| /05/2015 Rio é o Estado que mais consome água, o dobro do recomendado pela ONU
Publicado por Uol - Cotidiano
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Moradora toma banho em chuveiro instalado na praia do Leme, na zona sul do Rio
O Rio de Janeiro é o Estado com o maior consumo per capita de água do país, segundo dados do Snis (Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento). Em 2013, os fluminenses consumiram cerca de 253,1 litros de água por dia, mais de duas vezes o recomendado pela ONU (Organização das Nações Unidas), que considera suficientes 110 litros de água por pessoa.
O número é ainda maior quando leva-se em conta apenas a capital --os cariocas consomem, em média, 329,78 litros de água ao dia. O consumo do Estado também é 52,2% a mais que a média nacional, de 166,3 litros. Em seguida, no ranking, encontram-se o Maranhão, com um consumo médio de 230,8 litros de água por habitante em um dia, e o Amapá, com 194,9 litros.
Para se ter uma ideia, São Paulo, que junto com o Rio passa pela pior seca de sua história, teve em 2013 um consumo médio per capita de 180 litros de água por dia, 188,3 litros quando considera-se apenas a água utilizada pela capital.
Segundo o relatório, a discrepância entre o Rio e os outros Estados se deve, entre outros fatores, aos baixos índices de medição fluminenses, o que leva parte dos dados a serem estimados. O índice de hidrometração das ligações de água no Estado (que considera o volume de água levado para residências por meio da medição do hidrômetro) é de 65,1%, enquanto a média nacional é de 91,1%.
O professor da Coppe-UFRJ (Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro) e especialista em recursos hídricos Paulo Carneiro também cita os problemas com a micromedição e afirma que, apesar de não se possível identificar exatamente o que leva a este excesso, há um forte fator cultural no alto consumo de água no Estado.
"Há, de fato, um comportamento do carioca de maior consumo de água do que em outros Estados. A temperatura elevada faz com que as pessoas tomem dois, três banhos por dia. Essa diferença é histórica", afirma.
Adacto Ottoni, professor de engenharia sanitária da Uerj (Universidade do Estado do Rio), lembra ainda o papel preponderante das favelas e das ligações clandestinas, os chamados gatos, nesse montante. "O Rio tem uma quantidade muito grande de favelas, ocupações irregulares, em que a água chega, mas não é contabilizada", afirma.
Um levantamento feito pela reportagem do UOL com base em dados fornecidos pelo Snis mostra que a água desperdiçada apenas ao longo de 2013 com vazamentos e ligações clandestinas no Rio de Janeiro seria o suficiente para abastecer a capital fluminense durante mais de seis meses.
A Cedae (Companhia Estadual de Água e Esgotos), responsável pelo abastecimento da maior parte do Estado, no entanto, não soube precisar o que justificaria o alto consumo de água no Estado.
Apesar de o governador Luiz Fernando Pezão negar a possibilidade de racionamento, a crise hídrica no Estado se agrava dia a dia. O volume médio do Rio Paraíba do Sul, principal fonte de abastecimento da capital fluminense e da região metropolitana, chegou a 0,33% no domingo (1º), menor nível histórico já alcançado pelo rio nesta época do ano.
Já os reservatórios de Santa Branca e de Paraibuna, que junto com Jaguari e Funil compõem o sistema de captação do Paraíba do Sul, atingiram o volume morto nos últimos dias, de acordo com boletins do ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico).
O volume morto do Paraibuna acumula, de acordo com a ANA (Agência Nacional de Águas), 2,095 trilhões de litros. Segundo técnicos da Secretaria de Ambiente do Estado, seria o suficiente para abastecer o Estado por cerca de seis meses.
Fonte: Uol - Cotidiano.
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Recentemente o WWF-Brasil lançou uma petição on line para que o governo federal crie um Plano Nacional de Nascentes e Mananciais. Para que serve esse plano? A resposta breve é para garantir água de qualidade e em quantidade para todos os usos e para todas as pessoas.
E por que ele deve ser criado pelo governo federal? O Brasil vem passando por uma crise hídrica que já afeta 40 milhões de brasileiros. As soluções que vêm sendo apresentadas pelos governos são, majoritariamente, baseadas na reservação de água para aumentar a sua oferta perante o crescimento populacional e aumento da demanda nas cidades e no campo, por meio de obras de infraestrutura hídrica, como, por exemplo, a construção de reservatórios, transposições e captação de água subterrânea. A gravidade dessa crise exige que sejamos mais criativos e pensemos em alternativas adicionais à reservação que possam garantir segurança hídrica num futuro próximo.
Esse é o momento das autoridades reconhecerem os serviços ambientais prestados pela natureza e adotarem medidas efetivas para preservá-los. O Plano Nacional de Segurança Hídrica lançado pelo governo federal no ano passado prevê a ampliação da oferta de água por meio de obras de infraestrutura, porém não inclui a recuperação de bacias em seu escopo. Estamos salvando os “ovos de ouro”, mas esquecendo de salvar a “galinha”. Afinal, de onde virá a água que irá abastecer os reservatórios se não das nascentes dos rios que alimentam os reservatórios?
As nascentes representam a “galinha dos ovos de ouro” que irão garantir água limpa e abundante num futuro próximo e, ao invés de protegê-las, estamos acabando com elas. O próprio novo Código Florestal (Lei 12.651/2012) em seu inciso IV do artigo 4° excluiu as nascentes intermitentes (que secam em períodos do ano) da obrigatoriedade de proteção de faixa de matas no seu entorno. De acordo com a lei, apenas as nascentes permanentes são incluídas na faixa de proteção permanente, num raio mínimo de 15 metros. Como as nascentes que eram perenes estão secando, elas são automaticamente consideradas intermitentes e, portanto, podem ser desmatadas por lei. Essa é, infelizmente, a situação atual.
Quando um rio é poluído ou degradado, mas suas nascentes estão preservadas, há boas chances de recuperarmos todo corpo hídrico. Por outro lado, se as nascentes forem destruídas, pouco se pode fazer. Elas são a fonte necessária à vida e devem ser preservadas ou recuperadas a qualquer custo. E o país está perdendo suas nascentes de modo veloz, desconhecido e, em alguns casos, irreversível. A imagem da nascente seca do rio São Francisco em 2014 foi só um alerta. Em vários municípios, as nascentes já não servem mais à população. Ruas, casas e bairros inteiros são construídos sobre áreas de preservação permanente, onde as nascentes são drenadas e aterradas. No meio rural as fontes são degradadas pelo mau uso do solo na atividade agropecuária, além da construção de estradas e obras de infraestrutura sem planejamento.
Diante da atual crise hídrica, que poderá deflagrar outras crises como de energia, alimentos e, até mesmo, crise social e econômica, o governo federal deve assumir a liderança com apoio do setor privado e da sociedade e criar um Plano Nacional de Proteção de Nascentes e Mananciais (PNNM). O Plano deveria iniciar com um mapeamento inédito das nascentes e sistemas de cabeceiras do país e avaliar as condições de degradação as quais se encontram e identificar sistemas prioritários para intervenções e recuperação. Além disso, propor um pacto nacional com os Estados e municípios para implementar ações de restauração e preservação das nascentes prioritárias, com metas claras e com urgência para serem iniciadas.
Além disso, esse plano seria uma ótima oportunidade de envolver o cidadão e as empresas. Recentemente, na região metropolitana de São Paulo que vem sofrendo com a escassez de água nas torneiras, algumas iniciativas voluntárias de cidadãos vêm mapeando nascentes e córregos “escondidos” entre os concretos e pavimentos da grande metrópole de forma bem sucedida, a exemplo do movimento “Existe Água em SP” criado nas páginas do Facebook. Este e outros grupos identificaram mais de 300 “córregos invisíveis” na região metropolitana de São Paulo, o que dobraria os 287 rios catalogados oficialmente na cidade.
Portanto, fica claro que as obras de infraestrutura para garantir a reservação são necessárias e devem sair do papel rapidamente, porém, é essencial lembrarmo-nos da infraestrutura natural da bacia hidrográfica. Um estudo coordenado pelo professor José Galízia Tundisi demonstrou que os custos de tratamento de água diminuem de R$ 200 a 300 para apenas R$ 1 a 3 por 1.000m³ de água comparando-se uma bacia hidrográfica totalmente desmatada com outra parcialmente preservada. Ou seja, os números confirmam que a vegetação desempenha um papel importante não só na preservação da região, mas também na redução de custos e, consequentemente, no incremento das condições de saúde e qualidade de vida da população.
O plano proposto pelo WWF-Brasil quer, assim, garantir água de qualidade e em quantidade para todos os brasileiros, e acredita que as nascentes devem ser o mote para a ampliação do olhar rumo a uma nova gestão da água, deixando apenas de considerar apenas a infraestrutura “cinza” do concreto das obras para uma infraestrutura “verde” considerando elementos da natureza.
*Glauco Kimura de Freitas é coordenador do programa Água para Vida do WWF-Brasil

