terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

Construindo outro mundo tijolo por tijolo: cidades buscam a sustentabilidade

Construindo outro mundo tijolo por tijolo: cidades buscam a sustentabilidade

Por Stephen Leahy, do IPS (Inter Press Service)
Uma tarde de 2005, no povoado de Ashton Hayes, no condado inglês de Cheshire, alguém iniciou uma conversa em um bar sobre a mudança climática e a energia. Dois anos depois, moradores do lugar haviam reduzido em 20% suas emissões de dióxido de carbono e os custos energéticos. Ashton Hayes agora procura se converter na primeira comunidade neutra em carbono da Inglaterra.
“A gente sabe bem que são necessárias grandes transformações diante da mudança climática e do esgotamento de recursos”, afirmou Rob Hopkins, um dos fundadores do movimento Transition Towns, que reúne os moradores preocupados em melhorar as ruas e os bairros. “Comecei com amigos e vizinhos, perguntando o que podemos fazer como pessoas comuns, sabendo que nossos governos não resolverão?”, contou à IPS.
Diante de um problema crescente de lixo, os moradores da comunidade sul-africana de Greyton processaram os dejetos e os colocaram em garrafas de plástico para fabricar “ecotijolos”, um bom material de construção com alta capacidade de isolamento, que agora é usado para construir banheiros.
Em Portugal, onde o desemprego supera os 20% da população economicamente ativa e os salários se deterioram, o movimento lançou iniciativas para limitar a circulação de dinheiro. Em uma pequena localidade foi proibido o uso de moedas e notas durante três dias, e os moradores trocaram bens e serviços.
“Podemos fazer com que funcione”, disse Hopkins, autor do livro Power of Just Doing Stuff – How Local Action Can Change The World (O poder de simplesmente fazer algo – Como a ação local pode mudar o mundo). Agora há mais de mil comunidades envolvidas no Transition Towns, movimento voluntário e sem fins lucrativos. Estas inventam suas próprias formas de reduzir a dependência dos combustíveis fósseis, enquanto aumentam sua capacidade de resistência e sua autossuficiência em alimentação, água, energia, cultura e bem-estar.
Segundo um informe de 200 páginas do Grupo Intergovernamental de Especialistas sobre a Mudança Climática (IPCC), divulgado no dia 30 de setembro, as temperaturas registradas no hemisfério Norte, entre 1983 e 2012, foram as mais altas dos últimos 1.400 anos. O informe, redigido de forma muito cautelosa, detalha os últimos impactos observados, como as mudanças nas precipitações e os eventos climáticos extremos. Também confirma que esses e outros efeitos se agravarão conforme aumentarem as emissões de dióxido de carbono.
“As cidades têm o papel mais importante nos esforços por uma emissão zero”, destacou George Ferguson, prefeito da localidade britânica de Bristol, com meio milhão de habitantes. “Bristol dá ênfase no transporte a pé e de bicicleta, e planejamos duplicar ou triplicar a cobertura florestal. Queremos melhorar a qualidade do ar e a saúde dos residentes”, disse Ferguson à IPS.
Esta cidade, uma das primeiras a integrar o movimento Transition Towns, é um laboratório vivo para ideias e experimentos destinados a criar uma “ecocidade” para todos, destacou Ferguson. Entre três e cinco horas da tarde está proibida toda circulação de automóveis. Isso permite que as ruas fiquem livres e sejam usadas como lugar para brincadeiras por meninos e meninas.
Bristol também é um exemplo na Grã-Bretanha em matéria de reciclagem, e prevê criar uma companhia municipal de energia sustentável. A partir do próximo ano, as crianças aprenderão ecologia nas escolas, que ensinarão a plantar árvores em seus bairros como parte de um esforço anual para aumentar os espaços verdes da cidade. “Creio que as crianças ensinarão seus pais importantes lições ecológicas”, afirmou Ferguson, que recebe todo seu salário em moeda alternativa da cidade, chamada libra Bristol, e que só pode ser gasta no comércio local. “Minha bicicleta, minhas calças, minha comida e o barbeiro, pago tudo com a libra Bristol”, contou.
Há mais de 400 moedas alternativas em uso em todo o mundo, e o número cresce rapidamente em resposta à globalização e ao domínio corporativo. Embora os moradores possam pagar inclusive seus impostos em libras Bristol, as grandes redes de supermercados não as aceitam, explicou o prefeito. Neste verão boreal, Bristol foi premiada por seus esforços, ao ser designada a Capital Verde da Europa 2015, a primeira cidade britânica a obter esse reconhecimento. “O que fazemos pode ser aplicado em milhares de cidades e localidades, e nos divertimos muito fazendo isso”, afirmou Ferguson.
Saint-Gilles-Du-Mene é um povoado rural na região francesa da Bretanha, que decidiu se reinventar como uma comunidade produtora de energia. Hoje, utilizando biomassa, biodigestores, fontes eólicas e solares, além de sistemas melhorados para isolamento das casas, produz 30% de sua própria energia. Os moradores esperam que até 2025 possam vendê-la também a outras comunidades.
“Nossa transformação energética criou novos empregos e sinergias. Temos uma nova instalação para realizar videoconferências e produzimos nosso próprio biodiesel para os tratores agrícolas”, detalhou Celine Bilsson, da Comissão de Energias Renováveis do povoado. Ela acrescentou que sua localidade se inspirou no exemplo de Güssing, povoado austríaco outrora pobre que foi o primeiro da Europa a utilizar completamente energia renovável, no final da década de 1990.
Güssing reduziu seu gasto energético em 50% graças à melhoria da eficiência, e agora ganha milhões de euros vendendo energia renovável para outras comunidades. “Não perdemos tempo fazendo estudos. Simplesmente reagimos. Vocês devem fazer o mesmo”, aconselhou Bilsson.

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