terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

Quem seremos nós, sem água?

Quem seremos nós, sem água?




Caberá a essa geração imperfeita enfrentar os desafios de um futuro que chegou antes


Por Eliane Brum  Fonte: El País

Quando a gente abre a torneira em São Paulo e não sai nada, e sabe que logo chegará o dia que não haverá nada no dia seguinte e no dia seguinte ao dia seguinte e assim por um tempo que ninguém sabe quanto será e quem diz que sabe mente, descobrimos que nos tiraram muito mais do que água. Essa é a parte aterrorizante. E é aterrorizante para além das vidas secas. O terror é menos pelo que só agora faltou, mais pelo que nunca existiu. O terror é dado pela perda das ilusões de que tudo estava sob controle. E, de repente, aqueles que repetiam que estávamos todos bem bem mostraram que, na verdade, estamos todos bem perdidos. O estado de torpor dos moradores de São Paulo foi perfurado pela realidade, abriu-se um rombo que talvez seja impossível fechar. No fundo desse buraco não há vazio, mas espelho. É nesse ponto que existe algo de fascinante. É quando o morador de São Paulo vira todos, encarna o humano dessa época, uma catástrofe diante da catástrofe. Nós, o futuro que chegou primeiro.
Quem seremos nesse mundo em que o clima se mostra alterado, nesse planeta agora mais hostil pela nossa ação? Que filosofia produziremos? E que sentidos criaremos?
São Paulo sem água é uma imagem poderosa. A cidade expandida em que mais de 20 milhões vivem à beira de um rio que matamos. A cidade que virou estufa, abarrotada por carros que se movem mais e mais lentamente, queimando combustíveis fósseis e lançando gases na atmosfera. A cidade que desmatou o entorno dos mananciais e desprotegeu-se. A cidade em que, quando a chuva cai, parece que evapora antes de chegar ao chão convertido em concreto e, nas tempestades, alaga e é destruída porque o cimento não pode absorver a água. As chaminés das fábricas do século 20 da São Paulo “que amanhece trabalhando”, assim como os canos de descarga dos carros de cada dia, são falos decaídos. As ilusões de potência e de superação, o sem limites da modernidade, viram pó na cidade imensa, transformando São Paulo num monumento que ela não sonhou ser – e nós em seres trágicos.

O dia em que as autoridades ruíram

O momento em que a máquina do mundo se abriu para a maioria foi no final desse janeiro, ao ser anunciado que poderia haver um rodízio 5X2 – cinco dias sem água, dois com água. A classe média correu a comprar caixas d’água extras e galões, houve quem estocou centenas de litros, os baldes viraram objetos de desejo. Lembrou “Tubarão”, o filme de Steven Spielberg que talvez tenha inaugurado o conceito de blockbuster, na cena em que o monstro emerge com uma boca capaz de palitar os dentes com o barco que pretendia caçá-lo e o xerife da cidade diz, na frase que ficou antológica para quem gosta de cinema: “Vamos precisar de um barco maior”. Parece que, por aqui, nós vamos precisar de um balde maior.
Nosso momento presente é enorme. Precisaríamos ter na liderança um estadista, uma pessoa capaz de botar o interesse público acima de suas ambições eleitorais, alguém que compreende a amplitude do que está em jogo, um político com visão de século 21. Nosso desamparo é maior porque não temos essa figura nem no governo de São Paulo nem no governo do país. Temos no comando do estado alguém com uma mentalidade de vereador de cidade pequena. E nada contra vereadores de cidade pequena, existem os bons, apenas que para um governador o olhar precisa ser muito mais amplo e a política exercida num outro nível. E, no Planalto, temos uma presidente vendida como “gerente”, o que não é exatamente o que se espera de alguém que comanda um país, mas, como sempre pode piorar, se mostrou uma má gerente ainda no primeiro mandato.
O futuro chegou antes. E justamente no momento em que as instituições políticas e os grandes partidos estão desacreditados, em que se pode mentir para ganhar a eleição e dizer o contrário em seguida. É assim que a população descobre que as autoridades não só falsearam a realidade como não sabem o que fazer agora que a calamidade se instalou. As autoridades desautorizaram-se, num fenômeno político tão grave quanto complexo. E a população encontrou-se só e com o monstro na sala.
Se a realidade é assustadora, também é muito interessante. Nenhum dos governantes que deixaram a situação chegar a esse ponto – sem esquecer que Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo rumam no mesmo sentido – estão no poder por um processo autoritário. Não, estão lá porque a maioria dos que hoje se sentem desamparados votaram neles. No caso de São Paulo, o PSDB está indo para 24 anos no governo, há uma geração de paulistas que nasceu, passou pela infância e pela adolescência e virou adulto sob o comando da mesma sigla e nenhum alternância de poder. Dilma Rousseff está no segundo mandato, e o PT vai para 16 anos no Planalto. Geraldo Alckmin se elegeu no primeiro turno quando a “crise da água” era evidente, mesmo que o governador tenha negado a gravidade da realidade durante toda a campanha. Elegeu-se no primeiro turno em parte porque dava aos eleitores a chance de continuar fingindo que estava “tudo sob controle”. E, assim, ninguém precisou se mover, mudando velhos hábitos perniciosos e assumindo a responsabilidade de economizar água.
É como disse no Twitter André Vallias, poeta e designer gráfico, referindo-se à situação da água e da energia: “O Brasil não é o País do Futuro, mas da Fatalidade: atrás dessa palavra nossas autoridades se escondem para fugir à responsabilidade”. E isso vale também para os prefeitos, em especial para Fernando Haddad (PT), em São Paulo, e os das cidades da Grande São Paulo, que parece que acordaram só ontem, assim como para os parlamentares desse Congresso, que iniciam um novo mandato atolados na velha lama viciada, fazendo com que a maioria sequer espere qualquer coisa deles, a não ser mais do pior. Mas, se a responsabilidade das autoridades eleitas é muito maior e elas têm de responder pelo que não fizeram e pelo que não disseram, tanto quanto pelo que fizeram e disseram, numa democracia nenhum cidadão é inocente, ainda que alguns possam ser menos culpados do que outros.

A hora de se inspirar nos jovens e virar gente grande

Agora que as figuras paternas e maternas ruíram – e a gente tem certeza disso quando, diante da catástrofe em curso, elas mandam rezar para um Pai maior ou invocam São Pedro – seria uma boa hora para virar gente grande. E recuperar a amplidão da política, como nos lembraram os manifestantes de 2013. E continua a nos lembrar o Movimento Passe Livre em 2015, com os protestos pela tarifa zero. Precisamos ser eternamente gratos a esses jovens tão jovens, porque têm sido eles os verdadeiros adultos, no sentido de apontar que o rei está nu (e perdido) e somos nós que temos de assumir a responsabilidade de pensar a cidade. Cada vez que eles vão para as ruas contra o aumento da tarifa do transporte público, o que fazem é uma denúncia profunda do modelo desastroso de ocupação urbana e da opção criminosa pelo transporte privado e individual. Lembram-nos de que, sem a liberdade de ir e vir, não somos nada além de coisas. São eles que se movem diante da paralisia alienada dos mais velhos – e a experiência de literalmente se mover nas manifestações, por ruas de uma cidade que não se move, é de uma enorme força simbólica.
Na catástrofe da água que se anuncia já existem focos de cidadania consolidados, outros surgindo agora, que reúnem cidadãos que assumiram a responsabilidade de participar das decisões e de pressionar as autoridades. Enquanto o governador de São Paulo diz que não há certeza de que será preciso fazer rodízio, cidadãos começam a reivindicar que, sim, é preciso haver rodízio agora, neste instante, já que não é possível voltar atrás no tempo e começar a fazê-lo meses e até anos antes, o que teria tornado a situação de hoje menos desesperadora. Gente que percebeu que deveríamos desde sempre ter compreendido que não é possível consumir água dessa maneira descuidada, como se os recursos fossem infinitos, nem jamais deveríamos ter nos acostumado a abusos como usar água potável para dar descarga no banheiro ou deixar a água ir embora sem criar sistemas de reúso. Cidadãos que sabem que é preciso mudar não na emergência, mas para sempre. Enquanto o governador, mais uma vez, prioriza suas ambições eleitorais e ainda está “estudando” se haverá um plano de contingência, há cidadãos que decidiram lidar com a realidade e pressionar as autoridades a tomar decisões reais num mundo real, antes que só reste o êxodo.
Este é um dos poucos efeitos positivos da catástrofe que se anuncia. Aponta que ainda temos um caminho se cada um assumir a sua responsabilidade, incluindo aí a de pressionar o poder público a assumir a sua própria. Pertence a esse conjunto de reação a Aliança pela água, reunindo várias organizações que superaram suas diferenças em nome da emergência comum. Assim como os coletivos de jornalismo independente, entre eles a Mídia Ninja e a Ponte, que se uniram para documentar o colapso da água criando “a conta da água” na internet. Diante da pouca confiabilidade da informação oficial e da certeza de que foram enganadas por tempo demais, por todos os lados pessoas estão se juntando na busca de abarcar a dimensão do que está acontecendo e pensar no que fazer e em como viver daqui para a frente.
Um desses encontros aconteceu em 28 de janeiro na Casa de Lua, uma organização feminista que chamou os moradores de São Paulo pelas redes sociais para debater, produzindo um momento muito rico, tanto na intensidade das angústias quanto na sinceridade das respostas em construção. O encontro pode – e deve – ser assistido aqui. Entre os vários momentos interessantes, uma mulher fez a pergunta: “Eu sou uma pessoa comum, uma microempresária. Eu quero saber o que fazer, como eu posso ajudar”. A resposta de um dos debatedores, que restringiu-se a alterações no perímetro da casa e da família, não a satisfez. Ela então retrucou: “Vocês não estão entendendo. Eu acho que chegamos a esse ponto por que cada um sempre pensou em resolver apenas o seu problema. Eu quero saber o que posso fazer não para mim, mas para todos”.

“A negação como política de governo e como defesa psíquica”

A psicóloga paulistana Camila Pavanelli de Lorenzi, 32 anos, é uma das que está fazendo alguma coisa, se moveu. Ela começa a se tornar uma referência nas redes sociais por causa de seu Boletim da Falta D’água, criado em outubro de 2014. Nessa conversa comigo, ela conta como passou a dividir o doutorado na Universidade de São Paulo – sobre “os conceitos psicanalíticos de sublimação e realidade”, a partir da série de TV “The Wire” e de dois livros nos quais a série é baseada – com sua investigação pessoal sobre a catástrofe em curso. É revelador que seja uma psicóloga a tentar compreender o que as notícias da água dizem para além do que está escrito. Os grifos são meus, os parênteses são dela:
Como foi que começou a fazer o boletim?
Camila – Comecei numa noite em que eu estava especialmente de saco cheio de passar o dia lendo notícias – tanto sobre a falta d’água quanto sobre o posicionamento oficial do governo de que não faltava água – e decidi reunir e resumir tudo o que eu havia lido num texto só. Postei no Facebook. Compilar essas informações me trouxe algum alívio. Eu precisava (preciso ainda) entender o que diabos estava acontecendo. Havia muita coisa sendo publicada sobre a falta d’água, mas em veículos diferentes – era difícil ter uma visão mais abrangente da real gravidade da situação. Então fiz essa compilação de notícias naquela noite. Fiz a mesma coisa na noite seguinte, com o mesmo objetivo de me situar melhor em meio ao caos – e, de quebra, compartilhar o que eu estava lendo com meus amigos. E depois não vi motivos para parar. Eu sentia (sinto ainda) que não havia uma linguagem para falar sobre a chamada crise da água, e que era preciso (é ainda) criar essa linguagem. Depois de uma semana postando os boletins no Facebook, várias pessoas começaram a sugerir que eu criasse um blog ou tumblr só para eles. Achei que fazia sentido, e fiz um tumblr. Mas continuo postando os boletins na minha página pessoal do Facebook também, para facilitar os compartilhamentos.
Como você faz esse acompanhamento cotidiano?
Camila – No começo eu fazia todo dia. Acessava sites de notícia, fosse da grande mídia ou da mídia alternativa, e os órgãos oficiais do governo. Aí uma coisa levava a outra. Saía uma notícia sobre um processo ou decisão judicial, eu ia atrás desse documento. Saía uma notícia que não diferenciava muito bem os conceitos de pluviometria e vazão, eu ia atrás de um manual de hidrologia para entender os conceitos um pouco melhor. E assim fui construindo uma narrativa sobre a falta d’água no estado de São Paulo, dia a dia. Parcial, informal, incompleta, amadora. A minha narrativa do que estamos vivendo, enfim.
Como são seus dias desde então?
Camila – No ano passado, dediquei cerca de duas horas todas as noites à escrita do boletim. Passei a frequentar menos a academia. Passei a escrever menos no meu blog pessoal. Passei a escrever menos e-mails longos para os amigos. Neste ano, ainda não sei dimensionar quantas horas essa maluquice está me tomando. Ainda estou aprendendo a fazer um boletim semanal. Acabei de criar uma conta no Twitter (@bolfaltadagua) para me ajudar, para reunir uma pré-seleção de links. Vou tuitando e retuitando ali tudo o que leio de interessante. Desse mundaréu de notícias, vou selecionar algumas para costurar a narrativa da semana.
O que você faz quando não está olhando para a água ou para a falta dela?
Camila – Trabalho na minha tese, cozinho, cuido da casa, escrevo no meu blog. Levo a mais pequeno-burguesa das vidas, em suma.
O que te pega mais nessa questão da água?
Camila – A negação. Sobretudo a negação como política de governo. Eu não entendo nada de água, meio ambiente, gestão de recursos hídricos, nada disso. Mas eu entendo muito de negação como defesa psíquica. A negação foi catastrófica na minha vida pessoal e precisei de anos de análise para começar a elaborar alguns lutos (para não soar muito enigmática: minha mãe morreu quando eu tinha dez anos e sempre encarei isso como um fato normal e corriqueiro da vida, como se não fosse nada demais, “é chato, mas acontece” etc. Foi com a análise que pude sentir pela primeira vez a tragédia que foi eu ter perdido a minha mãe). Aí, de repente, eu vejo a negação sendo adotada pelo governo do estado como forma de lidar com uma crise sem precedentes na história do Brasil. E isso evidentemente tem efeitos sobre a população. Isso me fascina, na verdade: as relações entre a negação como política de governo e a negação como defesa psíquica. Porque ninguém, de verdade, acredita que a água vai acabar (ou, se acredita, não consegue conceber o que significa isso). E é compreensível que seja assim. Como acordar de manhã, ir para o trabalho, cuidar dos filhos – levar a vida de sempre, enfim – quando se tem a perspectiva de que a água pode acabar dentro de poucos meses? Melhor acreditar que a crise não é tão grave assim. E acabou que tivemos a união da sede com a vontade de beber. De um lado, a população que desejava ouvir que estava tudo bem e que poderia seguir com a vida normalmente; de outro, um governo que realizou plenamente esse desejo, garantindo que não faltava nem faltaria água em São Paulo.
Você termina seus boletins dizendo: “Pode entrar em pânico que segunda que vem tem mais”. Vi no debate da Casa de Lua que essa questão, entre ter calma, como foi colocado por outra debatedora, e a sua conclamação/autorização para, ao contrário, entrar em pânico, te perturbou. O que tem pensado sobre isso?
Camila – Fiquei perturbada, sim. Nos primeiros dias eu concluí o boletim com “calma que amanhã tem mais”. Mas logo me dei conta de que o problema era justamente que estávamos calmos demais. Pânico, para mim, não é “ó meu deus vamos todos morrer mesmo então melhor se matar antes”. Pânico, para os fins do Boletim da Falta d’Água em SP, é o oposto da letargia institucionalizada. É o oposto de “não falta água, não faltará água em São Paulo”. É o meu manifesto antinegação. É um apelo para que as pessoas se informem sobre o que está acontecendo e, a partir daí, tomem as ações que julgarem mais adequadas. Como não acredito em ação sem reflexão, acho importante estar bem informado para resolver o que fazer. E isso em todos os níveis: desde construir cisterna em casa até exigir providências das autoridades, passando pela organização de redes de solidariedade nos bairros e comunidades.
(Fim da conversa com Camila)

A disputa da narrativa já começou

A palavra “crise” me parece muito pequena diante do que já está desenhado. Talvez coubesse anos atrás, momento em que, se tivesse sido pronunciada, assumida e enfrentada, poderia ter tido seu impacto reduzido. Hoje, não mais. Alguns têm sugerido a palavra “colapso”. E colapso pode dar conta da impossibilidade de viver como antes, da convicção de que não existirá mais “a vida de sempre”, de algo que não pode ser refeito sobre as mesmas bases. O que se anuncia me parece poder ser representado por “catástrofe”, palavra que escolhi usar mesmo correndo o risco de ser chamada de “apocalíptica”, como já se acostumaram a ouvir todos aqueles que alertam para os rumos perigosos de São Paulo e do país, assim como para os desafios da mudança climática do planeta há anos, décadas. Já padecemos demais com os eufemismos esgrimidos pelas autoridades. Mas, ainda que saibamos que as palavras são importantes, jamais podemos esquecer que os extremos de nossa condição são irrepresentáveis, escapam da linguagem. É também a batalha da linguagem que travaremos – e nela está também tudo aquilo que não vira palavra.
É isso que Camila também diz quando afirma que ainda não encontrou a linguagem para expressar o que vive. Ela, assim como todos aqueles que, individual ou coletivamente, se mobilizaram para documentar a catástrofe da água são filhos desses tempos de internet e têm enorme importância para a construção da realidade do dia seguinte. Quanto mais múltiplas forem as versões, melhor para a busca das verdades dos fatos e para a interpretação das subjetividades. A disputa narrativa já começou, e as armadilhas são proporcionais ao tamanho do desafio.
Uma versão bastante difundida por alguns noticiários, em especial os da TV aberta, tem sido a de que o problema dos apagões de energia seriam decorrentes das hidrelétricas que ainda não foram concluídas, como Belo Monte, ou das que ainda não foram iniciadas. Em seguida, vem o culpado: “por atrasos/dificuldades no licenciamento ambiental”. Por que eu me refiro à escassez de energia quando estava falando da escassez de água? Primeiro, porque são temas relacionados. Segundo, porque aqui claramente é demonstrada a repetição do discurso da dissociação e da negação. E foi também a dissociação e a negação, em todos os planos, que nos trouxe até o estado atual de calamidade.
Talvez nunca tenhamos precisado tanto fazer relações e compreender o mundo dentro de uma teia de ação e consequências como hoje. A narrativa que compartimenta falseia e informa mal. Está superada em todas as áreas, inclusive na educação. No momento em que sofremos as consequências da irresponsabilidade de nossas escolhas, em que as questões ambientais devem estar no topo das nossas prioridades se quisermos ter alguma chance, em que executivos das grandes empreiteiras que constroem as grandes hidrelétricas e que são as grandes financiadoras de campanhas políticas estão na cadeia por conta da operação Lava Jato, tenta-se de novo e sempre colocar ambientalistas e preocupações ambientais como um “entrave”. Por que e a serviço de quem? Ignorância, má fé ou ambas?
Um exemplo. A falta de água se anuncia como catástrofe, mas, ao mesmo tempo, o governo federal quer concluir Belo Monte, no rio Xingu, apesar de todas as irregularidades e da denúncia de etnocídio indígena, e barrar o Tapajós. Aqui, há algumas relações que podem ser feitas: 1) as hidrelétricas têm grande impacto no desmatamento e na destruição ambiental, não apenas pela obra em si, mas também pelo desequilíbrio que provocam ao expulsar ou realocar comunidades, assim como a quantidade de migrantes que atraem e todas as consequências envolvidas nisso; 2) a devastação da Amazônia, onde hoje estão sendo feitas e planejadas as grandes barragens, já é dramática e compromete o clima; 3) há cientistas etrabalhos científicos de alto nível mostrando que a floresta amazônica tem um papel estratégico na regulação do clima do Brasil e do planeta, o que envolve a questão das chuvas no sudeste do país; 4) os reservatórios das hidrelétricas ficam baixos quando a chuva é escassa, comprometendo o abastecimento da energia; 5) priorizar hidrelétricas na Amazônia e culpar a resistência a elas pelo desabastecimento é encobrir que o governo federal não fez o necessário investimento na diversificação de fontes de energia; 6) é também escamotear que, em vez de conscientizar a população da necessidade de poupar, porque os recursos são finitos, o governo federal fez exatamente o contrário disso, estimulando o consumo; 7) os enormes problemas sociais e ambientais causados pelas hidrelétricas, e neste quesito Belo Monte é o nosso atual mostruário (ou “monstruário”, como alguns preferem), são causados também porque o processo de licenciamento ambiental não é respeitado nem as condicionantes legais, aquilo que é preciso fazer para que a obra possa ser realizada com danos menores, não são cumpridas.
Em resumo: a verdade é muito mais complicada e atrapalha os poderosos interesses envolvidos. Os links dos últimos parágrafos são de grande importância para quem compreender que precisa compreender o que está em jogo e participar das decisões. Se pode emergir algo de positivo desse momento que vivemos é o de fazer com que questionemos a nossa relação com o meio ambiente, assim como o nosso lugar num planeta cada vez mais hostil pela nossa ação, dando-nos a chance de nos tornarmos pessoas capazes de enfrentar os desafios dessa época, que, como qualquer um pode perceber, são enormes.
O que está em jogo não são obras, mas nossa relação desastrosa com o meio ambiente, nossa dissociação com a natureza e nossa ignorância. Ignorância no sentido de desconhecer até mesmo que é preciso conhecer. É imperativo romper com a negação. E podemos começar a fazer isso aumentando nossa leitura crítica e construindo as relações necessárias. Não custa lembrar sempre que, como diz a frase famosa, “na guerra, a verdade é a primeira vítima”.

Os possíveis cenários da “guerra da água”

Quem seremos nós quando a água acabar? Tudo indica que saberemos muito em breve. Uma reportagem de O Estado de S. Paulo mostra que, seis anos atrás, um estudo envolvendo 200 especialistas mostrou ao governo paulista uma projeção do que aconteceria se a crise não fosse enfrentada. O relatório chama-se “Cenários ambientais 2020”. Nele, projetava-se, a partir das informações disponíveis, o que aconteceria até este ano caso medidas não fossem tomadas. O objetivo do estudo era estabelecer planos de ação para impedir que os cenários mais pessimistas se realizassem – ou seja, para evitar a realidade de hoje.
É aterrador de várias maneiras, a começar pelo fato de que o estudo encomendado pelo governo do PSDB foi ignorado pelo governo do PSDB, resultando no que está aí. Mas é aterrador também pelo cenário sugerido no documento como o mais provável. O texto é escrito como se o narrador já estivesse em 2020 e tudo já tivesse acontecido.
Diz a reportagem: “O estado (de São Paulo) teria assistido nesse período (2015) a um ‘conflito pelo uso dos recursos hídricos’, que desencadeou uma ‘guerra da água’ entre algumas regiões. Essa guerra teria começado após ‘um ano atípico de chuvas, com precipitações muito abaixo do esperado’”. O documento diz ainda: “O ano de 2018 significou um marco na história do uso da água no estado de São Paulo e os problemas verificados podem ser considerados uma continuação daqueles da crise de 2015. Em determinadas regiões, em função do uso intensivo de agrotóxicos (defensivos agrícolas) e fertilizantes (adubos), as águas superficiais e subterrâneas foram afetadas, comprometendo o abastecimento público de alguns municípios. As ações judiciais se multiplicaram, no rastro das manifestações populares que reivindicaram o abastecimento público em detrimento do agronegócio. A Agência Nacional de Águas (ANA) disponibilizou técnicos que auxiliaram na mediação do conflito. No auge da crise, prefeitos e vereadores aprovaram pacotes com leis restringindo temporariamente atividades econômicas de uso intensivo de água”.
Esta é a projeção realizada em 2009 – e ignorada. Agora, estamos no presente, em 2015, ano em que a “guerra da água” começaria.
Que impacto terá a falta de água nos empregos? Como farão os pais para trabalhar se os filhos ficarem sem escola e sem creche? O que acontecerá com os doentes e os velhos? Que tipo de inferno ainda maior se tornarão os presídios e as instituições para crianças e adolescentes infratores? Como será nos hospitais se as doenças aumentarem? Será que devemos tentar fugir de São Paulo?
Estas são algumas das perguntas que aparecem nos debates sobre a água, vindas de uma plateia cheia de angústia diante da incerteza de um futuro que é logo amanhã. Da experiência concreta da realidade vem o exemplo da cidade paulista de Itu, no ano passado, quando donas de casa foram para as ruas com tomates e ovos e seus filhos com pedras, quando carros-pipa precisaram de escolta policial, quando surgiram traficantes de água, quando as pessoas foram assaltadas depois de horas na fila para encher um galão ou um balde. Quando os assaltantes queriam não mais dinheiro, mas água. A Grande São Paulo se tornará Itu, multiplicada por milhões?
Depende de nós construir, coletivamente, uma resposta que não seja a barbárie do individualismo e do salve-se quem puder ou quem tem mais dinheiro. Os mais ricos podem sair da cidade, a classe média vai ter que aprender com os mais pobres, que há muito estão submetidos ao regime de rodízio de água sem que ninguém se importe além deles, como é que se vive na escassez. O que não podemos permitir é que a catástrofe da água seja reduzida a um problema de segurança pública, com as forças de repressão do Estado a serviço dos mesmos de sempre, como já se tornou um hábito no tratamento das questões mais profundas, exatamente para desviar o foco, esvaziar o conteúdo e escapar das responsabilidades.
Para começar, precisamos entender que o que parece anormalidade, exceção, é possivelmente a normalidade daqui em diante. São Paulo apenas antecipa o futuro por todos os superlativos com os quais foi construída. Precisamos nos preparar para um clima de extremos, nosso mundo já é pior. E é pior, na compreensão de 97% dos artigos científicos sobre o clima, por causa da ação humana sobre o planeta. Assim, precisamos mudar mesmo. E a água é apenas o tema mais urgente que exige nossa participação nas decisões da cidade, do estado e do país – do mundo. E está relacionada com as principais questões socioambientais. A água não pode mais ser vista como mercadoria.
Não há tempo para formar uma geração que compreenda os desafios desse momento histórico. Teremos de enfrentá-los com os homens e mulheres imperfeitos de nossa época – arrogantes, consumistas, egoístas e inconsequentes, ainda com as ilusões da modernidade batendo em nossos corações enquanto o mundo ao nosso redor se arruína. Terá de sermos nós, a única matéria humana disponível, com o melhor que conseguirmos encontrar na escassez íntima de nossos interiores.
O tempo de despertar já passou. Agora é preciso acordar em pé.

Eu vou, eu vou...

Eu vou, eu vou...

Reclamar do trânsito caótico das grandes cidades já virou lugar-comum. Além de cobrar ações dos governantes, está em nossas mãos dar um empurrãozinho nessa lentidão e encontrar uma saída para melhorar a mobilidade urbana


mugley/Creative Commons
"O luxo está no rico andar de transporte público e não no pobre andar de carro. O transporte público é um bem nacional.", aponta Marisa Moreira Salles, uma das organizadoras do evento Arq.Futuro

Todo dia, uma população igual à do Uruguai se desloca da zona leste de São Paulo rumo ao centro da cidade – e olha que estamos falando apenas de uma região! Na verdade, o verbo correto é “se arrasta”, já que a velocidade média do trânsito paulistano é de 13 quilômetros por hora nos períodos de pico, inferior à de uma galinha apressada (sim, é isso mesmo!)**.

Ao todo, são nada menos que 20 milhões de pessoas circulando no maior município do Brasil. Por isso, demorar uma hora e meia para chegar a casa ou ao trabalho, num percurso que levaria 20 minutos, não espanta mais ninguém. Mas cansa! A média é de três horas diárias perdidas no trânsito, 60 por mês, 720 por ano – o que equivale a um mês inteiro dentro do carro ou do ônibus! E esse problema não é só de São Paulo – Rio de Janeiro, Curitiba e Brasília seguem o mesmo caminho.

Ter aproximadamente 5 milhões de automóveis rodando só na capital paulista não é motivo de orgulho para o país; muito pelo contrário. Na Alemanha, por exemplo, sede de grandes montadoras, as pessoas dispensam o carro no dia a dia. “Lá tem bondeônibusmetrôtrem ciclovia para atender os grandes centros, daí eles vendem a produção para nós”, diz o jornalista Bruno Favoretto (SP), que é deficiente físico e enfrenta problemas de mobilidade ainda piores que a maioria de nós. Ele integra um grupo que discute soluções de locomoção para que boas práticas – carona solidária e uso de bicicletas, por exemplo – sejam implantadas em determinada região ou empresa.

QUANTA DIFERENÇA 
Nos países desenvolvidos, as pessoas utilizam o transporte público porque ele é confortável, pontual e seguro. “Já o Brasil ainda privilegia investimentos no transporte individual, em detrimento do coletivo, que leva mais gente num espaço menor e com menos impacto ambiental”, diz a arquiteta e urbanista Laisa Stroher, mestranda emplanejamento urbano (SP).

Superpopulosas, as maiores cidades europeias e americanas já estariam paradas se não priorizassem soluções de mobilidade. “Paris, Londres e Nova York, cada uma, tem mais de 400 quilômetros de linhas de metrô, enquanto São Paulo, que precisaria de 600, soma 76”, conta Maurício Broinizi, coordenador executivo da Rede Nossa São Paulo e da secretaria executiva da Rede Social Brasileira por Cidades Justas e Sustentáveis.

Como se não bastasse, essas metrópoles adotaram outras estratégias: Londres criou opedágio urbano, que começou no centro expandido e hoje abarca outras áreas (o dinheiro arrecadado vai para melhorias no transporte público); em Nova York, foram construídos 450 quilômetros de ciclovias e 50 de corredores de ônibus só nos últimos cinco anos. São bons exemplos a serem seguidos!

O QUE ESTÁ SENDO FEITO
A situação caótica do trânsito no Brasil pode começar a mudar. Em janeiro de 2012, foi implantada a Política Nacional de Mobilidade Urbana (Lei nº 12.587), que obriga cidades com mais de 20 mil habitantes a fazer um plano de mobilidade.

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

Escassez de água e mudança de hábitos

Escassez de água e mudança de hábitos

Carolina Barbosa
Fotos: Genilson Pessanha
Em meio à crise hídrica histórica do Sudeste, existem pessoas conscientes que tomam várias medidas em casa para reaproveitar o máximo possível de água e poupar o que está escasso. É possível economizar água realizando pequenas ações. Segundo o diretor do Comitê do Baixo Paraíba, João Siqueira, com medidas de uso racional é possível economizar em média 20%.
A técnica de atividade judiciária Cláudia Muniz, de 47 anos, realiza em casa várias ações para o reaproveitamento da água. A ideia sustentável surgiu através da filha, Paula Campos, de 21 anos, que cursa engenharia ambiental. A família criou um sistema de coleta da água da chuva e também outras ações. “Há muito tempo atrás ouvia dizer que a água do planeta ficaria escassa. Não entendia como isso poderia ser verdade, mas a semente foi plantada na minha cabeça e daí em diante comecei a pensar de forma diferente. Infelizmente nenhuma autoridade e nem as pessoas acreditaram. Tudo que os ambientalistas disseram há vinte anos está se concretizando. Precisamos fazer alguma coisa. Se cada um fizer um pouco de sacrifício, ganhamos mais tempo com água”, destacou.
Cláudia contou também que as medidas de reaproveitamento começaram antes da crise. A família reaproveita a água da máquina de lavar roupas, de tanques e até do ar condicionado. “A gente só tem noção quando começa a separar. Utilizamos para molhar as plantas, lavar carro, calçada, para usar no vaso, entre outros. Funciona mesmo. Estamos reaproveitando o tempo todo. As pessoas esperam acontecer para tomar providências e colocam dificuldades. Quando começamos, não estava nessa crise e me chamavam de doida. A gente já se prepara”, relatou.
A estudante de engenharia ambiental Paula também falou da economia. “O sistema de coleta de chuva varia, pois dependemos da chuva. Mas gera uma economia de cerca de 40% ao ano. As pessoas devem encarar como um investimento. Já as outras medidas dão mais diferença, pois é independente da chuva”, destaco, Cláudia, falando ainda da importância das pessoas adotarem ideias como essa. “Ainda pretendemos fazer mais. Atitudes fazem a diferença”, concluiu.
O diretor do Comitê do Baixo Paraíba, João Siqueira, lembrou que esta semana teve uma reunião e o grupo decidiu reduzir de 140 m3/s para 130 m3/s o volume de água repassado do Paraíba do Sul para o Guandu, via represa de Santa Cecília, em Barra do Piraí, para preservar os níveis dos reservatórios. “O grupo encaminhará o ofício à ANA para aprovar. Na terça-feira, teve uma reunião no Rio de Janeiro e estamos elaborando documentos com ações para a preservação”, disse.
Para o historiador e ambientalista Aristides Soffiati, em curto prazo não há soluções para o Sudeste. “Em curto prazo não existe porque a destruição foi em longo prazo. Temos que esperar que chova, mas já sabendo que a chuva no final do verão não resolverá o problema. Aprendemos que poderíamos gastar e que não ia acabar, mas está acabando. Os gastos têm sido grandes”, destacou.
No sábado (7), o secretário de Defesa Civil de Campos, Henrique Oliveira, informou que o nível do rio Paraíba estava em 4,85 metros, ainda abaixo do normal. “Está muito abaixo para o período de verão. Nesta época, a média é de 9 metros. Está com muitos bancos de areia nele todo”.
Transposição – O Governo Federal incluiu no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) a obra da transposição do rio Paraíba. As obras devem ter início em 90 dias após o lançamento da licitação. 
Campanha combate o desperdício de água
Em Campos, a Prefeitura informou, através de nota, que o município tem, desde 2009, um programa municipal para economia de água. Outras ações também são realizadas. “Diante da pior seca dos últimos anos e, consequentemente, de uma crise de água que vem ganhando proporções cada vez maiores em parte da região Sudeste, a Prefeitura lançou a campanha:“Não Curtimos desperdício.Compartilhe essa ideia”. O objetivo é incentivar o consumo consciente da água”, disse parte da nota. O governo municipal afirmou também que segue dando apoio aos produtores do município e que a nova UBS da Penha segue o princípio de sustentabilidade. “A Prefeitura também implantou, em agosto, o Programa de Sustentabilidade Agenda Ambiental na Administração Pública (A3P), que já apresenta resultados positivos... A meta é estabelecer a redução de consumo de água em 10% nas unidades municipais”.
Já em SJB, a assessoria informou que o município não está em situação de racionamento. “Isto aconteceu no período que a Cedae teve dificuldades de captação de água em função não só do baixo nível do Rio Paraíba do Sul, como também do fornecimento de energia da Ampla. O que acontece atualmente e que interfere na disponibilização de água é o aumento da demanda, característica do período de verão”, disse, acrescentando que vem alertando a população quanto à necessidade de economizar água potável. “O racionamento nos exige uma situação de alerta, mas o trabalho de conscientização tem que ser constante e envolve parcerias em todas as esferas do poder público”. A assessoria da prefeitura de São Fidélis não respondeu o e-mail até o fechamento desta matéria, na quinta-feira.
Campos sem risco de sofrer racionamento
A concessionária responsável pelo abastecimento de Campos, Águas do Paraíba, afirmou que o abastecimento de água continua normal e assim deverá continuar. “Salvo alguma alteração drástica no rio Paraíba do Sul, não indicada pelo cenário, mesmo levando em consideração a seca e a estiagem, desde o ano passado”. A nota informou ainda que a única situação diferente é no extremo norte do município, em Conselheiro Josino, Morro do Coco, Murundu e Vila Nova. “Nessas localidades, o abastecimento suplementar de água é feito por caminhões-pipa — seis a oito por dia — por ser uma região topograficamente alta, com baixo lençol freático e poucos mananciais de suprimento de água. Mas, é uma situação localizada”.
Já a Cedae, responsável pelo abastecimento em SJB e São Fidélis destacou que o abastecimento está normalizado nos dois municípios. “São Fidélis teve problemas apenas no sábado (31/01/2015), quando houve o rompimento de uma tubulação, que precisou ser retirada de carga para que o reparo fosse realizado — o que durou cinco horas. Desde então, o abastecimento foi retomado e já está normalizado”. Quanto a SJB, “houve problemas apenas no fim do ano passado, devido à língua salina — maré alta que adentra o leito do rio, aumentando a salinidade da água, mas a situação está normalizada”.
A Cedae está realizando a megaoperação “Água Legal” contra ligações clandestinas na Região Metropolitana e elas podem se estender a qualquer ponto da região atendida. A companhia pede a quem tiver informações que envie à ouvidoria pelo telefone 08002821195.

FONTE JORNAL FOLHA DA MANHA

Doce água

Doce água

Vai existir água suficiente em um mundo cada vez mais populoso?   

por Barbara Kingsolver
     
Jim Brandenburg

Água: tempestade no lago Tofte, na região norte de Minnesota

Uma tempestade de verão reabastece o lago Tofte, na região norte de Minnesota
Toda manhã, quando minha filha e eu percorremos o caminho desde a nossa casa de fazenda até a parada do ônibus escolar, ficamos com os olhos bem atentos para alguma maravilha. Quase sempre que topamos com uma, ela reflete a magia da água, como uma teia de aranha com gotas de orvalho formando um colar de cristais translúcidos. Ou uma garça cor de chuva alçando voo desde a beira do riacho. Em uma manhã assombrosa, o caminho foi invadido pelas rãs. Dezenas delas pulavam na relva diante de nós, lançando-se em arcos saltitantes com suas barrigas brancas - mais parecia que havíamos sido surpreendidas por uma tempestade de anfíbios. Em outra ocasião, cruzamos com uma tartaruga-mordedora, com sua primitiva carapaça cor de oliva. Normalmente, ela é uma criatura que se restringe às lagoas, mas algum impulso obscuro levou esse espécime até o nosso caminho de cascalho, usando a semana chuvosa como passaporte para deixar a nossa fazenda e passear.
Outro motivo de encanto permanente para nós é o riachinho sem nome que corre através do vale. Antes de mudarmos para o sul da região de Appalachia, vivemos por muitos anos no Arizona, onde um córrego permanente como esse merece tornar-se reserva natural. No Arizona, o estado do Grand Canyon, lembramos que a água é capaz de transformar a superfície da terra, rasgando o deserto rochoso como se fosse um pêssego, em fendas com 1,5 mil metros de profundidade. Ali as cidades funcionam como estações espaciais, obrigadas a trazer de remotos rios e aquíferos cada gota de água doce. Tão forte é a propensão humana a considerar a água como um direito de nascença que ainda são comuns fontes públicas borbulhantes nas praças das cidades do Arizona, assim como fazendeiros empenhados em cultivar safras sedentas. Porém, a verdade se insinua em todas essas fantasias quando os moradores do deserto passam meses esperando pela chuva, vendo os cactos apertarem os cintos e as aves papa-léguas disputarem as preciosas gotas que pingam de uma torneira de jardim. Sem água não há vida. Ela é o caldo salgado de onde surgimos, o sistema circulatório do mundo, uma franja molecular na qual podemos sobreviver. Até dois terços de nossos corpos são constituídos de água, tal como nos mapas-múndi; nossos fluidos vitais são salgados, tal como a água dos oceanos. Tal pai, tal filho.
Mesmo enquanto damos como líquida e certa a presença da Mãe Água, nós, seres humanos, sabemos que, no fundo, é ela quem manda. Estabelecemos nossas civilizações nos litorais e junto aos grandes rios. Nosso maior temor é a ameaça de escassez - ou excesso - de água. Nos últimos tempos aumentamos a temperatura média do planeta em 0,74°C, um número que parece insignificante. Mas a água é a face visível do clima e, portanto, das mudanças climáticas. A alteração nos padrões de precipitação provoca inundações em algumas regiões e secas em outras, enquanto a natureza nos demonstra uma importante lição da física: a de que o ar quente contém mais moléculas de água que o ar frio.
Bem longe do recanto encharcado em que vivo, o vale do Bajo Piura é uma imensa área recoberta pelas mais secas areias que já pisei. Estendendo-se desde a costa noroeste do Peru até o sul do Equador, o deserto de Piura, com 36 mil quilômetros quadrados, abriga muitas formas de vida espinhosas e endêmicas. Essa ecorregião costuma ser classificada como seca e muito seca, e a borda sul do Bajo Piura seria considerada por qualquer pessoa como o lugar mais seco de todos. Entre janeiro e março, ali caem apenas 2,5 centímetros de chuva, dependendo dos caprichos de El Niño, segundo explicou o meu motorista enquanto seguíamos pelo esburacado leito do rio Piura. Durante horas atravessamos campos esturricados, arruinados por anos de irrigação, e passamos por vales escaldantes cujas condições são intoleráveis para qualquer coisa além de uma algarobeira de raízes profundas, a Prosopis pallida, a árvore mais adaptável a terrenos áridos. E também, surpreendentemente, algumas famílias dispersas do Homo sapiens.
Eles são refugiados econômicos, em busca de terras que não custam nada. Isso não implica que a sobrevivência no Bajo Piura não tenha outros custos, pois o frágil ecossistema também paga um preço à medida que as pessoas ampliam a desertificação ao transformarem em lenha o que resta de vegetação. O que me leva ali, como jornalista, é um inovador projeto de reflorestamento. Conservacionistas peruanos, em parceria com uma organização não governamental, a Heifer International, estão convencendo os moradores a criar cabras e bodes, pois eles se alimentam das vagens ricas em proteínas das algarobeiras e depois dispersam as sementes pelo deserto. À sombra de um precário abrigo, uma jovem mãe coloca sua panela amassada sobre um fogo alimentado por excrementos secos e mostra como deixava coalhar o leite de cabra para fazer queijo. Mas é difícil encontrar tempo para tirar o leite das cabras, pois ela, tal como as outras mulheres que conhece, todos os dias precisa caminhar oito horas para buscar água.
Os maridos dessas mulheres estão cavando um poço ali perto. Trabalham com colheres de pedreiro, uma forma de compensado para revestir de cimento a parede do poço, avançando centímetro por centímetro, e usam uma robusta manivela improvisada para descer um homem até o fundo e de lá retirar baldes de areia. Uma dezena de homens esperançosos, com chapéus de palha sujos, afasta-se para que eu possa examinar o trabalho, que até então havia resultado apenas em um monte de areia completamente desprovido de umidade. Espio no fundo daquele buraco escuro e então me viro e subo no topo do monte de areia para esconder lágrimas pouco profissionais. Para mim era difícil compreender esse tipo de perseverança.
Eles ainda estão lá, escavando a areia ressequida e sobrevivendo a duras penas, como um microcosmo da vida neste planeta. Não há saída. Quarenta por cento dos lares na África subsaariana estão situados a mais de meia hora de uma fonte de água, e essa distância só aumenta. Os fazendeiros australianos não podem mais acompanhar a mudança nos padrões de precipitação, pois ela se deslocou para o sul e as chuvas caem sobre o oceano. Todos estamos na mesma situação, e ela requer o máximo de nós.
Desde pequena ouvi dizer que, quando se está no fundo de um poço, dá para ver as estrelas, mesmo à luz do dia. Aristóteles falou disso, assim como Charles Dickens. Em muitas noites escuras, a imagem daquele trecho arredondado do céu repleto de estrelas me proporcionou conforto. Só que há um problema: isso não é verdade. A civilização ocidental não se mostrou muito disposta a descartar essa imagem folclórica. Os astrônomos acreditaram nela por séculos, até que alguns deles resolveram verificar - bastou uma observação para que ruíssem as ilusões.
Do mesmo modo, nossa civilização reluta em se desfazer de outro mito: o da infinita generosidade do planeta Terra. Recusando a ver os claros indícios em contrário, continuamos acreditando nisso. Bombeamos a água dos aquíferos e desviamos o curso dos rios, confiando em duas estrelas-guia: a irrestrita expansão humana e o suprimento infinito de água. Agora os lençóis freáticos estão se esgotando em países que abrigam metade da população mundial. É como se todos nós tivéssemos estourado, de maneira espetacular, nossas contas bancárias.
Em 1968, o ecologista Garrett Hardin publicou um ensaio com o título The Tragedy of the Commons ("A Tragédia dos Recursos Comuns"), que desde então virou leitura obrigatória para os estudantes de biologia. Ele trata dos problemas que somente podem ser resolvidos por meio de "uma mudança nos valores humanos ou nas ideias de moralidade", naquelas situações em que a busca racional do interesse individual conduz à ruína coletiva. Criadores de gado que dividem pastagens comunitárias, por exemplo, vão progressivamente aumentando seus rebanhos até que o pasto é destruído pelo uso excessivo. Em vez disso, a aceitação de limites autoimpostos, algo no início inconcebível, passa a ser a única saída. Enquanto nossas leis supõem um critério moral fixo, Hardin sustenta que "a moralidade de um ato é função da condição do sistema no momento em que tal ato se realiza". No passado, com certeza não era nenhum pecado abater pombos e comê-los em tortas.
A água é o mais fundamental dos recursos comuns. Os cursos d’água antes pareciam tão abundantes quanto os pombos, e a noção de preservar a água era tão ridícula quanto a de engarrafá-la. Mas as regras mudam. Incontáveis vezes os países estudaram os sistemas aquáticos e redefiniram os critérios de uso mais sensato. Agora o Equador se tornou a primeira nação do planeta a incluir os direitos da natureza em sua Constituição, de modo que rios e florestas não sejam simplesmente propriedade, mas desfrutem de um direito próprio de prosperar. Sob tal legislação, um cidadão pode abrir um processo em favor de uma bacia hidrográfica ameaçada, reconhecendo que a saúde dela é crucial para o bem comum. Outros países talvez sigam os passos do Equador. Do mesmo modo que, no passado, o sistema legal hesitou em reconhecer os direitos das mulheres e dos ex-escravos, hoje as faculdades de direito nos Estados Unidos vêm reformulando seus currículos visando compreender e reconhecer os direitos da natureza.
Sobre a minha mesa, um copo com água reflete a luz do entardecer, e continuo atenta às maravilhas naturais. Quem é dono dessa água? Como posso considerá-la minha se o destino dela é circular por rios e corpos vivos, tantos já passados e outros tantos no futuro? Ela é antes uma antiga e deslumbrante relíquia, esperando para retornar aos seus, esperando para mover montanhas. Ela é o padrão do meio circulante biológico, e a boa nova é que há incontáveis maneiras de preservá-la. Além disso, ao contrário do petróleo, a água sempre vai fazer parte de nossas vidas. Nossa confiança na generosidade da Terra tinha em parte razão de ser, uma vez que toda gota de chuva acaba no oceano, e o oceano chega ao firmamento. E em parte era infundada, porque não somos indispensáveis para a água. É bem o oposto. Nossa missão é descobrir maneiras razoáveis de sobreviver no interior dos limites dela. Faríamos bem em fixar a vista em novas estrelas-guia. O suave estímulo das evidências, a orientação da ciência e um coração empenhado em proteger os recursos comuns: esses são os instrumentos de um novo século. Contemplar com assombro um planeta repleto de água é a nossa maneira de ver o que está em jogo e de conhecer melhor o nosso lugar.

domingo, 15 de fevereiro de 2015

Tribunal de Haia pode acabar com a caça de baleias do Japão

Tribunal de Haia pode acabar com a caça de baleias do Japão

Baleia Jubarte (Foto: Instituto Baleia Jubarte)
Terminou nesta semana a fase de audiências públicas de um esperado julgamento envolvendo a conservação de baleias na Antártica. Japão e Austrália se enfrentam no Tribunal Internacional de Haia, na Holanda, e um resultado favorável aos australianos pode forçar o Japão a encerrar seu programa de caça de baleias.
Caça de baleias do Japão é “economicamente inviável”, diz relatório
A disputa entra Japão e Austrália não é nova. Ela começou em 1986, quando a Comissão Baleeira internacional (CBI) proibiu a caça de baleias em todo o mundo. O Japão ratificou a moratória, mas aproveitou uma brecha no texto para continuar caçando as baleias. A brecha diz que, em caso de pesquisa científica letal, a carne de baleia pode ser reaproveitada no comércio. O Japão iniciou um programa para estudar o conteúdo estomacal e as camadas de gordura da baleia, argumentando que o programa ajuda a entender melhor a cadeia alimentar dos cetáceos. Para isso, o país se auto-licencia a caçar 850 baleias-minke, 50 baleias-fin e 50jubarte por ano. A carne das baleias caçadas para pesquisa vai parar nos açougues japoneses.
O programa é extremamente questionado por conservacionistas e pela comunidade científica. "Todos os resultados da caça científica do Japão podem ser obtidos com métodos não-letais de pesquisa. As evidências são enormes para mostrar que o objetivo do Japão não é científico, é comercial", diz Márcia Engel, presidente do Instituto Baleia Jubarte.
Os navios japoneses caçam no Oceano Austral, próximo a um local onde o governo australiano quer criar um santuário de baleias. Após muitos embates na CBI, os australianos decidiram levar o caso à Corte Internacional de Justiça, maior órgão judicial das Nações Unidas. A fase de audiências terminou nesta semana, e o tribunal deverá apresentar um veredito até o final de ano. A decisão deve ser respeitada pelos países - não há como recorrer de uma sentença em Haia.
O resultado do julgamento deve ter impacto indireto na conservação das baleias que usam o território brasileiro para se reproduzir. O Brasil já foi favorável à caça de baleias no passado, mas hoje faz parte do grupo de países que defende a criação de um santuário na Antártica para a conservação. Ainda assim, o tribunal pode mudar a situação atual da conservação de baleias. Segundo Márcia, uma decisão favorável à Austrália seria positivo por mostrar ainda mais a importância da pesquisa não-letal e do turismo de observação de baleias. "Já uma decisão favorável ao Japão poderia abrir um precedente para outros países caçarem desrespeitando a legislação internacional".

Poluição reduz expectativa de vida na China em 5,5 anos

Poluição reduz expectativa de vida na China em 5,5 anos

Vanessa Barbosa - Exame.com - 
ljlush/Creative Commons





















O boom econômico da locomotiva asiática vem deixando sequelas graves no meio ambiente e na saúde da população. Um novo estudo estabelece uma relação clara entre a poluição atmosférica crítica que aflige o  norte da China e a redução na expectativa de vida.

Baseado em estatísticas de 1981 a 2001 e publicado no periódico científico Proceedings, da Academia Nacional de Ciências dos EUA, o estudo indica que a poluição reduzirá em 5,5 anos a expectativa de vida de quem mora na região, em comparação aos vizinhos do sul. Combinados, os 500 milhões de habitantes da região deverão perder mais de de 2,5 bilhões de anos de vida pela exposição à poluição.

Em grande parte causada por um excesso de dependência do carvão para geração de energia, a poluição na região chega a ser 55% superior ao padrão limite considerado seguro para a saúde humana segundo a Organização Mundial de Saúde.

Desde janeiro, o governo chinês vem anunciando medidas para contornar o problema, que incluem a melhoria da qualidade do combustível, a limitação do número de carros que podem circular nas ruas e o aumento dos investimentos em energias renováveis.

FOME DE CARVÃO
A China é o país mais dependente de carvão para suprir suas necessidades energéticas, seguido pelos EUA.. Segundo um estudo feito pelo World Resources Institute, o país queima anualmente 3,3 bilhões de toneladas do mineral, que supre 79% de sua demanda de energia
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Microgeração fotovoltaica tem menor custo do que a aquisição de energia no mercado convencional

Microgeração fotovoltaica tem menor custo do que a aquisição de energia no mercado convencional


Além da geração para consumo próprio, sistema exporta excedentes para rede elétrica e gera créditos em energia
A microgeração fotovoltaica de energia elétrica por meio de painéis solares é uma alternativa de menor custo do que a aquisição de energia no mercado convencional, como mostra uma pesquisa do Instituto de Energia e Ambiente (IEE) da USP. O trabalho do pesquisador Rennyo Nakabayashi aponta que a legislação permite que o consumidor, além de fazer a geração para consumo próprio, exporte os excedentes para a rede elétrica, gerando créditos em energia. De acordo com o estudo, a microgeração fotovoltaica também é favorecida pela constante redução de preço dos equipamentos fotovoltaicos e a tendência de aumento das tarifas de energia elétrica.

Microgeração fotovoltaica é favorecida pela redução de preço dos equipamentos
“A geração de energia por meio de células fotovoltaicas ocorre quando há exposição de um material semicondutor dopado, geralmente silício, à radiação solar, ocasionando deslocamento de elétrons e, portanto, corrente elétrica”, descreve Nakabayashi. “Os sistemas fotovoltaicos conectados à rede são formados por conjuntos de painéis fotovoltaicos associados a inversores, os quais realizam a conversão de corrente contínua para corrente alternada”.
Atualmente, a matriz elétrica brasileira é hidráulica com complementação térmica, mas devido à crise instalada no setor, motivada pelo baixo nível dos reservatórios, as usinas térmicas estão plenamente acionadas. “Os sistemas fotovoltaicos utilizam a radiação solar como insumo, um recurso abundante no Brasil e não poluente”, ressalta o pesquisador. “Além disso, no âmbito da micro e minigeração fotovoltaica, há a vantagem de se gerar a energia elétrica nos centros de consumo, aliviando a carga nos sistemas de transporte de energia e, com isso, reduzindo as perdas no sistema elétrico”.
As usinas térmicas, previstas para operar em regime complementar, operam na base da geração e o custo da energia gerada por algumas delas pode ultrapassar R$ 1.000,00 por Megawatthora (MWh), enquanto o custo da energia fotovoltaica, na micro e minigeração, pode chegar a R$ 400,00 por MWh em algumas cidades. “Para usinas fotovoltaicas de grande porte o preço da energia é ainda mais barato”, diz Nakabayashi. “O preço médio de venda da energia fotovoltaica no Leilão de Energia de Reserva (LER) de 2014,  foi R$ 215,12/MWh, variando de R$ 200,82 a 220,80/MWh, uma média de deságio de 17,9% em relação ao preço-teto de R$ 262,00”. O LER é realizado pelo Ministério das Minas e Energia, por meio da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) e da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), para contratação de projetos alternativos de geração de energia visando o fornecimento para os consumidores brasileiros.
Produtor-consumidor
A Resolução Normativa da ANEEL 482/2012 possibilita que o fluxo de energia deixe de ser unidirecional (concessionária-consumidor) e passe a ser bidirecional. “O consumidor passa a ter a opção de gerar energia para consumo próprio ou para exportar para a rede elétrica e gerar créditos em energia para serem consumidos em um período de até 36 meses. Neste contexto surge a figura do “prosumidor”, isto é, o produtor-consumidor”, afirma o pesquisador. “Segundo a mesma resolução, a microgeração distribuída é feita a partir de centrais geradoras que utilizem fontes com base em energia hidráulica, solar, eólica, biomassa ou cogeração qualificada tenham a potência limitada pelo valor de 100 quilowatts (kW). A minigeração é definida pela potência superior a 100 kW e inferior a 1 Megawatt (MW)”.
Até o final de 2014, por conta da redução das tarifas forçada pela Lei 12.783 (oriunda da MP579/2012), a micro e minigeração não vinham se mostrando financeiramente atrativas. “Entretanto, este cenário está mudando. Em dezembro de 2014 a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) publicou na Nota Técnica DEA 26/14 uma projeção de 664 MWp instalados de geração distribuída fotovoltaica de pequeno porte em 2023, 166 vezes a capacidade instalada que temos hoje”, relata. “Pode-se dizer que o estudo da EPE foi conservador, pois se assume como premissa uma evolução das tarifas em linha com a inflação [manutenção em termos reais], o que não é o que aconteceu no Brasil, historicamente”.
No período de 1995 a 2013, as tarifas evoluíram, em média, a uma taxa acima de 9% ao ano, enquanto o IPCA evolui aproximadamente 6,5% ao ano. “Vale lembrar que o reajuste médio das tarifas residenciais de energia elétrica ficou acima de 20% em 2014 e, em 2015, os reajustes serão acima de 30%, caso a situação do setor não melhore. Portanto, é provável que em 2023 a penetração da microgeração seja ainda maior do que a apontada pela EPE”, destaca o pesquisador. “Na pesquisa, caso as tarifas tenham um reajuste anual médio pouco acima de 9% ao longo do horizonte de análise, a microgeração seria economicamente viável para as 27 capitais do Brasil, isso sem considerar os reajustes de 2015”.
Segundo o Banco de Informações de Geração (BIG) da ANEEL, o Brasil possui 134 Gigawatt (GW) de potência instalada para a geração de energia elétrica, sendo que a micro e minigeração fotovoltaica, equivale a menos de 0,003% do total. “Por conta de diversos fatores, o Brasil ficou defasado em relação aos países europeus e, atualmente, não existe uma indústria fotovoltaica plenamente consolidada no país, pois até então a demanda não justificava a presença massiva de investidores e da indústria nesta área”, afirma Nakabayashi. “Entretanto, no LER 2014 (fotovoltaico) foram cadastrados 400 projetos, somando 10.790 MW de potência instalada. Foram contratados 202,1 MWmed, totalizando uma potência (CC) de 1.048,2 MWp, o que demonstra um grande interesse dos agentes. O contexto é favorável para que a energia solar fotovoltaica decole”.
Foto: George Campos / USP Imagens
Por Júlio Bernardes, da Agência USP de Notícias.

sábado, 14 de fevereiro de 2015

Ituglanis boticario: a nova espécie da fauna brasileira

Ituglanis boticario: a nova espécie da fauna brasileira

Pesquisadores divulgam descoberta de peixe endêmico da Gruta da Tarimba, no interior de Goiás. Todavia, ele já enfrenta ameaça da extinção devido aos efeitos negativos da expansão da pecuária sobre a água da região


Pedro Rizzato

Pedro Rizzato
Pequeno, com não mais de 10 centímetros, o Ituglanis boticario chama atenção pelos seus grandes bigodes alongados. A cor é de um rosa claríssimo, quase transparente, porque possui pouca pigmentação. O peixe, descoberto recentemente numa gruta em Mambaí, a 500 km de Goiânia, pertence à família dos Ituglanis, que vivem apenas em cavernas.

A nova espécie foi identificada por pesquisadores da Universidade Federal de São Carlos e da Universidade de São Paulo. O peixe foi descrito oficialmente em artigo pubicado na revista da Sociedade Brasileira de Zoologia.

A região de Tarimba, no interior de Goiás, já era conhecida como um hotspot de fauna subterrânea brasileira. Isso significa que a área concentra alto nível de biodiversidade, principalmente endêmica (que tem como habitat exclusivo aquele lugar).

Uma das principais características do Ituglanis boticario é a presença de odontoides, pequenos dentes bem desenvolvidos localizados próximos às brânquias e utilizados para a fixação do animal, evitando que seja levado em correntezas.

Diferente de outros peixes, que vivem entocados, o espécie goiano está sempre em atividade. "Isso acontece por terem menos alimento dentro das cavernas, então eles precisam procurar mais", explica Pedro Pereira Rizzato, integrante da equipe de pesquisa.

Como outros animais que habitam locais escuros, o Ituglanis boticario apresenta visão menos desenvolvida, mas outros sentidos - como olfato e tato - bastante aguçados. Carnívoro, alimenta-se de invertebrados como larvas e besouros. "Ele possui papel biológico muito importante na caverna por ser um predador de topo de cadeia", afirma a pesquisadora Maria Elina Bichuette.

Todavia, o estudo realizado pelos cientistas brasileiros mostra que o peixe recém-identificado já sofre risco de desaparecer. Além da espécie ser endêmica, a Gruta da Tarimba fica localizada numa região onde tem havido expansão do uso de terras para pastagens. Com isso, o solo diminui sua capacidade de drenar água para dentro da caverna, reduzindo a quantidade de alimento em seu interior.

De acordo com Elina, a urina do gado também aumenta a concentração de ureia e amônia na água, o que pode chegar até a matar os peixes. "Nas grutas onde foi encontrada a nova espécie, ela reina soberana. Não existem outros tipos de peixes ali, por isso se o Ituglanis não for conservado, todo o ecossistema estará em risco e poderá será perdido", alerta.


Os pesquisadores já enviaram solicitação ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), órgão responsável pela gestão das unidades de conservação federais, propondo a criação de Unidade de Conservação de Proteção Integral para proteger o local.

Ituglanis recebeu a denominação boticario em homenagem à Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza, instituição que financiou o projeto desta pesquisa e diversos outros estudos, responsáveis por identificar novas espécies da fauna e florabrasileiras.
Gruta da Tarimba, no interior de Goiás, onde foi descoberto o Ituglanis boticario

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015


Reprodução do Globo online
Reprodução do Globo online


Ficou para depois do carnaval a entrega da lista do MPF ao Supremo Tribunal Federal com os pedidos de investigação de políticos envolvidos no Petrolão que têm foro especial. Mas essa turma não terá um carnaval tranquilo, afinal - pelo um time seleto - sabe que a ressaca pós-carnavalesca será avassaladora. Hoje, o doleiro Alberto Youssef está detalhando quanto cada político levou do esquema que ele operou no Petrolão. E é bom lembrar que tem a lista dos delatados por Paulo Roberto Costa e os executivos das empreiteiras. Vamos continuar na expectativa. 
BLOG DO GAROTINHO

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

Sabesp fala em rodízio drástico: 5 dias sem água e 2 comRedação / VEJA.com - /01/2015 

Em meio a maior crise de abastecimento da história do Estado de São Paulo, o diretor da Sabesp, Paulo Massato, afirmou na terça-feira, 27/01, que, num cenário extremo, a companhia poderá chegar a um rodízio “drástico” na região metropolitana: algumas regiões ficariam até cinco dias sem água semanalmente.
“Para fazer rodízio, teria que ser muito pesado, muito drástico. Para ganhar mais do que já economizamos hoje, seriam necessários dois dias com água e cinco dias sem água”, afirmou, durante o anúncio da ampliação da adutora Guaratuba para o sistema Alto Tietê.
Massato disse que o rodízio pode ocorrer “se não chover” o suficiente e se os órgãos reguladores entenderem que a Sabesp deve retirar menos água do Sistema Cantareira – cujo índice atingiu 5,1% de sua capacidade no momento já contabilizado o volume morto. A Agência Nacional de Águas (ANA) determinou na semana passada que a Sabesp diminua a captação do Cantareira.
“Nossa engenharia está correndo contra o relógio. Estamos batendo novos recordes de baixas precipitações”, disse Massato. Segundo ele, a Sabesp não pretende usar a terceira cota do volume morto do Sistema Cantareira.
REDUÇÃO DE PRESSÃO
O diretor da Sabesp afirmou que a companhia está ampliando o período de queda de pressão nas tubulações que atendem a região metropolitana de São Paulo. “Estamos deixando de fazer operação só noturna para fazer também a diurna.”
Segundo ele, “nunca foi necessário” informar a população da diminuição de pressão da água, mas, agora, com a ampliação do período, a companhia decidiu disponibilizar os horários de redução em seu site. Massato explicou que a redução é diferente para cada área da região. “A redução hoje é variável, cada setor tem uma regra diferente.”
No mesmo evento, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, afirmou que a válvula redutora de pressão da Sabesp existe há pelo menos quinze anos. “O mundo inteiro tem, para evitar perdas. Mas o período de redução da pressão era mínimo”, afirmou. Segundo ele, a medida, tomada há um ano, evita contaminação, canos estourados e perdas maiores.

Governo do Rio garante cumprir a meta de tratar 80% do esgoto que migra para a Baía de Guanabara

Governo do Rio garante cumprir a meta de tratar 80% do esgoto que migra para a Baía de Guanabara

Publicado em janeiro 30, 2015 por 


Compromisso de sanear pelo menos 80% da Baía de Guanabara, onde serão disputadas local de algumas provas dos Jogos Olímpicos, será cumprido, diz Casa Civil. Foto: Arquivo/Agência Brasil

O secretário estadual da Casa Civil, Leonardo Espíndola, afirmou ontem (29) que o Rio de Janeiro cumprirá o compromisso com o Comitê Olímpico Internacional, de sanear 80% da Baía de Guanabara até a disputa dos Jogos, no próximo ano. De acordo com o secretário, o acordo não prevê a “limpeza” de 80% da baía, mas o tratamento de 80% do esgoto que é despejado nela.
“O compromisso olímpico está mantido. Hoje, já tratamos 50% do esgoto da baía. Ainda falta a entrega dos troncos coletores do Faria Timbó e da Cidade Nova. Antes dos Jogos Olímpicos de 2016, pretendemos cumprir a meta de tratar 80% do esgoto que migra para a baía, o que é completamente diferente de tratar 80% da Baía de Guanabara”, disse.
Segundo ele, para o teste de iatismo, feito no fim do ano passado, as raias do evento já mostravam condições de balneabilidade aceitáveis para esse tipo de competição.
“Estamos absolutamente tranquilos. Assim como foi no teste, teremos plenas condições nas raias em 2016. A competição de vela será realizada em um cenário maravilhoso, com perfeitas condições para que os atletas consigam desempenhar suas capacidades”, salientou Espíndola.
Além do tratamento de esgoto, está previsto o uso de ecobarreiras nos rios, para reter resíduos sólidos antes que eles cheguem à Baía de Guanabara, e de ecobarcos, para recolher o lixo flutuante que atingir o corpo d’água.
O secretário garantiu que a Linha 4 do metrô, ligando a zona sul à Barra da Tijuca, será concluída em 2016. Ele acrescentou que estão mantidos os compromissos e prazos de entrega das obras de modernização do Parque Aquático Julio Delamare e de instalação de quadras de aquecimento do ginásio do Maracanãzinho.
As duas obras eram de responsabilidade do governo estadual, na Matriz de Responsabilidade dos Jogos, mas foram repassadas ao Consórcio Maracanã, concessionária que administra o complexo esportivo. Conforme Espíndola, a Odebrecht, principal empresa do consórcio, pediu reequilíbrio financeiro do contrato, mas isso não afetará o andamento das obras.
Por Vitor Abdala, da Agência Brasil.

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015


Reprodução do Informe do Dia
Reprodução do Informe do Dia


Fico impressionado como Pezão está fora da realidade. Num momento de crise como o que o Estado do Rio vive, sem dinheiro até para a merenda das crianças, Pezão passou a semana tentando arrumar dinheiro para as escolas de samba. Aliás, Pezão fez tudo errado em relação ao carnaval. Na campanha prometeu ao pessoal do samba que iria reajustar a cota de patrocínio do Estado sabendo que não iria ter dinheiro. E só avisou as escolas de samba que não teria como pagar quando faltavam três semanas para o carnaval. 


FONTE  BLOG DO GAROTINHO

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

Vida marinha está à beira da extinção em massa

Vida marinha está à beira da extinção em massa

Gabriel Garcia - INFO Online - 19/01/2015

Wikimedia Commons















Um grupo de cientistas concluiu que os humanos estão prestes a causar um dano sem precedentes aos oceanos e os animais que vivem neles.

"Podemos estar sentados à beira do precipício de uma grande extinção", afirmou Douglas McCauley, ecologista da Universidade da Califórnia e autor do estudo, publicado na revista Science na quinta-feira (15).

Segundo McCauley, ainda há tempo para evitar uma catástrofe maior. Isso porque, comparados com os continentes, os oceanos estão quase intactos.

"Os impactos estão aumentando, mas não estão tão graves a ponto de não podermos reverte-los", afirmou Martin Pinsky, biólogo marinho da universidade Rutgers e coautor do estudo.

A pesquisa de McCauley e Pinsky é sem precedentes, pois cruzou dados de diversas fontes, desde relatórios sobre a exploração de combustíveis fosseis até estatísticas sobre remessas de containers, pesca e mineração oceânica.

Os cientistas detectaram sinais claros que os seres humanos afetaram os oceanos e a vida marinha de forma grave.

Enquanto algumas espécies sofrem com a superpopulação, outras estão ameaçadas de extinção, devido a destruição seus habitats naturais, geralmente causada pela intervenção humana.

A população de recifes de corais, por exemplo, diminuiu 40% no século passado, principalmente pelas consequências do aquecimento global.

Algumas espécies de peixes estão migrando para águas mais frias. Outras espécies, com a locomoção reduzida, não irão conseguir encontrar novos lares.

Ao mesmo tempo, as emissões de gases do efeito estufa estão alterando a química da água do mar, tornando-a mais ácida.

Ainda assim, a pesquisa afirma que há tempo para reduzir os estragos, com a implantação de programas que limitem a exploração dos oceanos.

Os autores alegam que a limitação da industrialização dos oceanos em algumas regiões permitiria que espécies ameaçadas migrassem para outras partes ainda preservadas.

"Acredito que nosso melhor parceiro para salvar o oceano é ele próprio", afirma McCauley.