segunda-feira, 24 de junho de 2013

Cristais de MDMA embalam as noites do Rio

Droga é chamada pelos usuários de ‘Michael Douglas’

CATHARINA WREDE (EMAIL·FACEBOOK·TWITTER)
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Cristais de MDMA que embalam as noites do Rio Foto: Vinicius Mictchell / Ilustração

Cristais de MDMA que embalam as noites do Rio Vinicius Mictchell / Ilustração
RIO - É sábado à noite e a estudante A., de 23 anos, se arruma para sair. Junto com a carteira, o celular e as chaves de casa, coloca na bolsa um frasco pequenino. Dentro dele, cristais de MDMA (abreviação de metilenodioximetanfetamina) dissolvidos em quatro dedos d’água. Já na festa, com a ajuda de um conta-gotas, pinga generosas doses do líquido no drinque que comprou e bebe.
Após a ingestão, A. descreve um cardápio de sensações que costuma sentir: as cores saltam aos olhos, a música ganha uma melodia diferente e um simples toque de braços traz um prazer à flor da pele junto com a promessa de uma noite sem fim.
À primeira vista (gole?) inebriante, o MD — ou “Michael Douglas”, como também é chamado pelos jovens — pode provocar consequências nada glamourosas. Depressão, diminuição da produtividade e dependência química e psicológica são alguns dos efeitos colaterais. Cada vez mais popular no Brasil, os cristais amarronzados estão tão presentes na noite carioca hoje quanto a cocaína nos anos 1980 e 1990, desbancando outras substâncias químicas ilícitas populares entre os jovens até então, como o ecstasy e o ácido.
— O MD é o princípio ativo do ecstasy. Podemos dizer que é uma cocaína mais fraca e também tem efeito mais brando que o LSD. Claro, tudo dependendo da quantidade ingerida — explica a chefe do Setor de Dependência Química e Outros Transtornos do Impulso, da Santa Casa da Misericórdia do Rio, Analice Gigliotti. — É um estimulante e mexe com o sistema nervoso central, causando alterações na percepção das cores, da luminosidade e dos sons.
Os números traduzem o aumento do consumo da droga. Segundo o Instituto de Segurança Pública (ISP), os últimos dados computados e divulgados pelo Instituto de Criminalística Carlos Éboli apontam um aumento de 347,3% na apreensão de MD de 2010 para 2011. Ou seja: se em 2010 a quantidade de MD apreendida foi de 123,9 gramas, em 2011 o número subiu para 554,2 gramas. Segundo o ISP, os dados de 2012 ainda não estão disponíveis. Apesar da maconha ainda continuar sendo a droga mais consumida, o MD é a mais usada entre as substâncias sintéticas, deixando o LSD em segundo lugar.
— Há algum tempo falava-se que o ecstasy não causava dependência. Hoje sabemos que isso não é verdade. Tenho pacientes dependentes de MDMA e outros que ingerem dez, 15 comprimidos de ecstasy por noite. O tratamento nesses casos é feito com medicamentos e psicoterapias cognitivas e comportamentais — afirma Analice Gigliotti.
Criado em laboratório, o MDMA é considerado por especialistas uma droga recente, com estudos ainda prematuros a respeito. De acordo com o artigo “An exploration for the history and controversies surrounding MDMA and MDA”, de Alana R. Pentney, publicado no site da organização americana Maps (Multidisciplinary Association for Psychedelic Studies), o primeiro registro de preparação da substância data de 1912, na Alemanha. Após ser usada experimentalmente com fins terapêuticos, a droga acabou sendo considerada ilegal em 1980.
— O estudo do MD é embrionário no mundo inteiro, mas no Brasil ele ainda é inexistente — diz o psicoterapeuta curitibano Daniel Rezinovsky, professor do curso Enteógenos e Estados Alterados da Consciência, ministrado no último fim de semana na Comuna, em Botafogo, em que o MDMA foi um dos tópicos. — O interessante dessa substância é que ela vem se provando promissora em tratamentos pós-traumáticos em veteranos de guerra, em experimentos nos Estados Unidos, por exemplo. Mas é muito importante diferenciar o ambiente clínico, em que tudo é calculado, do ambiente das baladas, em que a droga é ingerida sem controle algum, muitas vezes misturada com outras substâncias.
A cerca de R$ 150 a grama (quantidade geralmente consumida por duas ou três pessoas numa noite), o MD é mais consumida em festas de classe média alta.
— Não é tão fácil comprar o MD quanto a maconha. Mas quem vive na noite acaba conhecendo quem vende. Geralmente algum estudante da faculdade me vende — conta A., que também é usuária de maconha.




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