quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

Vida do 'Paraíba' comprometida

Publicado em 29/11/2014

FONTE JORNAL O DIÁRIO

Phillipe Moacyr
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Keylla Thederich

Mediante a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que autorizou o Estado de São Paulo a realizar as obras de transposição do Rio Paraíba do Sul, a partir de um acordo assinado pelos estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, o secretário de Meio Ambiente de Campos, Zacarias Albuquerque, faz uma análise da situação e diz que além de aguardar os estudos, vai cobrar uma deliberação dos órgãos responsáveis. "A transposição afeta diretamente a vida do Paraíba e pode causar riscos à qualidade da água". Ele ainda fala da falta de investimentos para a recuperação do rio e de ações na administração pública para o uso racional da água.

O Diário (OD) - Na última quinta-feira (27), foi autorizada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), após acordo entre os governos dos estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, a transposição do Rio Paraíba do Sul. Qual é o posicionamento da Secretaria Municipal de Meio Ambiente com a decisão?
Zacarias Albuquerque (ZA) - É com muita preocupação que vemos essa decisão. Nenhum segmento que integra a execução da política nacional de Recursos Hídricos tem informações conclusivas com base em estudos técnicos para definir um posicionamento para retirada ou não da água do Paraíba, até porque até agora nada nos foi apresentado. Não foi uma decisão técnica.

OD - Como o senhor avalia a posição do STF e do governador Luiz Fernando Pezão? 
ZA - O acordo foi firmado pelos três estados com o aval do STF. O que está contraditório na decisão é que o ministro Luiz Fuz autorizou o início das obras, inclusive com abertura de concorrência para licitação, mas terão que apresentar um projeto até fevereiro. São Paulo pode fazer a transposição, mas com base em que acordo? O que aconteceu no STF foi um debate com viés muito mais político e jurídico do que técnico. E, além disso, não há tempo suficiente para que sejam concedidas todas as licenças ambientais.

OD - Qual é o principal risco para a região?
ZA - A nossa preocupação é com a vida do rio, a qualidade biológica da água. Não sabemos o que pode acontecer, quais os riscos que irão incorrer sobre a capacidade biológica do Rio Paraíba, principalmente no período de estiagem. O risco é de termos uma queda muito brusca na vazão causada pela transposição e agravada pelas mudanças climáticas. Estudos terão que ser apresentados para que possamos avaliar melhor toda questão.

OD - Existe algum risco de comprometimento no abastecimento de água?
ZA - Por enquanto não, mas precisamos de planejamento e de mais investimentos. Em Campos, o último desabastecimento que tivemos foi em 2003, quando a vazão do rio ficou muito baixa por falta de chuvas, que associada às altas temperaturas, fizeram com que as algas libera- ssem toxinas. Não foi por falta de água. E isso pode vir a acontecer novamente.

OD - Mesmo assim, existe algum planejamento, uma alternativa em relação ao abastecimento?
ZA - Sim. Recentemente, tivemos uma reunião com representantes da concessionária Águas do Paraíba e eles nos informaram que existe um projeto a ser implementado futuramente em caso de necessidade de captação no Rio Muriaé. Mas, o ideal é que fossem construídas mais Estações de Tratamento de Esgoto (ETEs).

OD - O senhor falou em investimentos e isso certamente passa pela gestão do rio. Que investimentos poderiam ser feitos? 
ZA - Qualquer investimento para recuperação da bacia e gestão de segurança hídrica passa pela construção de ETEs e pelo reflorestamento. O problema é que esses investimentos são extremamente tímidos e no Paraíba avançam muito lentamente. Todos os municípios dão sua contribuição, mas o Sistema de Gerenciamento de Recursos Hídricos, criado há 15 anos, envolve vários órgãos e a burocracia é muito grande.

OD - Diante dessa decisão, como o município se posiciona?
ZA - A prefeita Rosinha Garotinho já se manifestou e eu, enquanto secretário e membro do Conselho Estadual de Recursos Hídricos e do Comitê de Integração da Bacia Hidrográfica do rio Paraíba do Sul (Ceivap), vou aguardar a apresentação dos estudos com os dados técnicos, inclusive referente às compensações e à questão do tratamento de esgoto. Além disso, vamos cobrar dos dois órgãos a deliberação sobre a questão.

OD - Além da questão da transposição, toda região vive com a crise da água. Nesse sentido, quais são as ações que estão sendo desenvolvidas no município referente à economia e uso racional da água?
ZA - Em 2009, Rosinha sancionou uma lei estabelecendo o uso racional das águas com o reaproveitamento das águas das chuvas, mas essa lei precisa ser regulamentada. Essa "obrigação" se estende desde o poder público, empresas e munícipes. No entanto, precisamos regulamentar de que forma essa água será armazenada. Uma mesma regulamentação não pode valer para uma grande empresa e um morador. Estamos realizando estudos técnicos para que haja adequação às diferentes realidades que temos em nosso município. Dentro de pouco tempo a Lei 8.096 de 2009 deverá ser regulamentada através de decreto.

OD - A administração pública também passa por uma adequação para uso racional de água. Como funciona esse programa?
ZA - Na verdade, é um programa do Ministério do Meio Ambiente, que foi lançado há 10 anos, mas ganhou corpo agora com a adesão de cerca de 500 instituições do Judiciário, do Governo Federal, dos estados e das prefeituras. É o Projeto A3P de Sustentabilidade Ambiental na Administração Pública, cujos objetivos são: orientar os gestores públicos para adoção de princípios e critérios de sustentabilidade; apoiar a incorporar critérios de gestão socioambiental; promover a economia de recursos naturais e eficiência de gastos institucionais; e contribuir para revisão de padrões de produção e consumo e na adoção de novos referenciais de sustentabilidade no âmbito da administração pública.

OD - Como foi a adesão em Campos?
ZA - A prefeita decretou a adesão em maio e começamos a trabalhar em julho com a criação do Comitê Gestor do Programa Agenda Ambiental da Administração Pública para implementar o uso racional dos recursos naturais. Nossa primeira meta foi promover a economia de 10% no uso da água em todos os prédios públicos da administração municipal. Das cerca de 700 unidades, 88 instituições conseguiram promover a economia a partir de 10%. Tivemos unidades com economia de 70 a 80%. Esse trabalho é contínuo, inclusive com a divulgação de boletins informativos para que haja uma mobilização de todos os cidadãos e que essa seja uma responsabilidade não só do poder Executivo, mas de todos.

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