quinta-feira, 9 de outubro de 2014


Um alerta verde para a cidade

Vandalismo, doenças e acidentes matam quase 30% das árvores plantadas por ano
 
Cidade que se orgulha de ter uma expressiva cobertura vegetal — as áreas verdes abrangem um terço de seu território —, o Rio sofre para manter as árvores de seus espaços públicos em pé. De 2011 a 2013, as ruas e praças da capital receberam 127.877 novas árvores, em sua maioria espécies da Mata Atlântica, em média, 42 mil por ano. Mas vandalismo, doenças fitossanitárias e acidentes viários provocam a perda de cerca 11 mil árvores por ano, cerca de 30% do total plantado. A estimativa é da Fundação Parques e Jardins, responsável por coordenar os plantios. Outra dificuldade é convencer os cidadãos da importância da manutenção das áreas verdes. Na chamada Área de Planejamento 3 (AP-3), que abrange bairros da Zona Norte, do Méier a Deodoro, nada menos do que 70% dos plantios previstos não podem ser concretizados. O motivo principal: moradores se recusam a autorizar novas árvores em suas calçadas.

São muitos os gargalos. A ausência de um plano diretor de arborização impede uma gestão mais eficiente. A Prefeitura do Rio estima que as ruas e praças abriguem 700 mil árvores. Mas o município não sabe qual o tamanho exato do déficit de cobertura vegetal. Há um entendimento comum entre engenheiros florestais de que a expansão da cidade para bairros da Zona Oeste, como Campo Grande e Jacarepaguá, vem implicando na perda significa dessa cobertura. A estimativa mais recente, de 2006, apontava para um déficit de 300 mil árvores. O trabalho, por amostragem, foi feito pelo arquiteto Adilson Roque dos Santos, durante seu doutorado na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).

NOVOS CRITÉRIOS PARA PLANTIO

Diretor de Arborização da Fundação Parques e Jardins, o engenheiro florestal Flávio Telles reconhece que o Rio ainda precisa avançar para atingir patamares satisfatórios. Ressalta que, desde 2007, as perdas nos plantios caíram 20%. Mudanças em critérios foram determinantes. Há sete anos, as mudas passaram a ser plantadas com 2,5 metros de altura — antes, a média era de 1,80m — e largura de 2 a 3 cm, o dobro do protocolo anterior. Outra mudança foi o critério de 2 metros de largura para as calçadas serem consideradas aptas a receber novos vegetais.
— Infelizmente, há moradores que se negam a receber mudas em frente às suas casas ou prédios. Marechal Hermes, Guadalupe e bairros nos arredores registram altos percentuais de recusa. A memória da população ainda remete a problemas antigos, como falta de manutenção e espécies que causavam transtornos, como ficus e casuarina, pelo enorme porte. Muitos acham que a árvore é uma vilã, que fornece esconderijo a ladrões. Mas os benefícios são gigantescos. Uma única árvore pode causar um conforto térmico de até quatro graus e fazer o serviço de três aparelhos de ar-condicionado — destaca Telles.
Em 2013, o Rio recebeu 57.014 novas mudas em áreas públicas, um recorde nos últimos anos. O número equivale a uma árvore para cada grupo de 110 pessoas ou 2,1 hectares. No mesmo ano, São Paulo plantou mais: foram 155.714 unidades, o mesmo que uma árvore a cada grupo de 72 habitantes ou 0,8 hectare. A capital paulista conta com três viveiros, mantidos pela prefeitura. No Rio, os dois hortos — um na Taquara e outro em Vargem Pequena — só “engordam” as mudas, que são encaminhadas majoritariamente a projetos de reflorestamento.

MEDO DE ABORRECIMENTOS FUTUROS

Quase toda a produção de sementes do Rio acontece na Biovert Florestal e Agrícola, em Silva Jardim. O dono do empreendimento, Marcelo de Carvalho Silva, calcula que o mercado de arborização vai movimentar R$ 16 milhões este ano. O custo de plantio por muda é de R$ 369. Nenhum centavo sai dos cofres públicos. As empresas ou pessoas físicas financiam os plantios. A lei ordinária 613/1984 — que prevê uma árvore a cada 150 metros quadrados de novas construções residenciais —, a lei do “Habite-se” e as medidas compensatórias são as bases legais desse mercado. A Fundação Parques e Jardim apenas fiscaliza e estabelece os parâmetros dos plantios, que devem ser feitos por empresas credenciadas.
— Atendemos às exigências de compensações ambientais e atuamos na produção, no plantio e na manutenção. Não temos prefeituras como clientes. Acredito que o grande entrave hoje no Rio está ligado ao oportunismo ambiental. Suprimir uma árvore virou um verdadeiro pandemônio. As pessoas ficam com medo de plantar e depois terem dificuldades e aborrecimento em caso de precisaram remover algum vegetal , ainda que por motivo de doença — opina Marcelo Carvalho.
Apesar das dificuldades, há moradores ávidos por mais cobertura verde. Este ano, os bairros que mais demandaram plantios pela central 1746 da prefeitura foram Tijuca, Campo Grande, Copacabana e Bangu. Em 2013, as localidades que mais receberam mudas foram Cidade Universitária (com 10.692, em projeto financiado pela GE), Campo Grande (5.477) e Jacarepaguá (3.584). A Fundação Parques e Jardins tem uma lista de 75 espécies recomendadas para espaços urbanos. Já espécies como monguba, casuarina, flamboyant e ficus-benjamina entraram para a lista das proibidas, por serem inapropriadas para calçamentos urbanos.

Floração desregrada de algumas árvores, como quaresmeiras e paus-brasil, preocupa estudiosos. Eles observam que esses vegetais têm florescido até quatro vezes por ano, o que só deveria ocorrer uma vez no período, em condições normais. Há, com isso, um gasto excessivo de energia, podendo causar a morte de algumas espécies.

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