. Na Noruega, fizemos o contrário. Os carros movidos a gasolina ficaram mais caros. Criamos novos impostos, para limitar o número de carros nas ruas. As famílias devem ser desestimuladas a ter mais de um carro. Devem ser estimuladas a usar ônibus. Eles são mais rápidos, porque se deslocam em faixas exclusivas. Os ônibus ainda são movidos a diesel, mas trabalhamos para mudar isso. Alguns veículos já rodam a gás. Há alguns anos, zeramos também os impostos sobre os carros elétricos. Hoje, a Noruega tem o maior número de carros elétricos do mundo.
ÉPOCA – Com a descoberta de novas reservas de petróleo no pré-sal, o Brasil tem se comportado como uma espécie de “novo rico” da Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo), e o governo não parece muito preocupado com esse problema. Brundtland – Isso não funcionará. Vocês têm de aumentar os impostos dos carros a gasolina e sobre as emissões de qualquer extração de petróleo. Desde 1999, temos impostos na Noruega sobre a emissão de gás carbônico na plataforma continental. Esse dinheiro vai para os cofres públicos e pode ser usado para investir em educação e infraestrutura, como a construção de ciclovias. A indústria petrolífera reclamou, mas agora faz o possível para reduzir as emissões, em vez de jogar gás carbônico de graça no ar.
"Se o aquecimento for de 4 graus na próxima década, não haverá mais água em São Paulo"
ÉPOCA – Nos últimos anos, o uso do etanol, considerado um combustível mais “limpo” que o petróleo, diminuiu muito no Brasil, por falta de estímulos ao setor. Como a senhora vê essa questão? Brundtland – Me disseram que a falta de incentivos levou a uma redução do interesse pelo etanol. Se isso significa mais interesse em combustíveis fósseis e falta de limites para emissões de gás carbônico, é algo muito ruim. Há dez anos, o Brasil tinha muito orgulho do etanol. É uma pena que, agora, ele esteja em decadência.
ÉPOCA – A Noruega tem um fundo soberano para evitar que os dólares gerados pelo petróleo inundem a economia e gerem inflação. Como ele funciona e qual seu saldo hoje? Brundtland – Na Noruega, todo o dinheiro de impostos incidentes sobre a produção de petróleo, 25% do PIB (Produto Interno Bruto), vai para o fundo soberano. Ele foi criado em 1990 e vem crescendo ano a ano. Hoje, já tem um saldo de quase US$ 1 trilhão. O ministro das Finanças ou o primeiro-ministro não podem passar a mão no dinheiro do fundo soberano e usá-lo para compensar uma redução tributária ou diminuir o deficit público. O governo e o Parlamento não podem usar mais que 2,5% a 3% do saldo do fundo soberano por ano. Ele é totalmente independente do orçamento do governo. Só os impostos sobre a emissão de gás carbônico pelas empresas petrolíferas vão para o orçamento do governo. Essa é a melhor solução. Temos hoje uma das plataformas continentais mais competitivas do mundo e, ao mesmo tempo, uma das melhores políticas ambientais e climáticas. Dessa forma, as futuras gerações também poderão receber parte dos benefícios do petróleo.
ÉPOCA – A senhora acredita que, ao reduzir o uso de combustíveis fósseis e as emissões de gás carbônico, a velocidade do aquecimento global diminuirá mesmo? Brundtland – Sim. Se fizermos isso, conseguiremos reduzir o aquecimento global a 2 graus célsius até 2030. Nos últimos anos, a temperatura já aumentou 0,7 grau. Isso não pode mais mudar. Não podemos mais reduzir o aquecimento antes de ele alçançar 2 graus. Mas, se continuar no ritmo atual, a temperatura deverá subir 4 graus, em vez de 2, até o final da próxima década. É uma questão dramática. Não estamos fazendo o que devemos para enfrentá-la. Com um aquecimento de 4 graus, não haverá água em São Paulo. As pessoas sofrerão. As ilhas ficarão submersas. Será terrível.
ÉPOCA – Muitas empresas têm defendido a sustentabilidade como uma estratégia de marketing. O que a senhora pensa disso? Brundtland – Algumas empresas usam mal o termo. Se você diz que segue os princípios da sustentabilidade, tem de provar o que diz. Não pode simplesmente falar isso e dar como fato consumado que as pessoas acreditarão em você. Tem de haver transparência. Temos de ter o direito de olhar não só os balanços, mas também o que as empresas fazem para ter eficiência energética. Elas tratam seus empregados justamente? Tudo isso tem a ver com uma empresa ambiental e socialmente responsável. Agora, conheço muitas empresas progressistas, abertas para ser avaliadas por terceiros e ONGs.
ÉPOCA – A senhora está otimista com os possíveis resultados da Conferência de Paris em 2015? Brundtland – Ainda há muitos países relutantes em assinar o acordo. Há muita resistência dos Estados Unidos. Não do presidente Barack Obama. Ele entende isso, mas não tem apoio do Congresso. Temos de encontrar uma forma inteligente para que ele possa assiná-lo, ainda que não seja o acordo que desejamos. O Brasil também não está entre os que apoiam o acordo. Resiste, complica as coisas, diz que deve ter o direito de se desenvolver sem interferências externas. A China mudou de posição e concordou em se comprometer com a meta de limitar em 2 graus o aquecimento global até 2030. Isso poderá facilitar o acordo. China e EUA são os dois maiores emissores. Juntos respondem por 40% das emissões globais. A China entendeu que as emissões afetam a saúde de todos e que precisa ter energia renovável, ir além da era do carvão e do combustível fóssil.
O Brasil nunca criou tão poucas unidades de conservação .ANGELA KUCZACH*23/10/2014
No auge da crise hídrica vivida pelo sudeste, estranhamente, pouco se fala em meio ambiente, menos ainda em conservação da natureza. E se nem diante da eminente sede paulista esses temas tão intrinsicamente ligados ao abastecimento não são trazidos a tona, menos ainda se fala em unidades de conservação.
Aliás, o que são mesmo unidades de conservação?
São a melhor forma de conservar a natureza. São também o melhor serviço social que se pode prestar a uma sociedade, já que ao preservar a biodiversidade, estamos também conservando os recursos que nós precisamos para sobreviver: qualidade do ar, manutenção do clima, solos férteis, polinização para a agricultura, segurança contra desmoronamentos de encostas e... água.
Se as águas que brotam das nascentes da mata atlântica abastecem as grandes cidades do Sul e do Sudeste, as águas que vêm do cerrado ajudam a manter a qualidade dos solos agricultáveis do Sudeste e Centro-Oeste, além de escoar para o Nordeste. De cima, através dos rios voadores é a evaporação na Amazônia que traz a chuva para as áreas agrícolas de todo o centro-sul. Tudo está interligado.
Sabemos disso. Há tempos sabemos. Porém na corrida desenvolvimentista de curto prazo, que impera ano após ano no nosso país, não levamos esse tipo de informação a sério – ou pelo menos não com a seriedade que deveríamos – muito mais fácil acreditar que um milagre vindo dos céus irá salvar a todos. Se o milagre em questão for água, para acontecer vai antes precisar de florestas.
E as unidades de conservação, o que têm a ver com isso? Tudo. São elas, que em dimensão e quantidade preservam toda essa intricada rede de serviços ambientais, sem os quais sucumbimos. Não obstante, são hoje as mais esquecidas. Signatário da Convenção da Biodiversidade (CDB) desde 1992, o Brasil se comprometeu a proteger pelo menos 10% de cada um dos seus sete biomas em unidades de conservação (UCs). Não cumpriu. Mais recentemente, também se comprometeu com as Metas de Aishi a proteger 17% de cada bioma do seu território. Ainda está longe de cumprir.
Embora a Amazônia esteja relativamente bem representada, com cerca de 30% de área protegida em unidades de conservação, outros biomas não poderiam estar pior representados: o marinho, por exemplo, somando tudo e mais um pouco não chega a ter 1,5% de área protegida. De onde virão os estoques de peixes no futuro? A caatinga hoje não tem nem 2% da área em UCs de proteção integral. O pampa... quem lembra do pampa?
Se os números per se demonstram nossa falta de comprometimento com a natureza e com a sobrevivência dos nossos filhos – e os filhos dos nossos filhos – o panorama fica um pouco mais complicado quando olhamos para nossa história recente.
As primeiras UCs brasileiras foram criadas na década de 1930, com os Parques Nacionais de Itatiaia e Iguaçu, sendo que nas décadas seguintes, especialmente durante o governo militar, a demarcação de UCs aconteceu de forma modesta porém contínua. Em muitos casos levava em conta a proteção de áreas fronteiriças e estratégicas para a defesa do país.
Com o fim da ditatura e em seguida com a promulgação da lei que regulamenta o Sistema Nacional de Unidades de Conservação, Lei 9985/2000, somada à constatação de que para conservar a natureza são necessárias grandes extensões e conectadas entre si, e com alguma vontade política, houve um notável avanço no processo de criação. Somando os oito anos do governo FHC aos oito do governo Lula, a área protegida do Brasil foi praticamente triplicada em hectares, passando de pouco mais de 20 milhões para cerca de 75 milhões de hectares em 2010 quando Dilma assumiu.
Problemas sobravam, claro. Falta de recursos e toda a sorte de investimentos, falta de equipe, de capacitação, provisões, regularização fundiária... Tudo isso estava muito aquém do necessário, mas pelo menos as unidades de conservação estavam sendo criadas. Ter as UCs criadas era antes de tudo uma tentativa de resguardar parte da biodiversidade dos avanços desenfreados e da política de governo imediatista, desprovida de visão, que impera nesse país independente da mão que o governa. Se faltavam os recursos para implementação, ao menos havia uma perspectiva de que em longo prazo, com as áreas preservadas, o quadro pudesse ser pouco a pouco melhorado.
Longe do ideal, mas um pouco mais próximo do minimamente aceitável, havia alguma lógica no processo. Havia… A linearidade desse processo desmoronou nos últimos quatro anos. Resultado da pressão constante de setores como agricultura, mineração, energia e as proposições do PAC, levaram à estagnação do processo de criação de UCs no Brasil. Somente oito UCs federais foram criadas nesses últimos quatro anos, seis delas na última semana, a toque de caixa para não comprometer ainda mais a imagem de um governo ambientalmente descomprometido. Não fosse isso aliás, o governo Dilma entraria para a história como o primeiro a não criar uma única UC na Amazônia. Para não levar esse troféu indigesto, foram criadas 4 UCs nesse bioma, sendo três reservas extrativistas. As áreas são a Resex Marinha Mocapajuba (21 mil hectares), a Resex Marinha Mestre Lucindo, (6,4 mil hectares) e Resex Marinha Cuinarana, (11 mil hectares), além da Estação Ecológica de Maués. Essa última, assim como o também recém criado Parque Nacional de Gandarela em Minas Gerais, já nasce sob a mira da mineração em seu entorno imediato, sinalizado no próprio Decreto de Criação. Um risco anunciado e previamente calculado.
Do pacote de bondades de final de mandato, ficaram de fora o Parque Nacional de Alcatrazes e a ampliação do Parque Nacional Marinho de Abrolhos, importantíssimos berçários da vida marinha. Também ficou de fora o tão aclamado e desejado Parque Nacional do Boqueirão da Onça, na Bahia, uma das mais fantásticas e bem preservadas áreas caatinga, que ainda abriga uma das últimas populações de onça-pintada desse bioma, além de alguns indivíduos da arara-azul-de-lear, o nosso famoso tatu-bola e tantas outras espécies de flora. Aliás, o próprio nome “Boqueirão da Onça” pode ser traduzido como ‘o lugar onde a onça bebe água’. São poças encrustadas nos paredões rochosos das chapadas e serras que em sua base acumulam a rara água da chuva. Não só as onças, como toda a fauna se abastece nesses poços. Também abriga um vasto número de nascentes, algumas perenes, que matam a sede de milhares de sertanejos que vivem em seu entorno. Água na Caatinga é ouro, e o Boqueirão é uma mina, hoje desprotegido e a céu aberto, que precisa com urgência ser transformado em um parque nacional.
Voltando ao Sudeste, um antigo projeto que pretendia criar o Parque Nacional dos Altos da Mantiqueira, uma das caixas d’água da região, sequer é mencionado hoje em dia...
Há dez anos atrás nenhum brasileiro imaginaria que a grande São Paulo, a cidade mais rica do país, estaria passando por uma crise dessas por conta de um elemento tão básico quanto abundante em nosso país. “A ‘terra da garoa’ sofrer por falta d’água? Imagine”
Agora, imagine daqui há 30 anos.